terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Os vencedores do Festival de Berlim 2018


Chegou ao fim neste domingo (25) a 68ª edição do Festival de Cinema de Berlim, e o grande vencedor da noite foi o romeno Touch me Not, da diretora Adina Pintilie, que levou o Urso de Ouro para casa. O drama experimental, que aborda a vida de três pessoas com dificuldades de experimentar a intimidade nos dias de hoje, foi uma grande surpresa, visto que não é um filme fácil de ser digerido por conta de sua forma explícita de abordar a sexualidade humana. Já o prêmio do júri foi para o polonês Mug, que fala sobre o conflito existencial na cabeça de um homem que acabou de passar por um transplante facial.

O norte-americano Wes Anderson (de O Grande Hotel Budapeste e Moonrise Kingdom) se sagrou com o Urso de Prata de melhor direção pela animação Isle of Dogs. Na parte das atuações, a chilena Ana Brun venceu como melhor atriz por Los Herederas e Anthony Bajon como melhor ator por The Prayer. Já o roteiro premiado foi o de Museo, escrito por Manuel Alcalá e Alonso Ruizpalacios.

O Brasil teve bastante destaque nessa edição. Entre a amostra principal e as amostras paralelas, o cinema do país saiu do Festival com seis prêmios, com destaque para a menção honrosa do júri para Ex-Pajé, documentário de Luiz Bolognesi sobre a realidade indígena na atualidade.


Cena de Touch me Not, vencedor do Urso de Ouro.



quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Crítica: Sem Amor (2018)


Vivemos hoje em uma sociedade extremamente carente de amor, afeto e empatia, cuja decadência das relações humanas parece ter chegado ao seu limite. E é nesse cenário que se encaixa perfeitamente a história de Sem Amor (Nelyubov), candidato russo ao Óscar de melhor filme estrangeiro.




A trama acompanha Zhenya e Boris, um casal que viveu anos juntos mas agora está se divorciando. O motivo aparentemente é apenas o desgaste e o "desamor" que surgiu na relação com o passar dos anos, como acontece com todo mundo. Ambos já vivem novos "amores" por aí na esperança de recuperar o que foi perdido no outro, enquanto buscam vender a casa onde viveram.  No meio desta separação está Alyosha, o filho do casal, de 12 anos. Ele é símbolo de uma nova geração criada em meio à falta de carinho, que não recebe atenção nem afeto, e passa o dia praticamente sozinho enquanto os pais estão com seus novos romances. 

Todos os personagens do filme são incrivelmente frios, e é bem chocante ver o desinteresse dos pais com o filho e com o seu crescimento. No entanto, a falta de amor não fica somente entre os pais e a criança, mas também entre os adultos. O mais significante disso é quando o filme mostra Zhenya e Boris alguns anos depois com seus novos pares, fazendo a mesma coisa que faziam entre eles, novamente vivendo "sem amor". Ou seja, não basta mudar de amor, é preciso mudar a forma de agir com as pessoas e o mundo ao redor, senão todo e qualquer relacionamento já nasce fadado ao fracasso.





Outro ponto interessante analisado no filme são os relacionamentos de fachada. Na empresa que Boris trabalha os funcionários precisam ser casados, e por conta disso muitos acabam ficando com suas esposas apenas para garantir o emprego. Há ainda espaço para criticar o uso desenfreado das tecnologias, com pessoas usando seus celulares e notebooks quando deveriam estar curtindo as pessoas e o mundo em volta.

Os atores tem uma entrega total em cena, e conseguem transmitir todos os sentimentos humanos de forma impressionante. Uma das cenas mais chocantes e que guardarei para sempre com um aperto no peito é quando o casal, ainda vivendo junto, está brigando na sala e a câmera muda de ambiente para mostrar o garoto chorando atrás da porta. Ele não tem culpa de estar vivendo nessa realidade, mas é obrigado a presenciar e sofrer com isso, e provavelmente isso moldará sua personalidade para o futuro.




O tom do filme é assim mesmo, pessimista ao extremo, e não economiza em críticas à nossa sociedade das aparências e da apatia. Sem amor cria uma atmosfera onde praticamente nenhum personagem presta, mas nenhum deles pode ser visto como vilão, e sim como pessoas humanas e passíveis de erros, como todos nós.


terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Crítica: A Forma da Água (2018)


Depois do fiasco de público e crítica do espalhafatoso A Colina Escarlate, o mexicano Guillermo Del Toro volta às telas três anos depois com o excelente A Forma da Água (The Shape of Water), o filme mais deslumbrante que você verá neste ano e que talvez seja o mais consistente e bem feito até então da carreira do diretor.




