quarta-feira, 22 de março de 2023

Crítica: Um Filho (2022)


O diretor Florian Zeller nos presenteou em 2021 com Meu Pai (The Father), para mim o melhor filme daquele ano e que consagrou Anthony Hopkins com mais um Oscar de melhor ator. Diante disso, era natural que se criasse uma expectativa muito grande acerca do seu novo filme, O Filho (The Son), que assim como o anterior também foi baseado em uma peça de teatro. No entanto, o resultado final é extremamente decepcionante, e temos aqui um dos filmes mais vazios do ano.


Se em O Pai, Zeller tratou com maestria a demência do personagem principal, utilizando até mesmo o cenário para criar o clima de confusão dentro da sua mente, aqui ele não consegue o mesmo ao falar da depressão profunda, em específico na adolescência. O roteiro segue a mesma linha familiar do filme antecessor e também se passa praticamente todo dentro de quatro paredes, acompanhando Nicholas (Zen McGrath), um jovem extremamente depressivo que vive com a mãe, Kate (Laura Dern). No entanto, ele não se sente mais bem dentro de casa e pede para ir morar com o pai, Peter (Hugh Jackman), que casou novamente com Beth (Vanessa Kirby) e tem um outro filho recém nascido.

É nítido que os pais não percebem todos os sintomas e também não sabem lidar com as crises de depressão do filho, que inclusive abandonou a escola sem eles saberem. Ao interná-lo em um clínica psiquiátrica, eles logo ficam com pena do garoto e decidem não levar adiante o tratamento. Provavelmente quem já passou por uma situação delicada como essa irá se reconhecer e até mesmo sentir o conflito interno desses pais. Não é nada fácil ver alguém que amamos sofrendo com uma doença, ainda mais quando é uma doença silenciosa como a depressão, e nesse ponto acho que o filme acerta ao levantar a questão de como devemos estar sempre atentos aos sinais.


Ao longo do filme, vamos conhecendo um pouco mais do passado desses personagens, e percebemos, por exemplo, que Peter possui um sentimento muito forte de culpa pelo divórcio com Kate, que ele inclusive acha ter sido um dos pontos culminantes para a depressão do filho. Aliás, Hugh Jackman talvez seja o principal (e único) destaque positivo do filme, o que não dá para dizer do garoto Zen McGrath, que nitidamente não estava à altura de tamanha responsabilidade. Ele tem uma atuação forçada em todos os momentos, e chega a ser incômodo assisti-lo em cena por conta disso. Laura Dern e Vanessa Kirby também estão no piloto automático, e a participação de Anthony Hopkins é mais rápida que um relâmpago e, neste caso, completamente desnecessária. Os diálogos também sempre tentam trazer alguma frase pronta ou uma fala super expositiva, e fica extremamente cansativo de acompanhar e principalmente de aceitar que os personagens estão realmente falando aquelas coisas. Por fim, O Filho acaba falhando em tudo que propõe, e o mais triste disso é que o tema é muito importante e merecia ter sido melhor trabalhado.

domingo, 19 de março de 2023

Crítica: Living (2022)


Viver (1952), dirigido por Akira Kurosawa, é um dos mais belos filmes já feitos em todos os tempos, e a reflexão que ele traz sobre a vida e principalmente sobre a finitude dela é algo que fica para sempre na lembrança de quem o assiste. Mais de setenta anos depois, o filme ganhou uma refilmagem tão sensível quanto nas mãos de Oliver Hermanus, mas que infelizmente carece de alma e não consegue alcançar o mesmo nível do clássico, tanto na parte técnica quanto na parte sentimental.


Living conta praticamente a mesma história do longa de 1952, mas desta vez ambientada na cidade de Londres. Na trama, acompanhamos o Sr. Williams (Bill Nighy), um homem que trabalha há décadas no setor de obras da prefeitura e tem uma rotina bastante burocrática em meio a pilhas e mais pilhas de papéis. Quando descobre que lhe restam poucos meses de vida, ele "chuta o balde" e passa a fazer coisas que não fazia antes, ou literalmente, passa a viver. E nesse ínterim, também resolve desengavetar o projeto de um parquinho de diversões para crianças em um canto esquecido da cidade, como forma de encontrar um propósito para esses seus últimos dias e ajudar os moradores com algo útil.

