quinta-feira, 31 de março de 2016

Crítica: Desajustados (2016)


Pessoas com coração de ouro e sensibilidade à flor da pele, e por isso mesmo, inadequadas ao mundo marginal em que vivemos. É sobre elas que gira a estória de Desajustados (Fúsi), novo filme do diretor islandês Dagur Kári (Nói, O Albino / O Bom Coração).


Fúsi (Gunnar Jónsson) é um homem solitário que ainda vive com a mãe. Ele se diverte com miniaturas e maquetes, que usa para reencenar as principais batalhas da Segunda Guerra, sua grande paixão. Com uma bondade ingênua, ele é incapaz de ver a maldade nas coisas, e acaba sofrendo com isso, principalmente no trabalho, onde os colegas fazem o que querem com ele.

Certo dia ele recebe o convite para acompanhar aulas de dança, entregues pelo novo namorado de sua mãe, e é incentivado a ir a todo custo mesmo não querendo. No primeiro dia não consegue sair do carro e entrar no salão, mas acaba dando carona para uma das alunas, Sjofn (Ilmur Kristjánsdóttir), que sai do prédio debaixo de uma tempestade. Isso é só o começo de uma estranha relação que se cria entre os dois.


O filme consegue questionar muitas coisas de forma simples. Com personagens exóticos, como o melhor amigo de Fúsi (um homem extremamente pessimista), o filme possui uma atmosfera sombria, muito característica dos filmes feitos na região. Apesar disso, o diretor evita deixar o filme melancólico e, através do humor, passa uma mensagem de esperança para pessoas que, assim como Alma e Fúsi, são sobreviventes desse dia-dia frustrante da vida humana.

sexta-feira, 25 de março de 2016

Crítica: Nossa Irmã Mais Nova (2016)


Quem conhece o cinema do japonês Hirokazu Kore-eda sabe que ele tem uma temática muito própria. Com personagens super humanos, quase sempre envolvidos em um grande drama familiar, Kore-eda gosta de mostrar em suas estórias que a vida é feita de momentos bons e ruins, e que ambos são fundamentais no cotidiano de cada um.


Na trama de Nossa Irmã Mais Nova (Umimachi Diary), Sachi (Haruka Ayase), Yoshino (Masami Nagasawa) e Chika (Kaho) são três irmãs que vivem juntas e acabam de saber da morte do pai, que não vêem há mais de 15 anos. Elas viajam para acompanhar o funeral e lá acabam conhecendo sua irmã mais nova por parte de pai, Suzu (Susu Hirose), que elas nunca haviam visto.

No embarque de volta pra casa as irmãs convidam Suzu para ir morar com elas na cidade grande, e a menina aceita prontamente. Já na cidade ela começa a viver sua nova vida, começando a estudar em um colégio novo e mantendo uma rotina diferente de tudo aquilo que estava acostumada. Suas "novas" irmãs a acolhem com muito carinho e lhe dão tudo que ela precisa, e a relação de amor entre elas é o que de fato conquista o espectador.


Apesar da premissa, o filme não foca apenas na adaptação de Suzu na cidade grande, mas aborda também cada uma das irmãs, mostrando seu dia-dia e suas dificuldades em levar a vida. É interessante acompanhar a personalidade de cada uma sendo mostrada pouco a pouco na tela, e fica impossível não se apaixonar por essa pequena família.

Por fim, Nossa Irmã Mais Nova cativa justamente pela simplicidade. É um filme belíssimo, desde sua fotografia até sua trilha sonora. As atuações também são elogiáveis, e é emocionante a química existente entre as atrizes, que realmente parecem irmãs na vida real tamanha veracidade de sentimentos. Vale a pena.

terça-feira, 15 de março de 2016

Crítica: A Senhora da Van (2016)


O dramaturgo britânico Alan Bennett passou por uma verdadeira situação de ficção em sua vida e acabou transformando a história em peça de teatro. E é dela que deriva A Senhora da Van (The Lady in the Van), novo filme do cineasta Nicholas Hytner, que já havia adaptado outra peça de Bennett para o cinema, As Loucuras do Rei George, em 1994.



