sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Crítica: O Lobo de Wall Street (2014)


Diferente de outros diretores que se "venderam" com o tempo e passaram a fazer filmes politicamente corretos em busca do grande público, Martin Scorsese parece nadar contra a maré, e mesmo septuagenário, continua com o mesmo estilo sacana que tinha nos saudosos anos 80 e 90. Em O Lobo de Wall Street (The Wolf of Wall Street), ele traz um filme tão polêmico e amoral quanto seus maiores clássicos Os Bons Companheiros, Táxi Driver e Cassino.



Não é de hoje que me considero fã do diretor, assim como sou do ator Leonardo DiCaprio. Por isso, quando os dois se juntam em um mesmo trabalho, é impossível não criar uma expectativa enorme em cima disso. E o melhor? Eles sempre se superam.

A trama do filme conta a história de Jordan Belfort, um ex-corretor da bolsa de valores que ganhou milhões de dólares nos anos 90, explorando brechas no sistema e enganando milhares de pessoas. Assim como no livro homônimo, de onde a história á adaptada, Belfort é um personagem onisciente, que vai nos narrando sua história, desde o começo na carreira.



Aos 22 anos, ele conseguiu emprego numa grande firma de investimentos, onde era comandado por Mark Hanna (Matthew McConaughey). Através de Hanna, Belfort começou a conhecer os caminhos mais fáceis de como se dar bem no mercado financeiro. No entanto, logo no seu primeiro dia como corretor acontece o famoso Black Monday, onde por conta da queda brusca de ações, diversas firmas do mesmo tipo foram à falência, inclusive a que ele trabalhava.

Desempregado, mas sem jamais perder a ambição, ele conseguiu emprego numa firma pequena, de fundo de quintal, onde acabou se destacando graças a sua habilidade incomum de enganar os clientes. Com a ajuda de Donnie (Jonah Hill), a empresa cresceu desmedidamente, e ganhou um nome: Stratton Oakmont. Comandando a empresa, Belfort foi se tornando cada dia mais milionário. Seu truque porém era bastante simples: vender ações de baixos valores que estão fora dos pregões e, consequentemente, conseguir um retorno bem maior pros corretores em forma de comissão.



Sem fazer nenhum tipo de julgamento moral, o diretor enche nossos olhos com cenas absurdas e cheias de excessos, mostrando todo o tipo de depravação que o dinheiro é capaz de fazer. Festas regadas a muita droga, álcool, prostitutas, luxo, e orgias despudoradas. Tudo isso faz parte do circo de horrores que vemos aos longo das suas 3 horas de duração, em um verdadeiro espetáculo do uso incontrolável de dinheiro.

A ambição de Belfort também é incontrolável, e mesmo aparentemente tendo tudo, ele ainda quer mais. Isso acaba trazendo alguns problemas, principalmente com o FBI. É quando ele precisa correr para dar um "jeitinho" de se livrar das grades, se envolvendo com um esquema de lavagem de dinheiro e conta em bancos suíços.


Todos os personagens são desprezíveis, e não podem ser considerados um exemplo a ser seguido. Scorsese recebeu diversas críticas, principalmente por parte dos críticos mais conservadores, que o acusaram de idolatrar a figura do mau caráter. Mas basta ser esperto o bastante para não cair nessa. O filme com certeza não vai agradar muita gente, pois o que vemos em cena é realmente um estilo de vida que muitos nem imaginariam existir.

Outro ponto interessante é a forma com que a história é contada. Até então, diversos filmes já haviam sido lançados sobre o fraudulento mundo dos investimentos financeiros, mas verdade seja dita, quase todos são bastante chatos e entediantes. Muitos falam da bolsa de valores de forma técnica, o que deixa qualquer leigo boiando na estória em apenas 10 minutos. Aqui, no entanto, Scorsese consegue fazer um filme leve, divertido, e sem entrar muito nos detalhes de como tudo acontece.


