quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Crítica: Infiltrado (2021)


Não posso me considerar um grande admirador de filmes de ação, porém quando o nome de Guy Ritchie está por trás da produção, simplesmente não tenho como ficar indiferente. Desde os espetaculares Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes (1998) e Snatch - Porcos e Diamantes (2000), eu virei fã do cinema feito pelo diretor, e cada filme seu gera sempre uma expectativa muito alta por aqui.


Em Infiltrado (Wrath of Man), filme que chegou esta semana nos cinemas brasileiros, Ritchie volta a trabalhar pela quarta vez na carreira com Jason Statham, 16 anos após sua última parceria. Na trama, Statham dá vida a um homem misterioso, conhecido como H, que começa a trabalhar para uma grande empresa de carros fortes de Los Angeles.

A construção da personalidade de H é um dos pontos mais bacanas de acompanhar na estória, principalmente depois que um grupo tenta assaltar o carro forte em que estava e ele consegue impedir o crime com habilidades surpreendentes. Assim como seus colegas, nós espectadores também ficamos curiosos para saber de onde ele veio, o que fazia antes, e principalmente como adquiriu tamanha destreza para lidar com criminosos. Com uma trama não linear e cheia de flashbacks, vamos conhecendo um pouco do passado de H e consequentemente entendendo suas motivações para ter entrado num ramo em que nunca havia trabalhado.

 

O filme não exige uma grande atuação, porém Statham cumpre muito bem o seu papel na figura do homem frio e de poucas palavras. O roteiro tem uma atmosfera sombria, o que difere um pouco do que estamos acostumados a ver na filmografia anterior do diretor, mas é bastante envolvente, justamente pelo clima de mistério que cria e suas pequenas reviravoltas. Bebendo da fonte dos clássicos filmes de assalto e misturando isso com uma boa história de vingança, Infiltrado acaba sendo uma boa surpresa do cinema neste ano de 2021, até mesmo para quem não é fã do gênero como eu.


domingo, 22 de agosto de 2021

Crítica: Caros Camaradas! (2021)


Depois do aclamado Paraíso (2016), que foi escolhido na época para representar a Rússia no Óscar de melhor filme em língua estrangeira, o veterano cineasta Andrei Konchalovsky volta aos holofotes com Caros Camaradas! (Dear Comrades!), filme que fala diretamente sobre a luta da classe trabalhadora e a opressão de um governo totalitário.


O enredo se baseia num fato verídico que ocorreu na União Soviética em 1962, e que ficou conhecido posteriormente como Revolta de Novocherkassk. Em plena guerra fria, onde Stálin já havia morrido e o país vivia entre altos e baixos na economia, um grupo de trabalhadores decide se revoltar contra o aumento abusivo dos preços nos mercados e a baixa do salário recebido numa fábrica de locomotivas. A revolta sai do controle quando trabalhadores de outras fábricas se unem ao ato, e o governo russo resolve conter as manifestações com muita violência.

O mais interessante na trama é que o ponto de vista mostrado, pelo menos em grande parte, não é o dos operários, mas sim de Luydmilla (Yuliya Vysotskaya), uma forte militante do partido comunista que trabalha numa cúpula do governo municipal. É através dela que acompanhamos o movimento do governo para conter a greve e a crescente preocupação interna de que a revolta poderia manchar a imagem de prosperidade do regime, que de fato foi o que motivou a opressão descabida.


A protagonista é bastante complexa. Ao mesmo tempo que reconhece que as coisas não andam bem no país, ela não recua em defender o regime a todo custo, batendo de frente inclusive com a própria filha, que é uma ferrenha opositora. Nas manifestações, ela também se mostra a favor da força policial, até entender que as coisas não iriam terminar da forma como ela esperava e começar a refletir sobre tudo aquilo que defendeu por anos. Não é um filme que critica uma ideologia específica, mas sim, todos os governos que agem com truculência e tentam maquiar seus erros e seus defeitos. É também um filme sobre repensar ideais de uma vida toda quando eles não fazem mais sentido.

sexta-feira, 20 de agosto de 2021

Crítica: No Ritmo do Coração (2021)


Com distribuição mundial da Apple TV+, pode-se dizer que No Ritmo do Coração (CODA) já se tornou um pequeno fenômeno. O filme, dirigido por Sian Heder, se tornou o primeiro da história a ganhar em todas as principais categorias de drama numa edição do Festival de Sundance, além de ter batido o recorde de bilheteria do festival na sua estreia.



Adaptado do filme francês "A Família Bélier" (2014), CODA (abreviação para Children of Deaf Adults/ Filhos de adultos surdos) acompanha uma família de surdos que vive da pesca numa pequena cidade litorânea de Massachusetts. Dos 4 membros da família, apenas uma consegue ouvir e falar: a filha caçula Ruby (Emilia Jones). Por conta disso, Ruby acaba sendo o elo entre seus pais (Marli Matlin e Frank Troy Kutsur) e seu irmão mais velho (Daniel Durant) com o mundo exterior, ajudando-os principalmente nos negócios.

Descoberta pelo professor de música da escola, e incentivada pelo mesmo por ter uma voz diferenciada, Ruby começa a fazer audições para conquistar uma bolsa na faculdade de música de Boston. Tímida e acostumada a sofrer com piadinhas dos colegas por conta da condição de seus pais, Ruby precisa enfrentar o medo para realizar esse grande sonho que é viver da arte. Porém, inevitavelmente esse sonho acaba sendo posto a prova com a necessidade da família em tê-la por perto.