A história se passa entre os anos 1970 e 1980, no bairro londrino de Camdem Town, quando Bennett abrigou em sua garagem a maltrapilha Miss Shepperd (Maggie Smith), que vivia em uma van caindo os pedaços e não parava nunca no mesmo lugar. Ela acabou ficando conhecida na vizinhança e graças ao seu jeito excêntrico e pouco amigável ninguém a queria por perto. Foi quando Bennett, ainda desconhecido e buscando um tema para seu próximo livro, começou a escrever sobre essa senhora misteriosa vendo nela um argumento e tanto para uma boa história.

O humor britânico é diferente, não resta dúvidas, mas ele não se encaixou bem nesse filme. Tudo parece ter ficado descuidado, e alguns exageros podem ser nitidamente percebidos. Outro fator que incomoda é o fato de se passar 15 anos e não ter nenhuma transformação física dos personagens, ficando assim impossível imaginar essa passagem do tempo.


A atriz Maggie Smith cumpre bem o papel ao dar vida a essa senhorinha rabugenta, que parece esconder atrás de seu mau humor uma vida de traumas e desilusões. Mas a relação que se cria entre ela e Bennett não é explorada como deveria, e o filme tem raros momentos aproveitáveis. Ao tentar misturar drama com comédia, o diretor parece ter se perdido e não soube abordar nenhum dos dois de forma convincente.

Por fim, A Senhora da Van acaba sendo bem aquém do que potencialmente poderia ter sido, e se torna um exercício de paciência da metade para o fim. Uma pena, pois a história é realmente interessante.

segunda-feira, 7 de março de 2016

Crítica: Amor por Direito (2016)


Em junho de 2015, a Suprema Corte dos Estados Unidos tomou uma decisão histórica ao liberar o casamento entre pessoas do mesmo sexo em todos os 50 estados da federação. Amor por Direito (Freeheld), de Peter Solett, se passa anos antes dessa importante conquista e mostra justamente a dificuldade que os casais homossexuais enfrentavam antes da lei ser finalmente aprovada.


Laurel Hestel (Julianne Moore) é uma competente detetive de polícia de Nova Jersey, que trabalha há mais de duas décadas no mesmo departamento e tem um grande respeito de todos. Apesar de ser bem sucedida, ela precisa manter sua vida privada em segredo, pois sua homossexualidade poderia prejudicar toda sua carreira. Apaixonada por Stacie (Ellen Page), ela precisa mentir para todos, por exemplo, que ela é apenas sua colega de quarto, com medo do tratamento que receberia de contasse a verdade.

O relacionamento das duas toma um choque quando Laurel descobre estar com um câncer em estado avançado. Com dias contados, ela pretende deixar sua pensão para Stacie, com quem mantem uma união estável, mas a lei e as autoridades da cidade não permitem. Isso é apenas o estopim para um grande movimento popular que surge para ajudar o casal a conseguir aquilo que por direito deveria ser seu.


O filme levanta muito a questão dos direitos dos casais homossexuais, num período em que o casamento ainda não era permitido na federação. Se todas as mulheres dos policiais recebem pensão por morte, porque ela não poderia usufruir deste direito? Só porque sua companheira era uma mulher?

Grande atuação, mais uma vez, de Moore. Que grande atriz, e é uma lástima não ter sido lembrada pelo Óscar. Outro destaque é Ellen Page, no papel da carismática Stacei. Além delas, chama a atenção Steve Carell no papel de um pastor gay que é o agitador do movimento de protesto pela causa.


Apesar do dramalhão, por vezes até exagerado, o filme tem um clima leve e até divertido em momentos isolados. Vale mais pela mensagem que passa e por abrir os olhos do mundo para que a decisão seja tomada e outros países.