domingo, 17 de outubro de 2021

Crítica: Você Morrerá aos Vinte (2021)


Em meio às inúmeras guerras civis que eclodiram no Sudão ao longo das últimas décadas, é difícil pensar que havia espaço para a cultura, muito menos o cinema. Há mais de 30 anos não era produzida nenhuma obra no país do nordeste africano, e por isso Você Morrerá aos Vinte (You Will Die at Twenty) tem uma relevância histórica que vai muito além de uma simples obra cinematográfica.


Durante um ritual religioso na aldeia rural onde vive, Sakina (Islam Mubarak) recebe do líder espiritual o sinal de que seu filho recém nascido Muzamil irá morrer quando completar 20 anos de idade. Seu marido e pai da criança, sem saber lidar com a notícia, abandona os dois à própria sorte, e Sakina passa a criar o menino sozinha, com uma superproteção que o impedia até mesmo de sair de casa. 

Ouvindo conselhos de vizinhos e a vontade do próprio filho, ela acaba liberando-o aos poucos para sair à rua, principalmente para ir a escola aprender a ler o alcorão. Mesmo sofrendo nas mãos das outras crianças, que sabem do seu destino e por isso não o aceitam bem, o menino vai crescendo e vivenciando as experiências da vida da melhor maneira possível, sempre com o peso de lembrar que não tem muito tempo pela frente. Sua relação com o tio Sulaiman (Mahmoud Alsarraj) é fundamental para o garoto começar a enxergar além daquilo que sempre conheceu. Sulaiman já viajou o mundo, conheceu outras culturas, e trouxe inclusive um pouco do cinema ocidental para apresentar a Muzamil, que jamais havia tido contato com qualquer coisa externa.


Em um dos diálogos, um dos homens diz para Muzamil cuidar quando se aproxima do rio Nilo, já que todos os meninos da vila morrem no rio. Em outra cena, é dito que o Nilo é o caminho mais fácil para chegar ao Egito e posteriormente à Europa, e eu pesquei uma metáfora nisso, como se para eles deixar a aldeia e ir ganhar a vida em outro país fosse uma espécie de morte. E quem sabe não é essa a "morte" que está destinada a Muzamil quando ele chegar aos 20? Bom, no filme não temos a resposta, mas é algo que fica bastante subjetivo e eu achei muito bem colocado. Primeiro filme da história do Sudão indicado ao Oscar, ele já nasceu gigante por tudo que representa.


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