quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Os 25 melhores filmes lançados no Brasil em 2018

Mais um ano está se aproximando do fim, e como já é de praxe chegou a hora de fazer aquele balanço anual do que aconteceu de melhor nas telas do cinema neste período. Então, confira abaixo a lista com os 25 melhores filmes lançados no Brasil em 2018:


25º Arábia, de João Dumans e Affonso Uchôa (Brasil)

Vencedor do Festival de Brasília, Arábia é um filme quase documental sobre a vida de um homem trabalhador que, dia após dia, luta pela sobrevivência nesse Brasil gigantesco e cheio de desigualdade. Incentivado a escrever uma peça teatral sobre sua vida, Cristiano (Aristides de Souza), trabalhador de uma fábrica, começa a escrever suas memórias e pouco a pouco passa a refletir sobre tudo que passou para chegar até onde está. Cristiano teve que peregrinar por todos os cantos do país em empregos muitas vezes desumanos e em locais insalubres, mas jamais deixou de seguir em frente, mesmo quando tudo parecia perdido. Com excelentes reflexões sobre a vida e seus percalços, Arábia é mais um belo exemplar do cinema independente brasileiro.

24º A Casa que Jack Construiu, de Lars von Trier (Dinamarca)

Se existe um diretor que não se curva às críticas para agradar um público maior, esse é Lars von Trier. Seu cinema nunca foi e nem nunca será fácil, e o que eu mais admiro nos seus trabalhos é a capacidade que ele tem de mostrar de forma sarcástica o pior lado do ser-humano. Ambientado nos anos 1970, A Casa que Jack Construiu mostra 12 anos na vida de um serial killer ardiloso, interpretado por Matt Dilon. O enredo utiliza a filosofia para entrar fundo na mente do psicopata, quase como se fosse uma sessão de psicoterapia, onde ele conta seus desejos e planos para um interlocutor, Virgílio (Bruno Ganz). Com cenas arrebatadoras, esse filme me proporcionou uma das experiências visuais mais incríveis e intensas que já tive dentro de uma sala de cinema.


23º Confronto no Pavilhão 99, de S. Craig Zahler (Estados Unidos)

Brutal e sem rodeios, o novo filme de S. Craig Zahler segue a linha do seu antecessor, Bone Tomahawk, e não economiza na violência. A trama acompanha Bradley Thomas (Vince Vaughn), sentenciado a sete anos de prisão após ser pego vendendo drogas. Ao chegar na prisão, ele recebe a notícia que sua mulher foi sequestrada e a única forma de manter ela viva é matando um dos prisioneiros, que está no pavilhão 99 da prisão de segurança máxima. O enredo faz uma homenagem aos filmes clássicos de prisão, mas com estilo próprio e único de um diretor que ainda tem muito a mostrar daqui pra frente.


22º Eu, Tonya, de Craig Gillespie (Estados Unidos)

O filme conta a história de Tonya Harding, uma das patinadoras de maior sucesso da história dos Estados Unidos, mas que foi banida do esporte e virou notícia no mundo todo após uma gravíssima denúncia envolvendo seu nome e o de seu marido na época. Apesar do teor cômico do filme, a história de vida de Tonya foi um verdadeiro pesadelo, desde sua infância com a mãe abusiva até o relacionamento tóxico e violento com o marido. O ponto alto do filme são as atuações, principalmente de Allison Janney, que faz a mãe da atleta.


21º Bohemian Rhapsody, de Bryan Singer (Estados Unidos)


De todos os filmes programados para serem lançados em 2018, Bohemian Rhapsody certamente era o que eu mais estava esperando. Como um grande fã de Queen, minha expectativa estava lá no alto, e foi gratificante ver o filme cumprindo bem seu papel nas telas. Compreendendo boa parte da carreira, da entrada de Freddie Mercury até o icônico show no Live Aid, o enredo emociona ao mostrar o lado humano dos membros da banda e principalmente a criação de algumas das canções mais famosas que marcaram e continuam marcando gerações. Destaque pra grande atuação de Rami Malek.


20º Severina, de Felipe Hirsch (Uruguai)

Filmes que falam do amor à literatura tem um lugar especial no meu coração. Severina, do uruguaio Felipe Hirsch, se situa dentro de uma livraria de Montevidéu e acompanha seu dono, um homem solitário que utiliza o tempo ocioso para ler e também se dedicar a escrever seu próprio livro. Sua rotina é alterada quando uma jovem mulher começa a frequentar o local todos os dias, sempre furtando algum livro de uma das prateleiras. Boa parte da trama consiste no mistério que envolve essa mulher e sua origem, o que desencadeia num roteiro bem simples mas muito bonito e repleto de diálogos marcantes.


