terça-feira, 30 de outubro de 2018

Crítica: Oitava Série (2018)


Marcando a estreia do comediante e músico Bo Burnham na direção de longas metragens, Oitava Série (Eighth Grade) aborda a vulnerabilidade e a solidão na adolescência com muita sensibilidade, e prova que nem sempre um roteiro clichê pode ser ruim.



Kayla é uma adolescente que está no último ano do fundamental, numa época cheia de mudanças de comportamento e principalmente de visão do mundo que a cerca. Ela possui um canal no youtube onde grava vídeos dando dicas de maquiagem, dicas de vestuário, e falando sobre ter auto confiança e amar a si mesmo. Porém, na realidade, ela é muito diferente do que mostra nos vídeos e nas suas redes sociais.

O que mais falta em Kayla é justamente o amor próprio que ela tanto defende. Pouco confiante, na escola ela praticamente não conversa com ninguém, e quando é chamada para alguma festa acaba sempre ficando isolada de todos. Mas ela não é fechada apenas na rua; em casa, sua relação com o pai é ainda pior, onde ela chega a usar fones de ouvido durante as refeições para não ter que conversar na mesa.



Kayla, na verdade, é um retrato da juventude de hoje, da juventude das aparências. Está absurdamente triste mas abre um sorrisão para tirar uma foto e postar no seu instragram com intuito de ganhar likes. E assim vai vivendo, cada vez mais isolada, cada vez mais no seu próprio mundo. O filme abre um espaço para abordar também a descoberta da sexualidade quando Kayla se apaixona por um menino da turma e tenta se aproximar dele. 

O enredo parece bobo, e por vezes até não deixa de ser, mas traz alguns momentos bem interessantes e isso não se pode negar. A boa atuação da protagonista ajuda a amarrar o público na trama, bem como a direção firme de Burnham. Em resumo, Oitava Série é um filme "igual" a muitos outros já feitos sobre esse período da vida tão conturbado e cheio de dúvidas, mas com algumas pitadas de originalidade que fazem toda a diferença.

domingo, 28 de outubro de 2018

Recomendação de Filme #60

Mil Vezes Boa Noite - Erick Poppe (2013)

No meio de escombros, uma câmera fotográfica ensanguentada pelo chão. É com essa imagem que começa Mil Vezes Boa Noite (Tusen Ganger God Natt), do diretor norueguês Erik Poppe (Hawaii, Oslo / Águas Turvas). A cena infelizmente é quase rotina na vida de Rebecca (Juliette Binoche), uma fotógrafa de guerra que ganha a vida registrando momentos que poucos teriam coragem de registrar.



Casada e mãe de duas filhas, ela ama o que faz. A família por sua vez também sente orgulho da sua profissão, prova disso é a filha mais velha manter guardado um álbum com recortes de jornal contendo fotos tiradas pela mãe ao longo de todos os anos. Ao mesmo tempo, porém, todos sentem muito medo da insegurança e do que pode acontecer a Rebecca durante suas viagens de trabalho, e por isso o marido (Nikolaj Coster-Waldau) tenta a todo momento fazer com que ela desista da carreira.

Ela no entanto não larga a profissão por nada no mundo. Mais do que paixão pela fotografia, ela faz esse trabalho como uma tentativa desesperada de abrir os olhos do mundo para a maldade e a injustiça que existem em países onde conflitos são constantes. Os retratos que ela tira mostram a realidade nua e crua do que acontece nessas regiões, muitas vezes esquecidas pelo resto do mundo.



Aliás, o filme faz uma dura crítica justamente a esse pouco caso que os países desenvolvidos fazem a respeito do que acontece com os países de terceiro mundo. Quando a personagem diz que as pessoas estão mais preocupadas com a Paris Hilton saindo de um carro sem calcinha do que com as crianças morrendo na áfrica, não passa de um retrato cruel da realidade. No final, sentimos o mesmo que Rebecca: a sensação de revolta e impotência ao ver que as coisas irão continuar acontecendo e nós somos incapazes de mudar isso. 