Leonardo DiCaprio está, mais uma vez, impecável. Entre tantas atuações fora do comum da sua carreira, essa parece ser uma das melhores. É difícil dizer isso depois de ver o filme, mas talvez nenhum ator fizesse o mesmo personagem de forma tão perfeita. Se mais uma vez a Academia ignorar seu nome, estarão assinando definitivamente o atestado de ignorância no assunto.

Porém, não é só DiCaprio quem brilha. Jonah Hill, o ator que mais faz papéis de coadjuvante, novamente se destaca com um personagem bastante engraçado e bem construído. Tem ainda a pequena mas excelente participação de Matthew McConaughey, como o mentor de Belfort, Jean Dujardim como o banqueiro suíço Jean-Jacques Saurel, e a linda Margot Robbie como esposa de Belfort.

Sobre a parte técnica, destaco a fotografia, com ambientes luxuosos bem construídos, dando maior realidade à história contada, e a trilha sonora, com músicas de rock n' roll conhecidas do público. O enredo, escrito primorosamente por Terence Winter, também é arrebatador.



Por fim, O Lobo de Wall Street é mais um grande acerto dessa carreira já brilhante do diretor. Aliás, esse talvez seja o melhor trabalho de Scorsese em muitos anos. É maravilhoso saber que ainda existem cineastas corajosos como ele, que não tem medo de crítica e põem a cara a tapa, rompendo com o cinema americano certinho.


quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

5 filmes imperdíveis com Christian Bale.

Christian Charles Phillips Bale, nascido no País de Gales, é hoje um dos atores mais bem pagos de Hollywood. E não é para menos. Conhecido por se entregar de corpo e alma aos seus personagens, o que ocasionou perdas e ganhos impressionantes de peso, Bale começou cedo na carreira. Com apenas 13 anos de idade, o ator já chamava a atenção do mundo todo com sua participação no filme Império do Sol (Empire of the Sun), do diretor Steven Spielberg, ganhando inclusive alguns prêmio de melhor ator juvenil na época. Porém, seu primeiro sucesso de verdade veio com Psicopata Americano (American Psycho), em 2000, onde ele deu vida ao serial killer icônico Patrick Bateman.

De lá para cá, Bale se dividiu entre filmes bons e ruins, mas sempre mantendo a qualidade nas atuações. Em 2011 levou para casa seu primeiro Óscar da carreira, de ator coadjuvante, por O Vencedor (The Fighter). Atualmente seu nome voltou à tona com o sucesso da trilogia Batman, onde deu vida ao super-herói, além de Trapaça (American Hustle), onde ele está irreconhecível no papel do vigarista Irving Rosenfeld. Na data do seu aniversário, confira uma lista com cinco filmes que contam com o ator e que você não pode perder.

1. O Vencedor (2010)

Sob a direção de David O. Russell, Bale dá vida ao boxeador Dicky Ecklund, que atingiu o auge ao enfrentar o campeão mundial Sugar Ray Leonard em uma luta. Depois de anos, ele ainda vive dessa fama, apesar de ter desperdiçado sua vida com o uso descontrolado de drogas. Bale teve de passar por uma rigorosa dieta para perder peso e dar vida ao ex-boxeador usuário de crack, mas o esforço valeu a pena, e foi com esse filme que ele levou pra casa o Óscar de melhor ator coadjuvante.

2. Psicopata Americano (2000)

Na trama, Bale é Patrick Bateman, um jovem que trabalha na bolsa de valores e é respeitado por todos ao redor. Rico, bonito e cheio de privilégios, ninguém imagina que ele é secretamente um serial killer. Sua principal motivação é matar aqueles que mostram ser/ter mais do que ele, em um misto de inveja e zelo materialista.

3. O Operário (2004)

Trevor Reznik trabalha numa fábrica operando maquinários pesados, e faz de tudo para manter seu emprego. Ele já não dorme há um ano, e sua saúde mental e física vão progressivamente o destruindo. Depois que um acidente na fábrica faz com que um colega seu perca o braço, ele começa a delirar, tornando-se paranoico e acreditando que todos estão conspirando para demiti-lo.