19º Benzinho, de Gustavo Pizzi (Brasil)

O filme de Gustavo Pizzi é um retrato sensível e emocionante de uma família de classe média que mora no Rio de Janeiro e precisa lidar com as adversidades e surpresas da vida em meio a uma grave crise financeira. O enredo mostra com muita naturalidade o dia dia desta família que está buscando investir em um negócio novo enquanto busca levar a vida da melhor forma. O mote central da trama, porém, é quando o filho mais velho do casal recebe um convite para jogar handebol na Alemanha e a família fica dividida entre a felicidade de vê-lo chegar ao sucesso e a tristeza de ver a casa começando a ficar mais vazia.


18º Ella e John, de Paolo Virzi (Estados Unidos)


Quem nunca sonhou em comprar um trailer e sair pela estrada sem rumo, apenas curtindo o que a vida tem de bom pra oferecer? Pois essa sempre foi uma das atividades preferidas de Ella e John, desde que eram jovens namorados. Agora, aposentados, os dois resolveram relembrar os bons tempos numa longa viagem pelos Estados Unidos. Apesar de estarem se divertindo como se fosse a primeira vez, os dois não tem mais a mesma saúde de antes e ambos sabem que esta provavelmente será sua última viagem juntos. A trama tem cenas belíssimas, e flerta com o humor de forma muito racional. Talvez o maior êxito de Paolo Virzi foi mostrar esta parceria entre duas pessoas que, mesmo com o passar de tantos anos e dos inúmeros contratempos, continuam dispostos a dar todo amor e dedicação um ao outro, algo raro.


17º A Ganha-Pão, de Nora Twomey (Canadá)

É muito interessante parar para perceber como, de uns anos para cá, vem surgindo muitas animações críticas com temas realmente adultos. Finalista no Óscar de melhor animação, A Ganha-Pão se passa no Afeganistão e mostra, sob os olhos de uma criança, todos os horrores que o regime talibã, baseado em ideais religiosos ultrapassados, trouxe aos habitantes do país, sobretudo às mulheres. O clima do filme é pesadíssimo, mas não deixa de ter seus momentos singelos e bonitos. Uma grande obra sobre família, liberdade e sobretudo humanidade.


16º A Forma da Água, de Guillermo Del Toro (Estados Unidos)

Vencedor do Óscar deste ano de melhor filme e melhor direção, o novo filme de Del Toro dividiu opiniões ao trazer às telas o romance improvável entre uma mulher e uma criatura fantástica, capturada pelos agentes federais no meio da floresta amazônica. O enredo se passa numa época em que Estados Unidos e União Soviética travavam uma guerra científica, sem contar as inúmeras mudanças sociais ocorridas naquele período, e isso tudo foi encaixado com perfeição na trama. Visualmente, A Forma da Água é deslumbrante, e tem cenas memoráveis.


15º O Que as Pessoas Vão Dizer, de Iram Haq (Noruega)

Representante da Noruega no Óscar 2019, O Que as Pessoas Vão Dizer traz novamente à tona a discussão da liberdade individual sendo sufocada por dogmas religiosos, mostrando a história de Nisha, uma adolescente que vive no seio de uma família muçulmana na capital norueguesa. Apesar da pressão da família para seguir as tradições da religião, Nisha quer ser como toda jovem de sua idade, quer frequentar festas, namorar e, principalmente, ter liberdade de escolhas. Mas infelizmente, como muitas Nisha's que existem por aí no mundo, ela se vê obrigada a carregar o triste peso de viver uma vida que não é dela.


14º Promessa ao Amanhecer, de Éric Barbier (França)

Cinebiografia do romancista francês Romain Gary, Promessa ao Amanhecer conta, através de seus próprios escritos, como foi sua infância e adolescência ao lado da mãe, uma mulher forte, corajosa e que fazia de tudo pelo bem do filho. Foi nessa relação maternal que Gary se agarrou para seguir vivendo, mesmo com todos os problemas que o atingiam e o faziam querer desistir a todo instante. O que mais chama a atenção no longa é a fotografia e a atuação impressionante de Charlotte Gainsbourg,  talvez a melhor que já vi da atriz em toda sua carreira.