O texto é bem fiel ao original, e até mesmo a icônica cena final no balanço é repetida aqui. A atuação de Bill Nighy é muito sensível e é o que de fato segura o filme até o final, mas os personagens secundários infelizmente não funcionam e são mal desenvolvidos. Um exemplo disso é Sutherland (Tom Burke), que no início do filme está no seu primeiro dia de trabalho na repartição do Sr. Williams e parece que vai ter um papel importante na história, mas acaba sendo totalmente descartável. Outro ponto é que no filme de Kurosawa eu consegui comprar perfeitamente a melancolia do protagonista e os motivos dele ser tão triste e quieto, mas desta vez eu não consegui me conectar de forma alguma com este mesmo personagem. No fim, a mensagem tão importante de que devemos viver a vida antes que tudo isso acabe é esvaziada, e se torna apenas um filme morno e de pouquíssimos momentos bons.

terça-feira, 14 de março de 2023

Crítica: Desaparecida (2022)


Das mesmas mentes criativas responsáveis por Buscando…(Searching…), surge Desaparecida (Missing), um filme ainda mais frenético que segue o mesmo formato "screen life" de contar a história através das telas do notebook, do celular e de outros gadgets utilizados pela protagonista, e que consegue mais uma vez criar um clima de suspense e tensão muito envolvente.



O filme acompanha June (Storm Reid), que vive há anos apenas com a sua mãe, Grace (Nia Longe), depois que seu pai morreu precocemente quando ela ainda era criança. June é uma típica adolescente da geração atual: teimosa, não dá atenção para a mãe, só quer saber de festa com as amigas e passa o dia entre uma rede social e outra. Quando a mãe viaja para a Colômbia com o novo namorado, Kevin (Ken Leung), June fica responsável por recebê-los de volta no aeroporto, mas quando chega o dia eles simplesmente não retornam e somem do mapa. Esse é apenas o ponto de partida de uma trama cheia de reviravoltas que vão, pouco a pouco, trazendo à tona o que verdadeiramente aconteceu com os dois.

Para tentar descobrir o paradeiro da mãe, a menina recorre a todos os tipos de alternativas existentes na internet. Se em Buscando…, o personagem já utilizava muitas dessas tecnologias ao seu favor, aqui existem ainda mais possibilidades, afinal de contas, o avanço tecnológico não pára nunca e em cinco anos muita coisa já mudou. Desde simples buscas no Google, ou até mesmo assistir câmeras de segurança com transmissão ao vivo de locais turísticos, tudo que está ao alcance de June através da web acaba sendo explorado, chegando até mesmo ao ponto dela utilizar um site de contratação de serviços online para contar com a ajuda de um morador local, Javier (Joaquim de Almeida).

É curioso acompanhar também o papel das redes sociais em todo esse processo. Ao mesmo tempo em que está sofrendo com o sumiço da mãe, June ainda tem que lidar com as diversas teorias criadas no twitter por gente que não faz ideia do que está acontecendo mas precisa dar o seu pitaco, com os vídeos no Tik Tok falando inverdades sobre sua mãe para ganhar views e likes em cima da tragedia alheia, e até mesmo com a mídia sensacionalista.

Com muitos "plot twists", o roteiro consegue prender a atenção até o final e não perde o ritmo em momento algum. É evidente que a nossa relação com a internet acaba sendo o mote central da trama, já que hoje, de fato, qualquer coisa que precisamos saber nós corremos imediatamente para o Google ou para o YouTube, e a cada dia a gama de opções e recursos cresce mais para facilitar nossas vidas. Mas outro ponto abordado pelo filme (e talvez o principal) é a relação entre pais e filhos, cada vez mais distante, e muito disso justamente pelo próprio avanço da tecnologia. Irônico, não é mesmo? E apesar do roteiro acabar apelando para o velho clichê do "aproveite seus pais enquanto ainda estão vivos", temos uma boa discussão a respeito disso. 


O grande destaque no elenco é Storm Reid, que consegue entregar uma boa atuação mesmo em um formato tão incomum de cenários e ângulos. Por mais que tenham alguns exageros e algumas facilitações, Desaparecida consegue manter o mesmo nível do antecessor, mesmo com diretores diferentes envolvidos, e surpreende pela originalidade.

sexta-feira, 10 de março de 2023

Crítica: O Pior Vizinho do Mundo (2022)


Em 2017, um filme sueco chegou entre os cinco finalistas ao Oscar de Melhor Filme Internacional e me conquistou logo de cara quando o assisti. Um Homem Chamado Ove, de Hannes Holm, é um dos melhores filmes lançados naquele ano, e conta com muita sensibilidade a história de um homem na terceira idade que não vê mais graça e sentido na vida e decide se matar. No começo deste ano, quando vi que seria lançado um remake americano desta história, eu definitivamente torci o nariz, mas resolvi assistir exclusivamente por conta do nome envolvido no projeto: Tom Hanks, de quem sou fã. No entanto, teria sido melhor ficar com a memória do original na cabeça, porque o que foi feito aqui foi um grande desserviço.


