terça-feira, 18 de novembro de 2014

Crítica: Relatos Selvagens (2014)


Escrita e dirigida por Damián Szifron, Relatos Selvagens (Relatos Salvajes) é uma excelente comédia de humor negro que, de forma inteligente, foge de qualquer esteriótipo do gênero. O filme consiste em uma pequena introdução seguida de 5 histórias diferentes, que não tem relação alguma entre elas, a não ser mostrar os limites do ser-humano ao perder o controle com situações do cotidiano de qualquer centro urbano.


A primeira (e mais curta) história inicia o filme de forma brilhante, como uma introdução ao que viria pela frente. Em pleno ar durante uma viagem de avião, os passageiros começam a conversar e descobrem que, de alguma forma, todos possuem um laço negativo com uma mesma pessoa, um aspirante a músico. Intrigados, logo descobrem que essa mesma pessoa está na cabine do avião, e tudo não passa de um plano de vingança muito bem elaborado.

Após o início fenomenal, somos enviados para um restaurante de beira de estrada, onde uma garçonete é obrigada a atender um desafeto do passado, responsável pela morte de seu próprio pai. Ela deseja fazer alguma coisa para se vingar do homem, mas lhe falta coragem, ainda que seja insistentemente incentivada pela dona do local a colocar veneno de rato em sua comida. A trama se desenrola até terminar da forma mais inesperada possível, e o destaque fica por conta da cozinheira e dona do local, interpretada por Rita Cortese.


Aliás, o grande trunfo do filme são as formas nada convencionais com que as histórias chegam ao fim. A originalidade individual de cada uma é impressionante, não deixando margens para qualquer previsibilidade. A segunda história é uma das mais engraçadas do filme, e mostra uma briga épica de trânsito. Um homem xinga outro no meio da estrada, mas por uma ironia do destino seu carro estraga logo mais a frente, e ele se vê indefeso quando o outro o alcança e lhe ameaça violentamente. Apesar do teor cômico, o final é o mais macabro de todos.

Na terceira história, temos Simon Fischer (Ricardo Darín), um engenheiro, pai de família, que trabalha numa empresa responsável por implosões com explosivos. Mais do que tudo, esse trecho faz uma pesada crítica à burocracia dos serviços públicos, e principalmente a corrupção que existe no meio deles. O carro do engenheiro é guinchado toda semana, mesmo sem motivo, e para retirá-lo ele deve sempre arcar com uma multa pesada e com a falta de consideração dos servidores.


Na quarta história, a trama faz uma crítica aos ricos e poderosos que pensam ser capazes de tudo. Quando o filho de um milionário atropela fatalmente uma mulher grávida, começa um longo plano da família para esconder o crime. Para inocentar o garoto, o pai promete uma boa grana ao empregado da casa para que ele finja ter sido ele o motorista do carro na noite anterior. No entanto, entram na jogada o advogado de defesa da família e o detetive, que também querem uma boquinha do plano.

Por último, temos um casamento dos sonhos que termina em um verdadeiro pesadelo. Durante a festa, a noiva descobre que o marido a traiu com uma colega de trabalho, que inclusive está no local, e a partir disso ela começa uma vingança. A festa do casamento se torna um verdadeiro caos, em uma das sequências mais malucas e sádicas do cinema, fechando com chave de ouro o longa.


Diferente das comédias brasileiras, onde piadas sobre fratulência ainda são vistas como engraçadas, as comédias argentinas sempre demonstraram maturidade, e é justamente isso que conquista o público. Não é à toa que o longa foi um estrondoso sucesso na Argentina, tendo sido o mais visto do ano até então por lá. Foi ainda o único filme da América-Latina a entrar na competição oficial de Cannes desse ano, sendo aplaudido no final da sessão com louvor. A cereja do bolo foi sua escolha para representar a Argentina no Óscar de melhor filme estrangeiro em 2015.

Ricardo Darín é o nome mais conhecido do filme, mas todo o elenco trabalha de forma primorosa. A fotografia também é sensacional, assim como a trilha sonora, feita no capricho. Apesar das situações malucas, todas são passíveis de acontecer a qualquer um, até porque, afinal, quem nunca perdeu as estribeiras e teve um acesso de raiva?


Um comentário:

  1. Eu não amo o filme, mas eu vi que Leonardo Sbaraglia age sobre ele e eu gostei seu trabalho em outros projetos.

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