13º Três Anúncios Para um Crime, de Martin McDonagh (Estados Unidos)

Com um roteiro inteligentíssimo e um humor negro afiado, o filme de Martin McDonagh era meu grande favorito ao óscar deste ano. A trama acompanha uma mulher (Frances McDormand) que teve a filha brutalmente assassinada e busca resposta das autoridades. Indignada por estar vendo o caso sendo cada vez deixado mais de lado, ela resolve fazer outdoors pela estrada exigindo ações do detetive Willoughby (Woody Harrelson), que por sua vez também se sente culpado por não conseguir ir adiante nas investigações. O filme tem muitos diálogos marcantes, mas o que chama a atenção de verdade é a atuação de McDormand, que lhe rendeu o Óscar de melhor atriz.

12º Sem Amor, de Andrey Zvyagintsev (Rússia)

Nessa sociedade carente de amor, afeto e empatia que vivemos hoje, Sem Amor se torna um filme muito atual ao acompanhar um casal que viveu por anos juntos mas que agora está em processo de divórcio. O motivo nada mais é que o "desamor" que surgiu entre eles com o passar do tempo, algo comum nas relações humanas. O problema é que no meio disso tudo está o filho do casal, de apenas 12 anos, símbolo de uma geração criada com falta de atenção e carinho. Aliás, todos os personagens do filme são bastante frios, e isso é bem chocante. Em algum momento é mostrado o casal vivendo novos amores após o fim, mas infelizes da mesma forma, o que prova que não basta mudar de amor se você não mudar a maneira de agir e amar as pessoas ao seu redor.


11º A Vida em Si, de Dan Fogelman (Estados Unidos)

A vida como ela é, simples, com seus desenlaces, suas pequenas e grandes tragédias e principalmente suas surpresas. O filme de Dan Fogelman se divide em capítulos e mostra com muita sensibilidade a forma como histórias de vida se cruzam de forma natural. De um casal em Nova Iorque a uma família na Espanha, todos de alguma forma estão interligados, e o roteiro inteligentíssimo e muito bem montado consegue mostrar isso de forma primorosa. 


10º Buscando..., de Aneesh Chaganty (Estados Unidos)

Empolgante e inovador, Buscando... utiliza o sumiço de uma jovem numa cidade norte-americana para discorrer sobre diversos assuntos atuais, como o uso excessivo das tecnologias e a consequente distância numa relação entre pais e filhos. Obviamente, o que chama a atenção de cara no filme é o seu formato de filmagem, chamado "Screen Life", onde praticamente toda a ação do enredo é mostrada dentro de telas de celulares ou notebooks, que o pai utiliza para tentar descobrir o que poderia ter levado ao sumiço da menina. O filme é carregado de tensão e traz um final bem imprevisível.

9º O Insulto, de Ziad Douieri (Irã)

O Insulto parte de uma situação corriqueira e simples (um cano quebrado na rua) para abordar a intolerância e, sobretudo, mostrar como o ser-humano vive à flor da pele, onde uma pequena "faísca" é capaz de gerar um conflito de proporções absurdas. Um muçulmano e um cristão estão no centro dessa briga, que vai parar nos tribunais até chegar à mídia, e aí explodir de vez numa "guerra" entre os dois lados da cidade. O mais importante do longa é a mensagem que ele passa, extremamente relevante nos tempos de polarização em que vivemos.


8º O Motorista de Táxi, de Jang Hoon (Coréia do Sul)


O filme de Jang Hoon mistura drama e humor para abordar um dos períodos mais difíceis da história da Coréia do Sul, quando o país passou por uma violenta ditadura militar. E tudo isso sob a visão de um cidadão comum, um motorista de táxi, que sem querer acaba fazendo sua parte para mudar a história ao transportar um fotógrafo estrangeiro. Muito mais do que entretenimento, o filme serve de lição para que coisas como essa nunca mais aconteçam em lugar nenhum do mundo.

7º Foxtrot, de Samuel Maoz (Israel)

Com uma montagem louvável e um enredo impecável, Foxtrot usa três atos, contados de forma não-linear, para criticar ferrenhamente o exército de Israel, o que inclusive gerou polêmica com ministros do país na época do seu lançamento. O primeiro ato mostra uma família recebendo a notícia da morte do filho, enquanto o segundo mostra a rotina do mesmo enquanto estava cuidando de uma fronteira do país. O terceiro ato, por sua vez, junta as partes e fecha o filme brilhantemente, sem deixar nada para trás. Uma das coisas que mais chamam a atenção é sua fotografia, com enquadramentos que beiram a perfeição numa verdadeira aula de como se fazer cinema.


