Há
muito tempo não vivíamos uma era de negacionismo tão grande como a que
estamos vivendo. A pandemia de coronavírus deixou isso ainda mais
evidente, com muita gente desacreditando os fatos científicos e sendo
contrários à vacinação. Podemos também traçar um paralelo em relação às
questões do meio ambiente, onde muitos não levam a sério os efeitos do
aquecimento global e acham que é tudo uma grande bobagem. Pois pegue
esses pensamentos negacionistas e imagine a seguinte situação: um cometa
está vindo na direção da Terra e seu choque deve levar à extinção de
todos os seres vivos. Como será que a população de hoje reagiria a essa
notícia?
Esqueça os filmes que você já assistiu sobre a chegada
de um objeto devastador à Terra e se prepare para embarcar em algo
totalmente original. Não Olhe Para Cima, novo filme de Adam McKay, pega o
tema e o transporta para a nossa realidade, de uma sociedade que parece cada
dia mais superficial e indiferente. Na trama, a estudante de astronomia
Kate Dibiaski (Jennifer Lawrence) enxerga no telescópio um objeto que
parece ser um cometa e mostra ao seu professor, o Dr. Randall Mindy (Leonardo DiCaprio),
que faz os cálculos de rota e logo conclui que o objeto está vindo em
direção à Terra, com 99,78% de chances de impacto.
Com cerca de 5
a 10 quilômetros de diâmetro, o cometa deve levar 6 meses para alcançar
a nossa superfície, e os dois precisam avisar o quanto antes as
autoridades para que medidas sejam tomadas afim de evitar a catástrofe. A
partir de então começa uma verdadeira odisseia de Kate e Randall para
tentar levar a informação ao maior número de pessoas, pois ninguém quer
ouvi-los ou sequer levá-los a sério.
A presidente dos Estados
Unidos, Janie Orlean (Meryl Streep), está mais preocupada de como a
notícia pode afetar as eleições do que com o futuro da humanidade. Os
jornalistas parecem mais preocupados com a separação de uma cantora
famosa do que com aquilo que os astrônomos têm a dizer, já que é preciso
focar no que dá mais audiência. Afinal, quem quer ficar ouvindo que o
mundo está para acabar, não é mesmo?
O roteiro evidentemente faz uma crítica à maneira como o mundo enxerga a ciência hoje em dia. Mesmo com dados que colocam em cheque a vida da população na Terra, os dois astrônomos praticamente não têm espaço na mídia, e quando finalmente são ouvidos, é tudo levado na brincadeira, com muitos memes nas redes sociais. Como se não bastasse, surge um movimento "anti-cometa" que cria a hashtag #NãoOlheParaCima, que vai de encontro ao que defende Randall, de que as pessoas olhem para cima e vejam o óbvio, que é o cometa se aproximando. Porém, hoje em dia nem o óbvio as pessoas parecem conseguir enxergar mais. Há ainda o adendo de uma empresa de tecnologia e seu megalomaníaco CEO, interpretado por Mark Rylance, que visa apenas lucros diante do desastre iminente, e que junto com a presidente torna tudo um grande circo midiático.
O longa nada mais é do que um retrato de como vivemos em uma sociedade doente, que parece não levar nada a sério e onde tudo é medido por engajamentos. O elenco é estelar, mas tem como destaque principalmente Leonardo DiCaprio (que tem uma cena específica que valeria uma indicação ao Oscar) e Jennifer Lawrence. Alguns atores são um tanto quanto caricatos em seus personagens, como é o caso de Meryl Streep e Jonah Hill, mas consigo enxergar isso como proposital para ridicularizar ainda mais o que eles representam. Com um humor ácido, típico dos filmes de McKay, Não Olhe Para Cima fecha o ano com chave de ouro, sendo para mim o melhor filme com selo Netflix nesse ano de 2021.
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