Depois do aclamado Paraíso (2016), que foi escolhido na
época para representar a Rússia no Óscar de melhor filme em língua
estrangeira, o veterano cineasta Andrei Konchalovsky volta aos holofotes
com Caros Camaradas! (Dear Comrades!), filme que fala diretamente sobre a
luta da classe trabalhadora e a opressão de um governo totalitário.
O
enredo se baseia num fato verídico que ocorreu na União Soviética em
1962, e que ficou conhecido posteriormente como Revolta de
Novocherkassk. Em plena guerra fria, onde Stálin já havia morrido e o
país vivia entre altos e baixos na economia, um grupo de trabalhadores
decide se revoltar contra o aumento abusivo dos preços nos mercados e a
baixa do salário recebido numa fábrica de locomotivas. A revolta sai do
controle quando trabalhadores de outras fábricas se unem ao ato, e o
governo russo resolve conter as manifestações com muita violência.
O
mais interessante na trama é que o ponto de vista mostrado, pelo menos
em grande parte, não é o dos operários, mas sim de Luydmilla (Yuliya
Vysotskaya), uma forte militante do partido comunista que trabalha numa
cúpula do governo municipal. É através dela que acompanhamos o movimento
do governo para conter a greve e a crescente preocupação interna de que
a revolta poderia manchar a imagem de prosperidade do regime, que de
fato foi o que motivou a opressão descabida.
A protagonista é bastante complexa. Ao mesmo tempo que reconhece que as coisas não andam bem no país, ela não recua em defender o regime a todo custo, batendo de frente inclusive com a própria filha, que é uma ferrenha opositora. Nas manifestações, ela também se mostra a favor da força policial, até entender que as coisas não iriam terminar da forma como ela esperava e começar a refletir sobre tudo aquilo que defendeu por anos. Não é um filme que critica uma ideologia específica, mas sim, todos os governos que agem com truculência e tentam maquiar seus erros e seus defeitos. É também um filme sobre repensar ideais de uma vida toda quando eles não fazem mais sentido.
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