6º Uma Noite de 12 Anos, de Álvaro Brechner (Uruguai)

Na segunda metade do século 20 todos os países do sul da América do Sul passaram por algum período ditatorial, e Uma Noite de 12 anos mostra um pouco do que foi o regime militar no Uruguai, que durou exatos 12 anos. A trama se passa dentro de uma das prisões do regime e acompanha três prisioneiros e suas mil maneiras de seguir com esperança em meio a violentas torturas físicas e psicológicas. Entre eles estava Pepe Mujica, que se tornou presidente do Uruguai em 2010. Tive o prazer de ver esse filme no cinema, o que me proporcionou uma das experiências sensoriais mais impressionantes até então, quando a sala inteira aplaudiu de pé logo após o final do filme.

5º Viva - A Vida é uma Festa, de Lee Unkrich (Estados Unidos)

Desde que comecei a postar listas dos melhores nos finais de ano, essa é a primeira vez que uma animação fica entre os primeiros. E não poderia ser diferente, já que Viva - A Vida é Uma Festa é, provavelmente, um dos melhores filmes já lançados do gênero. Abordando com muita sensibilidade temas como morte e família, ele é um filme que toca fundo na alma de quem o assiste, seja da idade que for. Além da belíssima mensagem que a estória transmite, é muito legal também para conhecer um pouco mais sobre a cultura mexicana e suas tradições.

4º The Great Buddha +, de Huang Hsin-yao (Taiwan)

Representante de Taiwan no próximo Óscar de melhor filme estrangeiro, The Great Buddha + descreve com muita sensibilidade e doses de humor o dia-dia de um vilarejo do país, se aprofundando em aspectos de uma cultura pouca conhecida para os lados de cá. O enredo acompanha dois trabalhadores de uma fábrica de estátuas de bronze, onde está sendo construído um grande Buda. Grandes amigos, os dois se reúnem todas as noites para botar conversa fora, até que encontram um novo "hobbie". O que mais me conquistou nesse filme foi sua forma poética de contar a estória, com diálogos espirituosos e cheios de reflexões sobre a vida.


3º The Square - A Arte da Discórdia, de Ruben Ostlund (Suécia)

Provocativo, intenso e com um senso de humor diferenciado, o filme de Ruben Ostlund impressiona desde as primeiras cenas com sequências originais. A trama acompanha o curador de um conceituado museu de arte moderna de Estocolmo, que está prestes a receber uma nova exposição, chamada The Square, que segundo a autora tem a intenção de sensibilizar o público sobre a importância da empatia. Ao mesmo tempo em que apoia a exposição, o mesmo age de forma mesquinha com todos ao redor, e Ostlund usa isso para criticar a hipocrisia no ser-humano. Não é um filme fácil, pelo contrário, mas quando você consegue "pescar" sua essência e entrar fundo na estória, a experiência se torna única.


2º Custódia, de Xavier Legrand (França)


O cinema contemporâneo francês possui uma forte característica de crítica social, e o filme do estreante Xavier Legrand não foge disto. O enredo acompanha um casal que acabou de se divorciar, focando na disputa dos dois pela guarda do filho de 11 anos. É um filme com cenas bem pesadas, que mostra sobretudo o drama de viver em um relacionamento abusivo e violento. Num tempo onde todos os dias vemos notícias de mulheres sendo agredidas e mortas por ex-maridos, esse filme se torna absolutamente atual.

1º Infiltrado na Klan, de Spike Lee (Estados Unidos)

"Essa parada é baseada em fatos pesadíssimos", já avisava o primeiro letreiro do filme, mas ainda assim confesso que eu não estava preparado para ver o que eu vi. Voltando a mexer na ferida da segregação racial nos Estados Unidos, Spike Lee trouxe às telas um dos filmes mais pesados e críticos dos últimos anos. Passando-se nos anos 1970, o enredo acompanha um policial negro (John David Washington) que começa a se passar por um homem branco para tentar se infiltrar na Ku Klux Klan. No cenário atual, onde discursos de ódio ganharam voz sob a desculpa da "liberdade de expressão", este filme se tornou extremamente necessário e é impossível termina-lo indiferente. Por isso, é para mim o grande longa do ano.

