quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Crítica: A Mulher-Rei (2022)


Um grande filme épico se faz com uma boa pesquisa histórica, uma qualidade técnica irretocável e um ótimo elenco. E temos tudo isso em A Mulher Rei (The Woman King), filme que resgata a memória de um grupo de mulheres guerreiras do século XIX que lutaram, dentre outras coisas, contra a colonização européia no continente africano.


Conhecidas como "Agojie", essas guerreiras viviam no Reino de Daomé, onde hoje fica localizado o Benin, na África Ocidental, e faziam parte da guarda real do Rei Ghezo. Muitas delas chegavam ao exército depois de serem rejeitadas pelas suas próprias famílias, seja por desobediência, ou simplesmente por não aceitarem casamentos arranjados, e este foi o caso de Nawi (Thuso Mbedu), que rejeitou todos os seus pretendentes e acabou sendo levada à força pelo próprio pai para se tornar uma recruta da general Nanisca (Viola Davis).

Chegando ao palácio, ela logo é inserida nos treinamentos para virar uma Agojie, e passamos a acompanhar um pouco de como funcionava esta preparação, composta de treinos realmente pesados, fisica e mentalmente, onde as meninas aprendiam, acima de tudo, a abdicar de qualquer tipo de sentimento, inclusive a dor. O trabalho de imersão feito pela diretora Gina Prince-Bythewood é elogiável, apresentando não somente cenários majestosos e muito bem feitos, como também enfatizando a imponência dessas mulheres, com suas habilidades e suas feições corporais. Temos também um grande trabalho de direção de elenco, e aqui destaco outros dois nomes que chamam bastante a atenção: Lashana Lynch, que interpreta Izoguie, e Sheila Atim, que interpreta Amenza, duas coadjuvantes que quando aparecem roubam a cena. O único ponto que não encaixou na história foi a inclusão de um romance entre uma das Agojie e um ex-traficante de escravos. Achei forçado e inverossímil essa história do "escravagista que se arrepende", por mais que o enredo tente fazer uma relação do passado dele com o reino de Daomé para tentar justificar que ele não é como seu amigo brasileiro, que está na região para comercializar os escravos.

O roteiro usa a existência destas mulheres para mostrar o horror que era o tráfico de escravos, porém, uma das questões mais contraditórias trazidas por críticos, é o fato do grupo, na vida real, ter contribuído bastante para o esquema escravagista vigente, que vendia os inimigos derrotados por elas como mercadorias. Aliás, o período do reinado de Ghezo foi considerado um sucesso justamente por ter sua economia baseada nas vendas de escravos, o que torna o contexto histórico apresentado um pouco fatídico e prova que existe sim uma certa romantização exacerbada do grupo. Mas, convenhamos, nenhum filme histórico retrata perfeitamente o que aconteceu, então não acredito que isso seja um ponto que estrague a experiência, e trago estes fatos apenas como uma curiosidade.



A Mulher Rei é formulaico e segue um padrão do "bem contra o mal" já visto em centenas de filmes, mas não deixa de ser um dos grandes trabalhos do ano, em tamanho, ousadia, importância e sobretudo em representatividade, trazendo uma história que merece ser conhecida por todos.


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