Anos 1960, uma década de muitas mudanças comportamentais em todo o mundo. Época também que Estados Unidos e União Soviética travavam uma guerra de interesses, principalmente na questão científica. E é nesse cenário que o novo enredo de Del Toro se passa, misturando a realidade histórica de uma época conturbada com fantasia, de uma forma jamais vista.

O filme acompanha Elisa (Sally Hawkins), uma mulher que trabalha como faxineira em um importante laboratório do governo americano. Elisa é muda, e vive com um velho amigo (Richard Jenkins) em um apartamento em cima de um cinema. No trabalho, sua melhor amiga é Zelda (Octavia Spencer), uma personagem adorável que traz um alívio cômico à história com seu jeito de falar, agir e falar mal do marido.

Certo dia, uma criatura de aspecto estranho chega no laboratório, trazida da América do Sul pelo agente Strickland (Michael Shannon). Com um aspecto humano, mas pele e nuances de anfíbio, ele logo chama a atenção de Elisa, que passa a criar uma relação de afeto com ele. A partir de então, a mulher começa a arquitetar um plano para tirá-lo do local, onde ele é constantemente maltratado.




Como já era de se esperar, o filme possui um visual de tirar o fôlego do início ao fim. Já é marca registrada de Del Toro essa preocupação com a estética de seus filmes, onde ele cria mundos e criaturas fantásticas com tantos detalhes que parecem reais. Muitos planos são realmente incríveis, e a direção de arte é impecável. Mas diferente de seus últimos filmes, cuja estética era a única coisa que realmente valia a pena, em A Forma da Água todos os aspectos se encaixam para formar um filme prazeroso de assistir.

As atuações também são excelentes, com destaque para Sally Hawkins e Octavia Spencer, mas também para a poderosa participação de Michael Shannon (que diga-se de passagem nasceu para fazer vilões). Mesmo com toda sua intensidade, A Forma da Água ainda tem espaço para cenas calmas e poéticas, e é exatamente esse o seu diferencial. Trata-se de uma fábula de amor moderna e exótica, além de uma lição subjetiva de que o amor nasce de onde menos se espera.


segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Os vencedores do BAFTA 2018



A Academia Britânica de Artes da Televisão e Cinema premiou neste domingo os melhores filmes da temporada no BAFTA Awards 2018, a maior premiação do cinema britânico. O grande vencedor da noite foi Três Anúncios Para um Crime, de Martin McDonagh, que além do prêmio principal ainda se sagrou em mais quatro categorias. A Forma da Água, que tinha o maior número de indicações, saiu da noite com três prêmios. Confira abaixo a lista completa dos vencedores:

MELHOR FILME
A Forma da Água
Dunkirk
Me Chame Pelo Seu Nome
O Destino de uma Nação
Três Anúncios Para um Crime

MELHOR FILME BRITÂNICO
God's Own Country
Lady Macbeth
O Destino de uma Nação
Paddington 2
The Death of Stalin
Três Anúncios Para um Crime

MELHOR DIRETOR
Christopher Nolan, de Dunkirk
Denis Villeneuve, de Blade Runner 2049
Guillermo Del Toro, de A Forma da Água
Luca Guadagnino, de Me Chame pelo seu Nome
Martin McDonagh, de Três Anúncios para um Crime

MELHOR ATRIZ
Annette Bening, por Film Stars Don't Die in Liverpool
Frances McDormand, por Três Anúncios para um Crime
Margot Robbie, por Eu, Tonya
Sally Hawkings, por A Forma da Água
Saoirse Ronan, por Lady Bird  

MELHOR ATOR
Daniel Day-Lewis, por Trama Fantasma
Daniel Kaluuya, por Corra!
Gary Oldman, por O Destino de uma Nação
Jamie Bell, por Film Stars Don't Die in Liverpool
Timothée Chalamet, por Me Chame pelo seu Nome

MELHOR ATRIZ COADJUVANTE
Allison Janney, por Eu, Tonya
Kristin Scott Thomas, por O Destino de uma Nação
Laurie Metcalf, por Lady Bird
Lesley Manville, por Trama Fantasma
Octavia Spencer, por A Forma da Água

MELHOR ATOR COADJUVANTE
Christopher Plummer, por Todo o Dinheiro do Mundo
Hugh Grant, por Paddington 2
Sam Rockwell, por Três Anúncios para um Crime
Willem Defoe, por Projeto Flórida
Woody Harrelson, por Três Anúncios para um Crime