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terça-feira, 25 de dezembro de 2018

Crítica: A Vida em Si (2018)


Criador da série de televisão "This is Us", que aborda as relações humanas com muita sensibilidade e é, por sinal, um dos melhores seriados da atualidade, Dan Fogelman se aventura no cinema pela segunda vez na carreira e nos traz um filme cheio de lições, com uma bela mensagem de resiliência e amor à vida.



O longa tinha tudo para ser mais um clichê do esgotado cinema norte-americano, mas logo na primeira cena já dá para perceber que ele tem sua originalidade, com a aparição perspicaz e engraçadíssima de Samuel L. Jackson. É ele que dá início a primeira estória, de Mary (Olivia Wilde) e Will (Oscar Isaac), um casal apaixonado que está esperando um bebê. Porém, começa mostrando Will numa terapeuta tentando lidar com algum trauma envolvendo o casal, o que nos faz questionar o que teria acontecido entre eles, que vai sendo mostrado gradativamente.

O segundo capítulo conta a vida de Dylan (Olivia Cooke), uma jovem rebelde que vive com o avô e canta numa banda de rock agressiva. Sem muita perspectiva de futuro, Dylan também vive de um trauma, de algo que aconteceu na sua infância, e todo dia precisa aprender a lidar com isso. O terceiro capítulo, por sua vez, acompanha uma família na Espanha, chefiada por Javier González (Sergio Peris-Mencheta), que trabalha na fazenda de Vincent (Antonio Banderas). De alguma forma, essa família, do outro lado do mundo, acaba interligando com a estória dos primeiros capítulos.



A complexidade do roteiro é o que mais chama atenção, que ganha ainda mais força graças as boas atuações do elenco. Nomes como Antonio Banderas, Olivia Wilde e Oscar Isaac só abrilhantam ainda mais a trama. É um filme sensível em sua essência, recheado de cenas impactantes e muitas lições. Sem contar, é claro, a ótima trilha sonora regada a Bob Dylan. Com certeza um dos grandes achados desse final de ano.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Crítica: Papillon (2018)


Eu sempre fico com o pé atrás quando anunciam a refilmagem de algum clássico do cinema, e com Papillon não poderia ser diferente. Apesar da desconfiança eu fui com a mente aberta assisti-lo, principalmente por causa dos nomes envolvidos: Charlie Hunnam e Rami Malek, dois atores que admiro muito, e posso dizer que saí feliz com o resultado final.


A trama se passa nos anos 1930 e narra a história real de Henri Carrière, apelidado de Papillon, que foi preso na França acusado de assassinato. Junto com outros milhares de prisioneiros, Papillon (Charlie Hunnam) foi levado à colônia prisional Devil's Island, na Guiana Francesa, uma das prisões mais isoladas do mundo justamente por ficar em uma ilha. Logo de cara ele conhece o falsário Louis Dega (Rami Malek), que tem dinheiro guardado e promete ajudá-lo a fugir, desde que em troca ele o proteja e o ajude a se manter vivo, e com isso os dois se tornam inseparáveis.

Como era de se esperar, é impossível não comparar o filme de 2018 com o de 1973, e a primeira comparação que trago aqui é em relação a Papillon e Dega. Apesar de estarem muito bem em seus papéis, Hunnam e Malek não conseguem mostrar o mesmo carisma que havia entre Dustin Hoffman e Steve McQueen. A segunda comparação é quanto à violência do filme, que na versão atual ficou muito mais realista e visceral, um ponto positivo ao meu ver.


Com uma borboleta tatuada no peito, Papillon simboliza o desejo de liberdade, de alguém que não pode viver enclausurado. Perseverança e amor à vida, mesmo diante de um cenário bárbaro, é o mote central dessa história tão bonita, que ganha ainda mais força com a mensagem que traz sobre amizade e afeto.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Crítica: Uma Noite de 12 Anos (2018)


Entre os anos 1950 e os anos 1980, todos os países do sul da América do Sul passaram por algum período de ditadura militar. Foram 35 anos de regime no Paraguai, 21 no Brasil, 17 no Chile, 7 na Argentina, e 12 no Uruguai, que teve por sua vez uma das mais violentas. E é dentro deste momento conturbado do país que se passa Uma Noite de 12 Anos (La Noche de 12 Años), novo filme do diretor Álvaro Brechner.


O filme ganhou notoriedade ao prometer mostrar a prisão de Pepe Mujica durante o regime, o mesmo Mujica que se tornou presidente do Uruguai entre 2010 e 2015. Entretanto, Mujica não é o único protagonista da estória, inclusive é um dos que menos aparecem durante o longa. Junto dele foram presos outros dois de seus amigos, Mauricio Rosencof e Eleutério Huidobro, todos membros do Tupamanos, grupo que lutava na época contra o militarismo.

