quarta-feira, 28 de setembro de 2022

Crítica: Blonde (2022)


Desde que iniciaram suas filmagens, há cerca de três anos, "Blonde" se tornou um dos filmes mais aguardados por mim. Afinal de contas, estamos falando de um dos nomes mais marcantes da história do cinema mundial: Marilyn Monroe, ou para os mais íntimos, Norma Jeane, que surgiu em uma carreira meteórica na década de 1950 e nos deixou cedo, aos 36 anos de idade. Baseado no livro homônimo de Joyce Carol Oates, o filme de Andrew Dominik nos conta um pouco do que foi a vida da atriz, pegando desde sua infância conturbada vivendo com a mãe mentalmente problemática, até os abusos sofridos na carreira, passando ainda pela sua relação misteriosa com o presidente Kennedy.


Apesar da duração de 2h45, senti que o filme tratou alguns desses momentos de forma muito superficial, sobretudo a parte da sua infância, onde o diretor optou por pegar apenas um pequeno recorte e tentar convencer de que aquilo ali teria moldado a sua personalidade para o resto da vida. Porém, a questão da saúde mental de sua mãe, e principalmente o suspense que envolve a figura de seu pai, não são muito bem trabalhados, e o filme já pula rapidamente para sua fase adulta, sem responder perguntas importantes.

Desse ponto em diante, o roteiro é um emaranhado de situações tóxicas envolvendo Marilyn, que começa a ganhar espaço na mídia e na cena Hollywoodiana. Sabemos que a vida da atriz não foi nada fácil, mas o filme não dá sequer um alívio ao espectador, e parece querer mostrar apenas seu sofrimento da maneira mais chocante possível. As cenas envolvendo aborto, assim como as que envolvem abusos sexuais e assédios, são extremamente dolorosas de assistir.


As relações e os casamentos de Marilyn também são mostrados sem muitos detalhes de como iniciam ou terminam. Assim como no livro, aqui também vemos um "trisal" formado por Marilyn, o filho de Charlie Chaplin, Cass Chaplin, e o filho de Eddy Robinson. Tudo ficcional, como a própria autora deixa bem claro, mas justamente por ser inventado que acaba sendo desnecessária as longas cenas de sexo que são mostradas entre eles, bem como a importância dessa relação na vida e na carreira da atriz. Aliás, estou longe de ser puritano ou conservador, sobretudo quando estamos falando de arte, mas senti que o diretor foi bastante controverso ao tentar criticar a forma como a indústria americana utilizava o corpo de Monroe, mas ao mesmo tempo apresentar Ana de Armas nua em diversas situações em que realmente não se fazia necessário.


Por fim, Blonde me deixou com muitas dúvidas na cabeça, mas a principal delas foi sobre a verdadeira intenção que o diretor tinha ao apresentar a imagem de uma Marilyn tão frágil, passiva e subversiva. Nem tudo são flores na indústria cinematográfica, sabemos disso, mas essa visão sofrida da atriz me pareceu, sim, um pouco exagerada. As cenas que remetem a momentos icônicos de Marilyn Monroe, como a clássica filmagem do vestido esvoaçante em O Pecado Mora ao Lado, aliadas a uma atuação fenomenal de Ana de Armas (que certamente vai levar seu nome ao Oscar do ano que vem), são os únicos "refrescos" nesse filme tão pesado e melancólico, e o que de fato ainda faz valer a pena se sentar à frente da tela para assisti-lo


segunda-feira, 26 de setembro de 2022

Crítica: Não Se Preocupe, Querida (2022)


Não se Preocupe, Querida (Don't Worry Darling), segundo longa-metragem dirigido por Olivia Wilde, se tornou um dos filmes mais comentados e aguardados do ano, porém, não pela história contada, e sim por estar rodeado de polêmicas atrás das câmeras. Obviamente não cabe falar delas aqui, mas o fato é que isso fez com que pairasse uma dúvida no ar: as brigas nos bastidores interferiram no resultado final, ou Wilde conseguiu mostrar exatamente o que queria nas telas?


A trama de ficção científica se passa nos anos 1950, onde um magnata (Chris Pine) criou um programa chamado "Projeto Vitória", uma espécie de comunidade onde dezenas de casais parecem viver a vida dos sonhos. Nos primeiros minutos somos inseridos de forma gradual neste contexto, acompanhando o dia a dia destes personagens, mas ainda sem saber detalhes do que exatamente é este projeto e com qual intuito ele foi criado. Logo se percebe que esses casais vivem uma rotina metódica, quase como se fossem todos iguais, e um exemplo disso é o "ballet" de carros na saída dos homens para trabalhar. Aliás, é muito forte na comunidade a ideia dos homens serem os "provedores", enquanto as mulheres passam o dia em casa, lavando, cozinhando, e se preparando para satisfazer seus maridos quando estes retornarem para casa. É uma vida perfeita para os homens, aparentemente, mas o que eles fazem quando estão fora é um grande mistério. E as mulheres, qual o papel delas nessa vida regrada e repetitiva? Será que elas estão ali porque querem?

Quando uma delas começa a questionar essa realidade "perfeita", logo são aplicados tratamentos psiquiátricos, como se fosse uma insanidade fugir do padrão imposto. A personagem que finalmente consegue quebrar essa barreira é Alice (Florence Pugh), que passa a analisar a dinâmica do seu relacionamento com Jack (Harry Styles) e a dos vizinhos, e a perceber através de flashs e visões que não está vivendo a sua vida verdadeira, mas uma espécie de "vida paralela".