Eu confesso que não esperava tanto deste filme no começo, mas me envolvi demais e no final me emocionei com a história. E isso se deve muito à direção competente, que sabe dosar bem a mistura de drama com humor sem deixar o filme se tornar exagerado nem para um lado e nem para o outro. Outro ponto que abrilhanta o filme são as atuações. Os pais de Ruby e o irmão são atores surdos de verdade, e essa inclusão foi importante para deixar o filme ainda mais verdadeiro. Destaco ainda a participação do comediante mexicano Eugênio Derbez na pele do professor de música "excêntrico" de Ruby, para mim um dos melhores e mais complexos personagens.

Apesar de ter alguns clichês, principalmente quando apela para o lado do romance, não tem nada que eu possa criticar negativamente em CODA. É um filme muito leve e divertido, na medida certa pra conquistar o coração de quem assiste (e quem sabe mais prêmios por aí ao longo do ano).


sexta-feira, 13 de agosto de 2021

Crítica: Minamata (2021)


A história do mundo está repleta de desastres ambientais causados pela mão do homem. Entre tantos exemplos, podemos citar as explosões de Chernobyl e Fukushima, e mais recentemente os rompimentos das barragens de Mariana e Brumadinho aqui no Brasil. Pouco se fala hoje, mas uma das tragédias que mais abalou o mundo entre os anos 50 e 70 aconteceu no Japão, na cidade de Minamata. O "Desastre de Minamata", como ficou conhecido, foi causado pelo despejo de material tóxico nas águas do mar que banha a cidade, e afetou a vida de centenas de famílias, causando sequelas que perduram até hoje na população local.


O filme do diretor Andrew Levitas se passa nos anos 1970 e acompanha Eugene Smith (Johhny Depp), um fotógrafo famoso por suas fotos de guerras, que é chamado pelo executivo da revista Life para registrar a estranha doença que está acometendo o povo da região japonesa. Há tempos sem cobrir eventos desse tipo, ele primeiramente fica contrariado em aceitar a oferta, mas acaba enxergando o desafio como algo necessário para dar uma animada na sua vida, que anda pacata e tediosa.

Eugene então viaja ao Japão e começa a tirar as suas fotografias, o que logo chama a atenção dos donos da empresa química Chisso. A empresa era a grande responsável pela contaminação das águas com mercúrio, que foi o componente que causou o envenenamento coletivo, e obviamente tentou subornar o fotógrafo e até mesmo destruir o seu trabalho. Sem deixar se intimidar, Eugene seguiu firme, e acabou tirando uma das fotos mais importantes da história do fotojornalismo, que ajudou a levar o caso para o resto do mundo.


O roteiro é bem perspicaz por contar um fato histórico e, ao mesmo tempo, discutir sobre o impacto das ações humanas no meio ambiente (assistam o pós-credito, é bem interessante). Gostei muito do trabalho de fotografia e da ambientação da época, muito bem detalhada. O grande nome do elenco é Johnny Depp, que não é tão exigido e tem uma atuação contida, mesmo que boa. Minamata, por fim, é um filme que vale a pena pelo assunto, pela relevância histórica e para se refletir sobre o mundo que queremos deixar para as futuras gerações.


terça-feira, 10 de agosto de 2021

Crítica: Tenho Medo Toureiro (2021)


Adaptado de um livro do chileno Pedro Lemebel, Tenho Medo Toureiro (Tengo Miedo Torero), do diretor Rodrigo Sepúlveda, é um filme muito sensível sobre preconceito, resistência, aceitação e, sobretudo, o amor, seja ele na forma que for.



La Loca del Frente (Alfredo Castro) é uma travesti quase beirando os 60, que vive sozinha e se apaixona por um homem que a salva de ser espancada durante uma batida militar numa boate. Vale lembrar que o enredo se passa durante a ditadura no Chile, que foi uma das mais sangrentas da América Latina, e que era extremamente intolerante contra o público LGBT.

O homem que a salva é Carlos (Leonardo Ortizgris), um jovem que faz parte de um grupo revolucionário que está planejando assassinar Pinochet. Movida pela paixão repentina e também como uma forma de recompensa-lo, "La Loca" aceita guardar em sua casa algumas caixas de Carlos que supostamente teria livros subversivos dentro.



Com um leve toque de humor mas sempre preocupado em mostrar a dura realidade daquela época, o roteiro também acerta em tocar num ponto muito perspicaz: de que não foi somente em ditaduras que os Lgbt's sofreram abusos e repressão, e que por isso mesmo, eles não estavam na linha de frente contra o regime. Isso fica evidente quando a protagonista fala que só vai lutar de fato numa revolução que for inclusiva e para todos.

Além dos diálogos excepcionais, um dos pontos alto do filme, ao meu ver, é a atuação de Alfredo Castro, que nos faz criar uma empatia imensa por essa personagem tão complexa e que é cheia de vida, mesmo tendo passado por poucas e boas. O filme chegou ao Brasil diretamente no catálogo da Amazon Prime Vídeo, e eu recomendo fortemente a todos.