MELHOR ROTEIRO ORIGINAL
A Forma da Água
Corra!
Eu, Tonya
Lady Bird
Três Anúncios para um Crime

MELHOR ROTEIRO ADAPTADO
A Grande Jogada
Film Stars Don't Die in Liverpool
Me Chame pelo seu Nome
Paddington 2
The Death of Stalin

MELHOR TRILHA SONORA
A Forma da Água
Blade Runner 2049
Dunkirk
O Destino de uma Nação
Trama Fantasma

MELHOR FOTOGRAFIA
A Forma da Água
Blade Runner 2049
Dunkirk
O Destino de uma Nação
Três Anúncios para um Crime

MELHOR FILME ESTRANGEIRO
A Criada
Elle
First They Killed My Father
O Apartamento
Sem Amor

MELHOR ANIMAÇÃO
Com Amor, Van Gogh
Minha Vida de Abobrinha
Viva - A Vida é uma Festa

MELHOR DOCUMENTÁRIO
An Inconvenient Sequel
City of Ghosts
Icarus
I Am Not Your Negro
Jane

MELHOR EDIÇÃO
A Forma da Água
Blade Runner 2049
Dunkirk
Em Ritmo de Fuga
Três Anúncios para um Crime

MELHOR DESIGN DE PRODUÇÃO
A Bela e a Fera
A Forma da Água
Blade Runner 2049
Dunkirk
O Destino de uma Nação

MELHOR FIGURINO
A Bela e a Fera
A Forma da Água
Eu, Tonya
O Destino de uma Nação
Trama Fantasma

MELHOR PENTEADO E MAQUIAGEM
Blade Runner 2049
Eu, Tonya
Extraordinário
O Destino de uma Nação
Victoria e Abdul

MELHOR SOM
A Forma da Água
Blade Runner 2049
Dunkirk
Em Ritmo de Fug
Star Wars: Os Últimos Jedi

MELHORES EFEITOS VISUAIS
A Forma da Água
Blade Runner 2049
Dunkirk
Planeta dos Macacos: A Guerra
Star Wars: Os Últimos Jedi

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

Crítica: Projeto Flórida (2018)


Sean S. Baker ficou conhecido em 2015 por Tangerine, filmado inteiramente por uma câmera de Iphone e que se tornou um dos filmes mais badalados daquele ano nos festivais de cinema independente. Neste ano ele volta às telas com Projeto Flórida, mais um trabalho humano que mostra o lado suburbano de grandes cidades americanas e destrói com a ideia do sonho americano.


Ao lado de um dos destinos mais visitados do mundo, a Disney World, fica um conjunto de motéis onde vivem famílias de baixa renda. Ironicamente um deles tem o nome de Magic Kingdom (o mesmo nome do parque vizinho), e é onde vive Moonee (Brooklynn Prince), uma menina de seis anos, extremamente desbocada e sem limites. Ela passa seus dias brincando e aprontando pelos espaços dos motéis com outras crianças, e sempre arruma problemas para sua mãe, Halley (Brie Vinaite).

Halley é uma mulher que luta para se sustentar trabalhando em uma casa de dançarinas, mas o dinheiro mal dá para pagar o aluguel do quarto e ela precisa se virar de outras formas. Ela é o retrato de uma mulher que, mesmo jovem, já passou muitas dificuldades na vida e tenta se erguer num mundo difícil e de poucas oportunidades. O gerente do motel é Bobby (Wiliem Defoe), um homem tranquilo que comanda tudo a pulsos firmes. Toda e qualquer confusão que ocorre ele precisa estar ali para resolver, e sua figura quase paternal faz com que todos o respeitem acima de tudo.


O roteiro é levado com muita simplicidade, e os enquadramentos e movimentos de câmera nos dão a impressão de estarmos acompanhando pessoalmente tudo que acontece nesses prédios, como espectadores reais. Dentre todas as atuações, o destaque maior é a para a menininha Brooklynn Prince, que de uma maneira inacreditável, simplesmente leva o filme nas costas. É gratificante para o mundo do cinema quando um talento como esse surge tão precocemente. 

Simples mas profundo, Projeto Flórida tem suas qualidades, como já descrito, mas ficou um pouco abaixo do que eu esperava do meio pro final devido ao ritmo lento, mesmo que possua um final poderoso e belíssimo. Abordando situações banais, o filme tem um sensibilidade rara no cinema de hoje e só por isso já vale a pena ser notado.