segunda-feira, 10 de novembro de 2025

Crítica: Frankenstein (2025)


Conhecido por suas obras fantasiosas, marcadas por uma estética visual singular e pelo uso de metáforas que expõem as imperfeições humanas em seus extremos, o mexicano Guillermo del Toro encontrou em Frankenstein a história perfeita para expandir seu universo autoral. O cineasta revisita o clássico de Mary Shelley imprimindo sua própria assinatura, numa combinação de lirismo sombrio, imaginação exuberante, e uma profunda empatia por seus monstros.


O filme se inicia em 1857, quando Victor Frankenstein (Oscar Isaac) está perdido em meio ao Mar da Noruega congelado, fugindo da criatura que ele próprio deu vida. Ele acaba acolhido por um navio que está aprisionado entre as geleiras, e na cabine do capitão, começa a contar sua história, que serve como narração para o que vem pela frente. Retornamos por um breve momento à sua infância, passada em uma imponente mansão nórdica ao lado dos pais, onde o jovem Victor criou fascínio pela anatomia e pelo mistério do corpo humano ao acompanhar o trabalho do pai (Charles Dance), um cirurgião renomado.

Após a morte dos pais, a curiosidade se transforma em obsessão: movido pelo desejo de "desafiar a morte", Victor mergulha em experimentos cada vez mais ousados, até finalmente alcançar seu propósito. Com o auxílio de uma engenhoca de sua própria invenção, financiada pelo seu tio excêntrico, Henrich Harlander (Christoph Waltz), Victor dá vida a um ser composto de nervos, ossos e tecidos de inúmeros cadáveres. O resultado é uma criatura interpretada de forma visceral e melancólica por Jacob Elordi, que encarna tanto o horror quanto a pureza.


O enredo desenvolve-se em torno de uma inversão moral já clássica, mas que ganha novas camadas sob o olhar do diretor: o verdadeiro monstro da história talvez não seja a criatura, mas sim o seu criador. Ao perceber as imperfeições de sua obra, um ser que não corresponde às suas expectativas de inteligência e autossuficiência, Victor se revolta contra a própria criação. O fascínio científico rapidamente se transforma em repulsa e crueldade. Em cenas duras, vemos ele subjugar o ser à humilhação e à violência, mantendo-o acorrentado e punindo-o sem motivos. A única figura capaz de reconhecer traços de sensibilidade e emoção na criatura é Elizabeth (Mia Goth), a futura cunhada de Victor, cuja compaixão contrasta com a brutalidade do cientista.

Na segunda metade do filme, a narrativa se desloca para o ponto de vista da própria criatura, e é aqui que del Toro mergulha mais fundo nas dimensões filosóficas da história. Ao dar voz ao ser rejeitado, o cineasta explora temas como pertencimento, identidade e a essência do que significa ser humano. A criatura, em sua busca por compreensão e aceitação, revela um sofrimento que transcende o horror: o de existir sem um lugar no mundo, de desejar amor e ser incapaz de recebê-lo. É nesse trecho que o filme se torna mais poético e devastador, equilibrando a beleza visual característica de del Toro com uma reflexão amarga sobre criação, abandono e culpa.

A veia autoral do cineasta pulsa em cada segundo do filme, do design de produção meticulosamente detalhado à fotografia envolta em tons frios e sombrios, que dialoga com a natureza trágica da história. É possível sentir a paixão que ele colocou neste filme, que já era um desejo seu de muitos anos. Enquanto isso, a trilha sonora de Alexandre Desplat se destaca por sua delicadeza melancólica, alternando momentos de grandiosidade orquestral e silêncios que falam mais do que qualquer palavra.


No elenco, todos cumprem com precisão o papel que lhes cabe dentro dessa fábula sombria. Oscar Isaac entrega um Victor Frankenstein dividido entre a genialidade e a loucura, e Jacob Elordi humaniza a criatura com uma presença física e emocional impressionante. Mia Goth, Christoph Waltz e Charles Dance completam o conjunto com atuações competentes que engrandecem ainda mais a obra. Por fim, o resultado é uma obra visualmente deslumbrante e emocionalmente dilacerante, que reafirma o diretor como uma das mentes mais criativas do cinema contemporâneo, ao transformar novamente o horror em compaixão, e o grotesco em beleza.

Nenhum comentário:

Postar um comentário