O enredo, no entanto, foge da apelação, e encanta pela belíssima fotografia. A atuação de Binoche, como sempre, é excelente, mas todo o restante do elenco também está de parabéns. Mil Vezes Boa Noite é um filme que dói na alma, e confesso que fiquei em silêncio por um bom tempo após terminá-lo. Custou para digeri-lo. É triste ver quanta barbárie há longe das nossas vistas, e quanta maldade o ser-humano é capaz de fazer. Um filme que deveria ser visto por todos.

sábado, 27 de outubro de 2018

Crítica: Buscando... (2018)


Empolgante e inovador; essas são as palavras que eu uso para definir num primeiro momento Buscando... (Searching...), do diretor estreante Aneesh Chaganty. Usando como mote o desaparecimento de uma jovem numa pequena cidade norte-americana, o enredo discorre sobre diversos assuntos, mas fala principalmente sobre o uso excessivo da tecnologia e a consequente distância numa relação entre pais e filhos.



O filme logo de cara chama a atenção pelo seu formato de filmagem. Denominado como Screen Life, a técnica (que já foi utilizada em filmes como Amizade Desfeita e Nerve) consiste em mostrar praticamente toda a estória dentro de telas de computadores e celulares. Nos primeiros 10 minutos somos introduzidos diretamente na vida da família Kim até a trágica morte da mãe. Desta forma, David (John Cho) e a filha adolescente Margot (Michelle La) precisam reaprender a viver sozinhos na casa.

A relação dos dois é distante, o que cada vez é mais natural no mundo de hoje. David é totalmente alheio ao universo pessoal da filha, e os dois conversam muito pouco pessoalmente, mais por aplicativos. O único momento de lazer juntos é quando passa o programa favorito dos dois na televisão, mas fora isso, o contato é quase zero. A ação principal do filme começa quando Margot vai na casa de uma amiga participar de um grupo de estudos e não volta mais para casa. 



Desesperado, David começa a procurar pistas através das redes sociais da garota, até porque hoje em dia as redes dizem mais sobre todos nós do que qualquer outra coisa: do que a gente gosta, onde frequentamos, quem são nossos amigos mais próximos. Tudo que ele vai conseguindo descobrir vai sendo reunido numa teia de indícios, e para isso ele conta com a ajuda da detetive Vick (Debra Messing).

O filme é carregado de tensão, e toda hora surge uma pista nova que pode levar ao paradeiro da menina. O mais curioso é ver como David não conhecia absolutamente nada da rotina da própria filha, enquanto qualquer um podia saber pelos seus perfis pessoais. Na hora de ligar para algum conhecido, ele não sabia o nome de nenhum amigo, e não sabia nem mesmo que ela tinha largado as aulas de piano há meses. Um retrato da falta de diálogo dentro de casa e um alerta aos pais espectadores. E quando finalmente o caso parece ter sido resolvido, algo acontece e muda novamente toda a história, deixando o resultado final bem interessante.



Por fim, Buscando... traz um roteiro inteligentíssimo, cheio de reviravoltas, que não deixa pontas soltas no final.  É realmente muito bom ver o cinema se renovando quando todas as formas de se contar uma história pareciam ter se esgotado. Trata-se de um dos melhores filmes do ano.

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

12 filmes que poderão estar no Óscar 2019

Estamos nos aproximando do fim de mais um ano, e as especulações para o Óscar 2019 estão a mil. Como todos os principais festivais do mundo já foram realizados em 2017, é possível fazer uma prévia dos nomes que mais chamaram a atenção e podem estar concorrendo na premiação máxima do cinema no dia 24 de fevereiro. Confira a lista:


Roma (Alfonso Cuarón)

Depois de vencer o Leão de Ouro de 2018 em Berlim, e ser ovacionado no mesmo festival, Roma vem forte para ser um dos principais candidatos ao Óscar 2019 de melhor filme. O longa é dirigido por Alfonso Cuarón, vencedor do Óscar de melhor direção em 2014 por Gravidade, e isso já o credencia muito na disputa. A trama, filmada em preto e branco, aborda a vida de uma empregada doméstica que vive na capital italiana e precisa lutar diariamente para ter um espaço na hierarquia social.

O Primeiro Homem (Damien Chazelle)

Depois de surpreender com seu filme de estreia, Whiplash: Em Busca da Perfeição, e de conquistar Hollywood com o aclamado La La Land: Cantando Estações, Damien Chazelle tem grandes chances de retornar ao Óscar com seu mais novo trabalho, O Primeiro Homem. A cinebiografia de Neil Armstrong, o primeiro astronauta a pisar na lua, traz novamente a parceria do diretor com Ryan Gosling e recebeu muitos aplausos no Festival de Veneza.

If Beale Street Could Talk (Barry Jenkins)

Outro jovem diretor que surge como uma boa alternativa nessa edição do Óscar é Barry Jenkins. Depois de ter feito história em 2016 com Moonlight: Sob a Luz do Luar, ele deve voltar à premiação com If Beale Street Could Talk, que adapta um romance de mesmo nome escrito por James Baldwin. O filme promete novamente cutucar a sociedade americana sobre o tema do preconceito racial.