Em O Pior Vizinho do Mundo, Hanks dá vida a Otto, um senhor rabugento e mal humorado que vive em uma pequena cidade dos Estados Unidos. Entre patrulhas para cuidar da velocidade dos carros ou até mesmo para verificar se o lixo foi colocado no lugar certo, ele vai cada vez se irritando mais com esses pequenos "erros" dos vizinhos. Essa amargura, segundo um próprio amigo seu, veio desde que sua esposa faleceu há alguns anos. Ele nunca mais conseguiu ser o mesmo, e seguiu a vida de uma maneira bem melancólica, fazendo o trajeto de casa para o trabalho e do trabalho para casa todos os dias e nada mais. Quando finalmente se aposenta, ele passa a não enxergar mais sentido algum em continuar vivo, e planeja várias formas de se matar. Porém, a chegada de uma nova família, comandada pela mexicana Marisol (Mariana Trevino), na casa ao lado, o faz repensar sobre essa decisão.

Bom, para início de conversa, o filme não tem nem um pouco da sensibilidade que o original possuía. O drama é extremamente exagerado, e sentimos isso até mesmo na trilha sonora, que o tempo todo tenta criar um clima para choro no espectador. O tema do suicídio, que é o que faz o filme de 2016 ser tão emblemático, acaba sendo abordado de uma maneira superficial, até pelo desenvolvimento fraco do protagonista. Nada aqui soa convincente, tanto sua rabugice no início como a sua suposta "transformação" do meio para o final, e os personagens secundários também são insuportáveis.

 

A história de Otto é contada através de flashbacks, e são através desses recortes da memória que ficamos sabendo como ele conheceu Sonya (Rachel Keller), como eles foram se apaixonando e principalmente como ela veio a falecer, mas absolutamente nada me fez comprar essa história de amor. Na medida em que Otto vai se aproximando da nova família de vizinhos, mais o seu coração vai se abrindo para novas experiências, mas é justamente aí que o filme desanda de vez e se transforma em um grande dramalhão "água com açúcar" típico de Sessão da Tarde. O enredo toma poucas liberdades em relação ao filme sueco, seguindo quase que à risca o roteiro, mas não consegue trazer a mesma qualidade. É o tipo de história que combina perfeitamente com a frieza das comédias dramáticas feitas no norte da Europa, mas que nitidamente não encaixa com o estilo de comédia utilizado aqui. Acaba sendo, por fim, um filme sem criatividade e totalmente sem alma


quarta-feira, 8 de março de 2023

Crítica: Cinema Sabaya (2022)


Escolhido para representar Israel no Oscar de filme internacional deste ano, Cinema Sabaya é um filme extremamente despretensioso, mas que ganha muita força graças às grandes personagens femininas que possui, e que retratam um pouco do que é a sociedade israelense da atualidade.

Rona (Dana Ivgy) é uma documentarista que resolve fazer uma oficina de cinema com mulheres que trabalham na administração municipal da cidade de Hadera. Oito mulheres, de diferentes localidades e religiões (judias e árabes) acabam fazendo parte do projeto, onde começam a aprender técnicas básicas de filmagens, como enquadramento, zoom e edição. A partir de um exercício onde elas recebem a tarefa de gravar um trecho de sua vida para mostrar o que fazem no dia a dia, vamos conhecendo um pouco mais de cada uma delas, e consequentemente vão surgindo boas discussões sobre questões muito femininas, como carreira, casamento, filhos, e liberdade de uma maneira geral, como a liberdade sexual, a liberdade de vestir o que quiser e a liberdade de ir e vir.

