terça-feira, 21 de outubro de 2025

Crítica: Kontinental '25 (2025)


Sempre trazendo uma sátira ácida e relevante a respeito da sociedade romena atual, mas que de certa forma também se aplica a todos os seres humanos dos quatro cantos do planeta, o cineasta Radu Jade já possui uma filmografia sólida mas, ao mesmo tempo, polêmica. Depois de "Má Sorte no Sexo ou Pornô Acidental" e "Não Espere Muito do Fim do Mundo", ele volta às telas em boa forma com Kontinental '25,  mais uma "dramédia" social que trata, acima de tudo, da empatia humana e do peso da culpa.


Um morador de rua tira sua própria vida ao se ver sem saída depois de receber uma ação de despejo para deixar uma casa abandonada em que ele estava se abrigando havia algum tempo, o que levaria ele a morar definitivamente na rua, ou ainda em um albergue, o que na visão dele seria pior. Antes da drástica decisão ser tomada, o filme mostrava um pouco da rotina de Ion (Gabriel Spahiu) nos últimos dias, enquanto ele caminhava com sacos de lixo nas costas pedindo qualquer tipo de trabalho às pessoas que encontrava pelo caminho, sem obter sucesso. Ao presenciar a cena da morte, a oficial de justiça Orsulya (Eszter Tompa), que foi a responsável pela ação, se sente extremamente culpada, mesmo que tenha sido obrigada a agir perante a lei e o seu próprio dever do ofício. Essa culpa vai persistir sobre ela pelo resto do filme, ditando seus passos e suas ações dali em diante.

Ao longo do roteiro, Orsulya vai conversando com outros diversos personagens que fazem parte da sua rotina, inclusive um ex-aluno da sua época de professora universitária (interpretado por Adonis Tanta), que ressurge após muitos anos e lhe traz uma perspectiva nova na vida. Todos apresentam suas próprias visões sobre o caso, fazendo com que ela sinta menos ou mais culpa, dependendo do contexto da conversa. E quando o acontecimento chega à mídia e às redes sociais com o habitual sensacionalismo, Orsulya também passa a temer por sua reputação e sua imagem, como se já não bastasse a culpa interna corroendo seu corpo diariamente e que já afetou seu trabalho e sua vida pessoal.

Também há espaço para temas bem contemporâneos nestas conversas da protagonista, como a imigração (Orsulya mesmo é húngara, e já sentiu na pele a intolerância dos nacionalistas) e a desigualdade social que vitima direta e indiretamente, todos os dias, pessoas como Ion. Soma-se a tudo o tema central de discussão, que é a gentrificação dos espaços urbanos. O homem estava sendo despejado para que, no local, fosse construído um grande hotel de luxo, que segundo a própria protagonista, só foi autorizado porque o responsável é amigo de pessoas importantes do governo.


Com humor, mas nunca deixando de tratar os temas com a seriedade que merecem, Radu Jade apresenta uma obra mais centrada e menos caótica que a sua antecessora, e eu gostei muito da maneira como o filme trabalha suas questões, da forma natural e sem pressa, mostrando sobretudo a hipocrisia das pessoas e a falta de empatia generalizada. Mais um trabalho competente deste cineasta que capta com maestria o colapso moral de uma sociedade cada vez mais individualista e egoísta, mas que no meio de tudo, ainda tem respiros de humanidade.

segunda-feira, 6 de outubro de 2025

Crítica: Ladrões (2025)


Conhecido por filmes controversos e que costumam sempre dividir opiniões, como Réquiem Para um Sonho, Cisne Negro, A Mãe e recentemente A Baleia, Darren Aronofsky surpreende ao se afastar do seu estilo habitual e trazer um filme explosivo, frenético e extremamente divertido em sua essência, que me lembrou muito os filmes do Guy Ritchie no início dos anos 2000 como Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes (1998), Snatch - Porcos e Diamantes (2000) e Revolver (2005).


Ladrões (Caught Stealing) se passa em 1998 e acompanha Hank Thompson (Austin Butler), um aspirante no beisebol, que teve que largar a promissora carreira logo cedo após um acidente de carro que vitimou seu melhor amigo. Agora ele vive em Nova Iorque, onde trabalha como barman e vive uma vida agitada entre bebidas e festas. Seus breves momentos de tranquilidade são quando ele está acompanhado da namorada, Yvonne (Zoe Kravitz), e quando ele larga tudo para ligar para sua mãe, algo que ele faz constantemente, mostrando a proximidade que tem com o único elo familiar que lhe restou.

Neste primeiro ato, temos uma boa construção da personalidade de Hank, com suas angústias por carregar o peso de ter perdido a grande oportunidade da sua vida com o incidente trágico e sua maneira desregrada de viver a vida, mas ao mesmo tempo, mostrando também o seu bom coração e uma vontade implacável de viver a vida. Tudo muda quando seu amigo e vizinho de porta Russ (Matt Smith), um punk anárquico e completamente tresloucado, diz que precisa viajar para ver o pai doente e deixa o gato de estimação para Hank cuidar. Logo, ele começa a perceber uma movimentação estranha na frente da porta de Russ, de gâgsters russos a mafiosos judeus, que tentam a todo custo acessar o apartamento vizinho. Não demora para Hank ser incluído na confusão, virando o alvo desta turma perigosa, tendo que pedir socorro à agente policial Roman (Regina King).



Com reviravoltas e um roteiro bem dinâmico, o filme prende o espectador numa trama engraçada e muito vibrante. Apesar de não trazer grandes novidades daquilo que já foi visto em outros filmes do gênero, inclusive apresentando soluções bem convencionais, não dá para negar que o filme tem ótimos momentos de originalidade, como a própria figura do gato (chamado Bud), que rouba a cena e se torna um elemento diferencial da trama. Também é preciso elogiar Austin Butler, que mostra mais uma vez porque é, hoje, um dos atores mais badalados do cinema norte-americano. Sua presença é magnética, e sua atuação impecável. O elenco de apoio também está excelente, com ótimas presenças de Zoe Kravitz, Regina King, Liev Schreiber, Matt Smith e até mesmo do cantor Bad Bunny. Tudo isso acompanhado de uma trilha sonora potente.