Apesar de serem presos ao mesmo tempo, os três passaram anos isolados em suas celas individuais, uma mais escura e insalubre que a outra. Foram anos de torturas, físicas e psicológicas, mas eles nunca desistiram. Com determinação e amor à vida, cada um buscou de alguma forma manter a sanidade no meio do desespero, com a esperança de que um dia aquilo tudo iria acabar.


O roteiro tem uma atmosfera bem claustrofóbica, que serve para dar ao espectador ainda mais veracidade na sensação de enclausuramento. Acabei tendo uma das experiências sensoriais mais incríveis da minha vida ao ver esse filme no cinema quando, após o seu fim, a sala inteira, aos prantos, aplaudia de pé. Todos com certeza estavam unidos em um único pensamento, de que a gente jamais deve deixar que algo do gênero volte a se repetir em qualquer lugar do mundo.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Os indicados ao Globo de Ouro 2019


Foram anunciados nesta quinta-feira (6) os indicados ao Globo de Ouro 2019. Concorrendo em seis categorias, Vice, de Adam McKay, é o filme mais indicado da vez, seguido de Nasce Uma Estrela, A Favorita e Green Book: O Guia, cada um com cinco. A cerimônia ocorre dia 06 de janeiro, em Beverly Hills.

Melhor filme - Drama
- Bohemian Rhapsody
- If Beale Street Could Talk
- Infiltrado na Klan
- Nasce uma Estrela
- Pantera Negra

Melhor filme - Comédia/Musical
- A Favorita
- Green Book: O Guia
- O Retorno de Mary Poppins
- Podres de Ricos
- Vice

Melhor Direção
- Adam McKay, de Vice
-Alfonso Cuarón, de Roma
- Bradley Cooper, de Nasce uma Estrela
- Peter Farrelly, de Green Book: O Guia
- Spike Lee, de Infiltrado na Klan

Melhor Atriz - Drama
- Glenn Close, por A Esposa
- Lady Gaga, por Nasce uma Estrela
- Melissa McCarthy, por Can You Ever Forgive Me?
- Nicole Kidman, por Destroyer
- Rosamund Pike, por A Private War

Melhor Ator - Drama
- Bradley Cooper, por Nasce uma Estrela
- John David Washington, por Inflitrado na Klan
- Lucas Hedges, por Boy Erased
- Rami Malek, por Bohemian Rhapsody
- Willem Dafoe, por At Eternity's Gate

Melhor Atriz - Comédia/Musical
- Charlize Theron, por Tully
- Constance Wu, por Podres de Ricos
- Elsie Fisher, por Oitava Série
- Emily Blunt, por O Retorno de Mary Poppins
- Olivia Colman, por A Favorita

Melhor Ator - Comédia/Musical
- Christian Bale, por Vice
- John C. Reilly, por Stan $ Ollie
- Lin-Manuel Miranda, por O Retorno de Mary Poppins
- Robert Redford, por The Old Man and the Gun
- Viggo Mortensen, por Green Book: O Guia

Melhor Atriz Coadjuvante
- Amy Adams, por Vice
- Claire Foy, por First Man
- Emma Stone, por A Favorita
- Rachel Weisz, por A Favorita
- Regina King, por If Beale Street Could Talk

Melhor Ator Coadjuvante
- Adam Driver, por Infiltrado na Klan
- Mahershala Ali, por Green Book: O Guia
- Richard E. Grant, por Can You Ever Forgive Me?
- Sam Rockwell, por Vice
- Timothee Chalamet, por Beautiful Boy

Melhor Roteiro
- A Favorita
- Green Book: O Guia
- If Beale Street Could Talk
- Roma
- Vice

Melhor Filme em Língua Estrangeira
- Capernaum, do Líbano
- Girl, da Bélgica
- Never Look Away, da Alemanha
- Roma, do México
- Shoplifters, do Japão

Melhor Filme de Animação
- Homem-Aranha no Aranhaverso
- Ilha dos Cachorros
- Mirai
- Os Incríveis 2
WiFi Ralph: Quebrando a Internet

Melhor Trilha Sonora Original
- Ilha dos Cachorros
- O Primeiro Homem
- O Retorno de Mary Poppins
- Pantera Negra
- Um Lugar Silencioso

Melhor Canção
- All the Stars, de Pantera Negra
- Girl in the Movies, de Dumplin
- Requiem for a Private War, de A Private War
- Revelation, de Boy Erased
- Shallow, de Nasce uma Estrela

sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Crítica: Infiltrado na Klan (2018)




"Essa parada é baseada em fatos pesadíssimos". É com essa frase que começa Infiltrado na Klan (Blackkksmann), novo filme do diretor Spike Lee, que volta a mexer na ferida da segregação e do preconceito racial nos Estados Unidos.