De um modo geral, o filme faz uma crítica sobre a busca incessante e utópica de se viver uma vida perfeita, sendo que isso é extremamente relativo. Na sua "vida anterior", Alice quase não conseguia se sentir feliz, pois o trabalho sugava toda a sua energia e isso estava afetando o seu relacionamento. E é aí que entra o questionamento que, para mim, define a ideia central do filme: será que valeria a pena abrir mão da liberdade de escolha para ter uma falsa e inebriante felicidade?



A parte técnica é impecável, com destaque para a fotografia, a ambientação da época e a trilha sonora. Porém, senti que alguns elementos foram inseridos de forma equivocada no roteiro, como os próprios flashs e visões do passado que a protagonista têm, que são um tanto quanto aleatórios e pouco contribuem de fato para a trama. O elenco não está mal, mas tive a impressão de que boa parte dos personagens tiveram menos tempo de tela do que deveriam, e dificultando a conexão com muitos deles. Por fim, Não Se Preocupe, Querida está longe de ser o desastre que muitos estão dizendo por aí, apesar de ter sim os seus defeitos e eles serem bem evidentes. Mas de certa forma, é um filme que me surpreendeu positivamente, e que mostra mais uma vez que Olivia Wilde tem um enorme potencial na direção.


terça-feira, 13 de setembro de 2022

Crítica: Você Não Estará Só (2022)


Marcando a estreia de Goran Stolevski na direção de um longa metragem, Você Não Estará Só (You Won't be Alone) foi "vendido" como um filme de terror psicológico, mas na verdade se trata de um drama bastante contemplativo, que apresenta sim algumas características de terror porém sem ter isso como elemento principal.


O enredo se passa em um lugar remoto do leste europeu e começa mostrando uma bruxa de aparência peculiar, chamada pelos locais de "Devoradora de Lobos", que tenta sequestrar uma bebê para transformá-la em uma bruxa como ela. Com intuito de proteger sua filha, a mãe (Kamka Tocinovski) acaba fazendo um trato: em troca de continuar cuidando da menina por mais um tempo, ela promete entregá-la para a bruxa quando completar 16 anos.

Os anos passam, e Nevena (Sara Klimoska), agora com 16 anos, finalmente passa a ter seu primeiro contato com o mundo, após passar anos escondida em uma caverna. Naturalmente, sua curiosidade com a vida dos humanos é atiçada o tempo todo, pois são várias sensações novas que estão prontas para serem descobertas. Quando mata uma camponesa acidentalmente, Nevena começa a usar a capacidade que ganhou da bruxa de adotar a identidade da pessoa morta, e passa a conviver em sociedade sem ser descoberta.

A partir deste momento, o foco do roteiro é justamente mostrar as descobertas de Nevena sobre a vida e as relações humanas. Pouco a pouco ela vai trocando de corpo com outras vítimas, o que a possibilita viver inúmeras experiências. É bem interessante como o roteiro faz isso ser bastante crível, mostrando por exemplo as reações das pessoas com as mudanças que naturalmente ocorrem no comportamento do humano que Nevena assumiu a identidade. Mesmo que seja sutil, o filme também faz uma abordagem sobre a desigualdade de gênero, pois é nítido que Nevena tem muito mais liberdade enquanto está na pele de homens, enquanto na pele de mulheres ela sofre violências e tem de lidar com um forte machismo.


Com uma atmosfera bem melancólica, You Won't be Alone acabou se tornando uma das principais surpresas do ano para mim. Gostei muito da fotografia e sobretudo das atuações, com destaque para a excelente atriz sueca Noomi Rapace.


domingo, 4 de setembro de 2022

Crítica: Trem-Bala (2022)


O cineasta David Leitch ganhou reconhecimento após ter dirigido alguns dos filmes de ação mais marcantes da última década, entre eles John Wick (2014), Atômica (2017), e Deadpool 2 (2018). Esta trajetória naturalmente criou uma expectativa no público e na crítica diante do seu novo trabalho, "Trem-Bala", que pode ser extremamente divertido para alguns, mas totalmente artificial para outros, dependendo do ponto de vista e do que cada um espera de uma obra cinematográfica.


O enredo segue um assassino de aluguel (Brad Pitt) que entra em um trem de Tóquio para pegar uma maleta cheia de dinheiro. Ele não contava, porém, que durante a viagem ia se deparar com outros assassinos entre os vagões, que tem suas histórias cruzadas umas com as outras. Desde o início já fica clara a proposta do diretor em ser totalmente descompromissado, mas a cada minuto que passa, o filme vai ficando mais bobo. O roteiro é uma verdadeira "colcha de retalhos", onde Leitch tenta misturar elementos do cinema de Tarantino, como os diálogos aleatórios entre uma cena e outra, com a agilidade do cinema de Guy Ricthie ou Park Chan-wook, e isso de fato torna o filme frenético do início ao fim mas não necessariamente bom.

O longa tem muitas cenas superficiais, como nas vezes em que o protagonista tenta sair do trem e não consegue, ou quando ele encontra a tal maleta que procurava de forma super fácil, como se alguém que tivesse carregando aquele montante de dinheiro fosse deixá-la tão desprotegida. Aliado a isso, temos várias piadinhas "sem graça" e cenas de luta que são vergonhosamente mal feitas.


Embora Brad Pitt tenha a galhofisse certa para o personagem, não tem como não achar forçada a sua atuação em alguns momentos, assim como a de todo o elenco envolvido, que ainda conta com participações especiais de Channing Tatum, Logan Lerman e Sandra Bullock. Aliás, todos os personagens são importantes para a trama, mas quase nenhum deles é realmente interessante de acompanhar, mesmo quando o diretor opta por mostrar eles em outros momentos de suas vidas. Para quem for olhar o filme sem compromisso algum, talvez possa ser sim uma experiência divertida, mas para mim foi tudo muito inverossímil.