Ao filmar pedaços de suas vidas com uma câmera, cada personagem vai também se autodescobrindo. Uma grava o marido cortando as unhas no sofá porque aquilo lhe traz uma espécie de paz, outra grava uma briga entre os filhos, já outra mostra como é sua vida morando em um barco apertado. São através destes fragmentos feitos por elas mesmas, que vai se construindo a personalidade de cada uma, numa construção de personagens muito sensível e profunda. Tem também a personagem que não grava nada porque enxerga sua vida como algo completamente desinteressante, mas aos poucos passa a rever esse conceito graças a ajuda das colegas de curso. No grupo, há opiniões diversas sobre cada um dos assuntos debatidos, desde as mais conservadoras até as mais liberais, até por se tratarem de mulheres de idades, religiões e vivências diferentes. E é através dessa teia de relacionamentos que vai sendo discutida não somente o papel da mulher na sociedade israelense, como também o empoderamento feminino de uma maneira global.


O filme tem um aspecto de documentário, e a naturalidade com que as atrizes atuam realmente faz parecer que são mulheres reais falando sobre suas vidas em frente a uma câmera. Alguns momentos são bem tocantes, sobretudo quando fala dos sentimentos de família e envolve o amor delas com os filhos. Não foi proposital escrever essa crítica justamente no dia 08 de março, mas veio a calhar.

 

terça-feira, 7 de março de 2023

Crítica: A Farsa (2022)


O diretor Nicolas Bedos vem sendo uma grata surpresa no cinema francês nestes últimos anos. Gosto de Monsieur & Madame Adelman e considero Belle Époque um dos filmes mais originais e inteligentes da década, e por isso fiquei com grandes expectativas para o seu novo longa, A Farsa (Mascarade). Com um gênero inclassificável, o roteiro nos transporta para a belíssima Riviera Francesa e nos brinda com uma história de amor, desejo e vingança cheia de reviravoltas.


O filme acompanha Adrien (Pierre Niney), um ex-dançarino que agora ganha a vida como gigolô de mulheres mais velhas e ricas. Uma delas é Martha (Isabelle Adjani), uma atriz veterana de sucesso, com quem ele cria uma espécie de pacto de fidelidade e passa a viver em sua mansão de frente pro mar ganhando tudo o que deseja. Certo dia ele conhece uma bela jovem chamada Margot (Marine Vacht), e logo surge uma pulsante paixão entre eles, que passam a se relacionar de forma clandestina para que ele não perca seus luxos na casa de Martha. Os dois, no entanto, planejam um grande golpe para cima de outro personagem, o corretor de imóveis Simon (François Cluzet). Inclusive, na primeira cena do filme vemos que este mesmo Simon está em um tribunal sendo julgado por algo que ocorreu, e o filme vai pouco a pouco montando o quebra-cabeças.

As belas paisagens do sul da França contrastam fortemente com a índole dos personagens, pois não existe nenhum santo nessa história, o que deixa a sensação de que também não há vilões e mocinhos, e isso eu achei bem interessante. O ritmo demora um pouco a engrenar, e o começo do filme acaba sendo um pouco confuso, mas na medida em que as coisas vão se encaixando o roteiro também ganha força e acaba prendendo até o final. 


Gostei muito do elenco, com atuações boas e consistentes, e na parte técnica Bedos prova mais uma vez que sabe criar cenários grandiosos sem soar exagerado, como já havia feito em Belle Époque. Por fim, A Farsa é um filme que passou despercebido quando esteve nos cinemas daqui no final de 2022, mas agora com a chegada no catálogo da Amazon Prime fica aqui a minha recomendação.

domingo, 5 de março de 2023

Crítica: Entre Mulheres (2022)


Em 2009, um grupo de homens foi preso em uma colônia isolada na Bolívia sob a acusação de terem abusado sexualmente das mulheres que viviam no local. O lugar era conhecido por ser uma colônia menonita, onde todos viviam sob um forte fundamentalismo religioso e rejeitavam a modernidade, sobrevivendo de forma extremamente simples, sem luz elétrica, sem tecnologias e sem contato com o mundo exterior. Baseado nessa história, a romancista canadense Miriam Toews escreveu "Women Talking", lançado em 2018, que acabou servindo como texto base para este filme homônimo roteirizado e dirigido por Sarah Polley.



A trama inicia com uma menina acordando após ter sido dopada e violentada durante a noite, algo corriqueiro e que aparentemente tem acontecido com todas as outras mulheres da comunidade. Muitas delas até acreditavam se tratar de fantasmas que invadiam as residências à noite para estuprá-las, e outras simplesmente ficavam em silêncio por vergonha ou medo. Tudo isso até que finalmente um dos homens acaba sendo flagrado no ato, e as mulheres resolvem iniciar uma votação para decidir o que fazer a partir de então. Estão em disputa duas formas de reagir ao ocorrido: ficar e lutar contra estes abusos, ou apenas partir e reiniciar a vida em outro lugar. Há ainda as que defendem que se deve perdoar os agressores para que elas possam ficar em paz com Deus.