No fim dos anos 1970, Ron (John David Washington) começa a trabalhar como policial em Colorado Springs. Por ser negro em um departamento de muito preconceito, ele acaba ficando responsável apenas por cuidar dos arquivos, mas seu desejo é virar detetive. Ele ganha a chance de ir pra rua quando pedem para ele se infiltrar em uma reunião dos Panteras Negras que está para acontecer na cidade.

A operação é um sucesso, e logo Ron decidi ir mais longe, dessa vez do outro lado da história. Ao ver um anúncio da Ku Klux Klan no jornal, ele liga e se mostra interessado a ingressar no grupo. Sua boa lábia é suficiente para fazer com que acreditem que estão diante de um grande potencial, e eles aceitam uma reunião com ele para fazer sua iniciação. Porém, como um homem negro conseguirá se juntar a um grupo que defende a supremacia branca? É aí que entra a figura de Flip Zimmermann (Adam Driver), um policial do mesmo distrito que aceita se passar por Ron nas reuniões do grupo.


Uma das questões mais inteligentes do filme é o fato do policial Zimmermann ser judeu e nunca ter se preocupado com a Ku Klux Klan, pois para ele era algo que passava longe e não lhe trazia perigo algum por ser um homem branco. Se não atingia ele, porque se preocupar com os outros, não é mesmo? Somente depois de começar a frequentar as reuniões que ele enxergou que sua "raça" também não era bem quista, e isso diz muito sobre a maneira egoísta que muitas pessoas pensavam e ainda pensam até hoje em relação a direitos das minorias, sendo que as vezes elas mesmas fazem parte delas.

Spike Lee não economiza nas duras falas racistas, que poderiam até mesmo nos chocar caso não estivéssemos acostumados a ler coisas parecidas nos comentários da internet. No final do filme, são mostradas cenas da passeata nazista ocorrida na cidade de Charlottesville em 2017, que terminou em confusão e chocou o mundo todo. Coisas como essa, acontecendo em pleno século XXI, só provam como a humanidade evoluiu pouco dos anos 1960 para cá.


Com um bom roteiro, boas atuações e críticas afiadas, Infiltrado na Klan já pode ser considerado um dos melhores filmes do ano, e vem forte na corrida do próximo Óscar. No cenário atual do mundo, inclusive do Brasil, esse filme se torna extremamente necessário. Num momento em que a disseminação de ódio começa a ganhar espaço sob a forma de "liberdade de expressão", é preciso repensar o que queremos como sociedade.

Crítica: Bohemian Rhapsody (2018)


Desde de que saiu o anúncio de que seria filmada uma cinebiografia de Freddie Mercury, um dos maiores - se não o maior - cantor de rock n' roll da história, a expectativa dos fãs (e nesse grupo eu me incluo) foi lá no alto. Escrito por Anthony McCarten (de A Teoria de Tudo) e dirigido por Bryan Singer (da saga X-Men), Bohemian Rhapsody finalmente estreou nos cinemas do mundo todo após uma conturbada pré-produção, mas a demora valeu a pena. O filme cumpriu bem seu papel de emocionar os fãs e contar a história de uma das figuras mais icônicas que já viveu na terra.


O roteiro de Bohemian Rhapsody compreende o período desde o momento em que Mercury entra na banda até o histórico show no festival Live Aid, em 1985, passando pelos momentos cruciais do grupo ao longo de toda sua trajetória. Singer optou aqui por não seguir uma ordem cronológica correta, o que de certa forma não atrapalha o resultado final mas deixa quem é fã um pouco incomodado em certos momentos.

Ao longo do filme podemos acompanhar também a criação de alguns dos maiores hinos da banda, como We Will Rock You, Another One Bits the Dust, I Want to Break Free e, claro, a música que dá nome ao filme. Senti falta de ver algumas outras clássicas da banda, que ficaram de fora, mas entendo que, mesmo num filme de 2h15m, não seria fácil encaixar todas.