Nasce Uma Estrela (Bradley Cooper)

Estreia de Bradley Cooper na direção, Nasce Uma Estrela vem lotando as salas de cinema mundo à fora, inclusive no Brasil, e isso se dá muito pelo fato da cantora Lady Gaga ser a protagonista do filme. Mas ele vai muito além disso, e a prova de sua qualidade foram os aclamados elogios recebidos nos festivais por onde passou até então. O drama musical acompanha um casal de músicos que se conhece através da arte.

Green Book (Peter Farrelly)

Dirigido por Peter Farrelly e estrelado por Viggo Mortensen e Mahershala Ali, o filme conta a história de um recém-contratado motorista de um pianista negro e a viagem dos dois em uma turnê pelo sul dos Estados Unidos na década de 1960. No Festival de Toronto o filme foi muito elogiado e saiu como vencedor do prêmio popular, com destaque para as atuações e o tom leve do enredo. Green Book tem tudo para ser o filme "indie" desta edição do Óscar.

The Favourite (Yorgos Lanthimos)

Com um grande elenco, encabeçado por Emma Stone e Rachel Weiz, o novo filme do grego Yorgos Lanthimos tem tudo para estar na lista dos melhores filmes no Óscar, ou no mínimo na categoria de melhor roteiro (que é o forte do diretor). A comédia foca na figura de uma rainha, sua amiga fiel e uma nova serva do palácio, trazendo uma história de intrigas e traições mostrada de uma forma bem peculiar, característica do cinema de Lanthimos.

As Viúvas (Steve McQueen)

Outro filme com elenco de peso é As Viúvas, do diretor Steve McQueen (de 12 Anos na Escravidão). Com Viola Davis, Michelle Rodriguez, Liam Neeson, Colin Farrell e Robert Duvall, a trama gira em torno de 4 mulheres que precisam lidar com os problemas deixados pelos maridos, mortos em função de suas atividades criminosas. Além do elenco e da direção, o enredo ainda foi escrito por Gillian Flynn (de Garota Exemplar), o que cria ainda mais expectativa sobre ele.

Infiltrado na Klan (Spike Lee)

O novo filme de Spike Lee vem para botar mais uma vez o dedo na ferida da história americana de segregação, contando a história de um policial afro-americano que consegue se infiltrar na ordem da Ku Klux Klan. Indicado a Palma de Ouro em Cannes, ele acabou levando o prêmio do júri, e foi muito elogiado pela crítica na ocasião.

Vice (Adam Mckay)

O filme de Adam McKay (de A Grande Aposta) conta a história de Dick Cheney, um dos mais emblemáticos e importantes vices-presidente dos Estados Unidos. McKay retorna sua parceria com Christian Bale, que interpreta Cheney e novamente deve estar encabeçando a lista de melhores atores. Além dele, o filme ainda traz Steve Carell, Sam Rockwell e a grande Amy Adams.


Can You Ever Forgive Me? (Marielle Heller)

Dirigido por Marielle Heller, o filme conta a história real de uma jornalista que, numa crise financeira pessoal, decide forjar e vender cartas de personalidades já falecidas para ganhar dinheiro. A ideia estranha dá certo mas ela se torna alvo da polícia, e pra continuar lucrando precisa arrumar novas maneiras usando textos originais de arquivos e bibliotecas. O filme também vem sendo elogiado em festivais, principalmente a atuação de Melissa McCarthy.


Boy Erased (Joel Edgerton)

Dirigido por Joel Edgerton, Boy Erased traz um tema polêmico e muito atual. O filme conta a história de um garoto gay, de apenas 19 anos, que mora numa pequena cidade conservadora do Arkansas e se vê confrontado pela família: ou ele arrisca perder sua família e amigos ou entra num programa de terapia que busca a "cura" da homossexualidade. No elenco estão nomes como Nicole Kidman e Russell Crowe, mas quem chama a atenção mesmo é o menino Lucas Hedges (de Manchester à Beira-Mar).


Pantera Negra

É raro a academia dar espaço para filmes de super-heróis na categoria principal do Óscar, mas há uma grande possibilidade de Pantera Negra estar na lista final. Muitos críticos apostam nisso, e são fortes os rumores de que o príncipe de Wakanda, e primeiro super-herói negro do cinema, façam história em 2019.