A partir deste embate, passamos a acompanhar as boas discussões que surgem entre essas mulheres, e é aí também que entra a metáfora da diretora em relação aos abusos que as mulheres sofrem diariamente mundo à fora, e que muitas vezes se vêem obrigadas a se calar diante disso. Aqui elas ganham voz, e muita. São quase duas horas de diálogos potentes entre personagens que possuem personalidades diferentes, de acordo com suas próprias vivências. O único personagem homem da história é August (Ben Wishaw), que é professor na colônia e acaba servindo como um escrivão para elas. Vale lembrar que a tradição patriarcal dessa colônia não permitia que mulheres tivessem acesso a nenhum tipo de educação e sequer se alfabetizassem, vivendo exclusivamente para a fé.

 

O filme tem uma fotografia bem pálida, o que ajuda a criar um ambiente de sufocamento, unido ao fato de se passar quase inteiramente dentro de um celeiro. O ponto alto são as atuações, principalmente de Jessie Buckley e Claire Foy, na pele das duas personagens mais revoltadas com toda a situação. Rooney Mara também está bem como uma personagem que vai mudando sua percepção de acordo com o transcorrer das discussões, até por ser a única delas que no momento está esperando um filho, fruto de um estupro. Só achei um desperdício a atriz Francis McDormand estar no elenco mas participar de apenas uma cena, com uma única fala. Queria ter visto mais dela em tela. Apesar de entender a importância das discussões que o filme propõe, não consegui me conectar como gostaria com a história, até por conta do ritmo cadenciado, que me deixou entediado em muitos momentos. Ainda assim, não retiro o peso da obra e nem ignoro o fato dela ter belas sequências. Quando as mulheres falarem, pare para ouvir o que elas tem a dizer. O recado está dado!

quinta-feira, 2 de março de 2023

Crítica: Império da Luz (2022)


Três anos após o sucesso de 1917, Sam Mendes volta aos cinemas com Império da Luz (Empire of Light), um filme que tinha a faca e o queijo na mão para se tornar um dos melhores filmes da carreira do diretor, mas preferiu pegar tudo e jogar em um triturador.

O início do filme é promissor e empolgante, afinal de contas, estamos acompanhando o dia a dia de um cinema, e quem é realmente apaixonado pela sétima arte acaba sendo fisgado logo de cara. Hilary (Olívia Colman) é a gerente, e controla desde a limpeza das salas no final de cada exibição até a quantidade de pipocas que são vendidas no guichê de entrada. Quando Stephen (Micheal Ward) é contratado para trabalhar no local, nasce uma grande amizade entre os dois, que aos poucos vai também se transformando em um romance incomum.

De início gostei da forma que o diretor aborda  a luta da protagonista contra a bipolaridade, que faz ela se afastar do trabalho sempre que se vê em meio a uma crise depressiva. Isso não interfere na sua capacidade e muito menos na sua estreita relação com os outros empregados e o dono do lugar, Donald (Colin Firth), mas é evidente que atrapalha sua rotina e principalmente suas relações pessoais. Porém, ao tentar abordar vários temas ao mesmo tempo, o diretor acaba não se aprofundando em nenhum deles. Além da saúde mental, ele também tenta falar sobre racismo, sobre amizade, sobre desejo sexual e também sobre o amor ao cinema, mas tudo acaba sendo mostrado de uma forma muito superficial, deixando um imenso vazio no roteiro.

Fica realmente difícil entender qual era a intenção de Sam Mendes. A bipolaridade da protagonista, por exemplo, é "resolvida" de uma maneira extremamente vaga. O movimento de skinheads que estão colocando terror na cidade para afastar os moradores negros acaba gerando uma cena pesada, mas é tão raso que aquilo que era para chocar e trazer boas discussões sobre o assunto acaba sendo apenas uma cena a mais no roteiro. As relações também carecem de química, e não há nenhum esforço para que possamos conhecer a fundo cada um dos personagens. É realmente uma lástima que o diretor tenha desperdiçado todo o potencial que este filme tinha, já que a parte da homenagem ao cinema é de fato muito bonita. Mas isso acaba sendo o único ponto positivo nessa salada mista de temas, além da atuação sensível e intensa de Olívia Colman.