É interessante a maneira que é mostrada a sexualidade de Mercury. Muitos temiam que a bissexualidade do cantor fosse suprimida para agradar um público maior, mas isso ficou apenas em boatos. Há espaço tanto para a bonita relação que Freddie teve com Mary Austin (Lucy Boynton), que o fez criar a linda Love of My Live, como a relação com Jim Hutton (Aaron McCusker) com quem ficou até os últimos dias de vida.

Bom, e o que dizer de Rami Malek? Perfeito em sua personificação, o ator, que já havia conquistado o mundo na série Mr. Robot, mostra todo seu talento numa das atuações mais impressionantes do ano. Uma aula de estudo do personagem e seus trejeitos. Outro ator que se destaca pela semelhança é Gwilym Lee, que interpreta o guitarrista Brian May.


Como um bom fã de Queen, digo que a sensação de ver este filme numa tela grande de cinema foi única. Impossível não sentir vontade de chorar nas cenas finais, com a recriação perfeita do show do Live Aid, que praticamente te coloca dentro do estádio de Wembley numa experiência sensorial impressionante.


quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Crítica: A Casa que Jack Construiu (2018)


Cinco anos depois do lançamento de Ninfomaníaca, Lars von Trier está de volta aos cinemas com A Casa que Jack Construiu (The House That Jack Built), uma história que, adivinhem, causou polêmica por todo lugar onde passou. Isso virou rotina em sua carreira, já que ele nunca foi o tipo de diretor que se curva às críticas para agradar a todos, e esse é justamente um dos motivos pelos quais sou seu grande fã.



Ambientado nos Estados Unidos dos anos 1970, o longa acompanha 12 anos na vida de Jack (Matt Dilon), um serial killer ardiloso que se vangloria de nunca ter sido pego pela polícia. Contado sob a perspectiva do próprio personagem, o filme mostra cinco de seus crimes, e a forma engenhosa como ele procede em cada um deles. O curioso é que ao matar suas vítimas Jack não se desfaz dos corpos. Ele junta todos em uma sala frigorífica para, morbidamente, usá-los em poses diferentes para fotos, até o dia em que conseguirá juntá-los para fazer aquela que ele acredita que será sua grande obra de arte.

Ao longo do filme, o espectador vai acompanhando a descrição de cada assassinato com todos os seus detalhes aterrorizantes, além de adentrar fundo na mente doentia do psicopata, que tenta explicar suas ideias para seu interlocutor, Virgílio (Bruno Ganz), o poeta romano e guru de Dante na descida ao inferno em Divina Comédia (isso faz todo o sentido no final, pode ficar tranquilo). É quase como se fosse uma sessão terapêutica do personagem para falar a verdade. Assim como fez em seu último trabalho, aqui von Trier também usa e abusa de imagens externas e colagens na tela (até mesmo de outros filmes seus) para criar uma atmosfera filosófica. Diálogos sobre arquitetura, música, literatura e artes em geral se tornam até um pouco enfadonhos depois de um tempo, mas são interessantes para mostrar como a cabeça de Jack funciona e enxerga o que faz.



O clima do filme é extremamente pesado, e algumas cenas te fazem compreender porque há tantos relatos de abandonos das salas de cinema durante sua apresentação, como no Festival de Cannes, por exemplo. Isso aconteceu também na sessão em que assisti o filme, principalmente depois de cenas envolvendo crianças, que são as mais difíceis de digerir. Não, não se trata de um filme fácil, mas a violência contida nele não é de maneira nenhuma gratuita. Há, entretanto, momentos belíssimos no filme, como as passagens em que Jack descreve sua infância com uma intimidade tocante.

O filme todo traz uma fotografia bastante melancólica e fria, mas atinge seu ápice no epílogo, chamado Katabasis (termo grego referente à "descida"), onde traz uma experiência visual impressionante com cenas expressionistas que por si só já valem o ingresso. Na parte das atuações, temos um Matt Dilon bastante convincente neste que talvez seja um dos seus papéis mais desafiadores da carreira, e há ainda que se elogiar a trilha sonora, muito bem elaborada.



Por fim, o cinema de von Trier não é nada fácil, nem nunca será. É o típico "ame-o ou odeie-o", e eu particularmente faço parte do seleto primeiro grupo. Gosto muito da forma como o diretor consegue mostrar o pior lado do ser-humano em seus filmes, e sua forma sarcástica de abordar assuntos polêmicos. Neste caso, a morte como obra de arte. Genial.