4. Flores do Oriente

Nesta super produção chinesa, Bale dá vida a um falso padre que acolhe em uma igreja de Nanquim um grupo de mulheres, entre prostitutas e estudantes, numa época em que milhares de mulheres eram estupradas pelas tropas japonesas que invadiram a cidade em 1937, no episódio que ficou conhecido como Massacre de Nanquim. O longa é bastante pesado e difícil de assistir, tamanha realidade imposta em cena. No entanto, vale a pena cada segundo.

5. Batman: O Cavaleiro das Trevas (2008)

Bale foi escolhido debaixo de protestos (o que é normal vindo dos fãs das HQ's) para viver seu personagem mais popular até então, o super-herói Batman. E o resultado final foi muito bom. Contando com a ajuda de James Gordon (Gary Oldman) e Harvey Dent (Aaron Eckhart), ele precisa salvar a cidade de Gotham City do crime organizado, tendo como inimigo o excêntrico Curinga (Heath Ledger).

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Crítica: A Menina que Roubava Livros (2014)


Adaptar um best-seller para o cinema não é tarefa fácil, e fica ainda pior quando ele é um dos livros mais queridos e vendidos da história. Sempre vai ter gente para dizer que o filme não fez jus ao livro e coisas do tipo, mas o fato é que na adaptação de A Menina que Roubava Livros (The Book Thief), o diretor Brian Percival conseguiu acertar em cheio.



Estamos na Alemanha nazista, e o ano é 1938. A guerra ainda não está no seu ápice, mas Hitler já manda e desmanda absurdos no país, e grande parcela da população segue à risca tudo o que ele grita nos microfones. Nesse clima, vive a jovem Liesel Meminger (Sophie Nélisse), filha de uma mulher que é perseguida depois de ser acusada como comunista. Liesel e seu irmão pequeno são obrigados a irem morar junto de um casal que aceitam cuidar de ambos durante o período, em um pequeno vilarejo alemão. No trajeto, porém, o menino acaba morrendo, deixando Liesel sozinha no mundo.

No enterro do garoto, o coveiro deixa cair um livro no meio da neve, que Liesel pega para si, guardando como uma última lembrança da família verdadeira. Chegando na casa dos Hubermann, ela é recebida pelo carinhoso Hans (Geoffrey Rush) e pela amargurada Rosa (Emily Watson).



Criando uma forte amizade com o vizinho Rudy (Nico Liersch), Liesel começa a frequentar a escola e a brincar na rua com as crianças da região, sempre alegre mas nunca esquecendo seu triste passado. Seu melhor amigo no entanto acaba sendo seu novo pai. A amizade que se cria entre Liesel e Hans é tocante. É ele quem lhe ensina a ler e escrever, entre outras coisas da vida, numa relação realmente fraternal.

Quando começa a perseguição nazista com os judeus, aparece na casa dos Hubermann um rapaz chamado Max, filho de um homem que salvou Hans na Primeira Guerra. Por conta dessa dívida, Hans se prontifica a abrigá-lo até que a situação se acalme, o que infelizmente não acontece. Após o cerco alemão se fechar, quando os soldados começam a verificar cada porão de cada casa, Max se vê obrigado a ir embora para não pôr o casal ainda mais em risco.



Liesel viu em Max o irmão mais velho que ela não teve. As conversas que eles tem sobre a vida são de uma maturidade impressionante. Quando Max ficou doente e quase chegou ao óbito, Liesel sentava-se ao seu lado todo dia para ler os livros que roubava da casa do prefeito, onde ia levar as roupas que a sua mãe passava. A perda desse contato acaba afetando bastante a menina, que mal sabe que o pior ainda está por vir.

O final, apesar de triste, ainda reserva um espaço para o otimismo. O enredo é bastante fiel ao livro, e disso os queixosos não podem falar. O ponto forte é certamente a ambientação da época, tanto dos cenários como dos figurinos. As atuações são boas, mas nada excepcionais. Quem se destaca é a menina Sophie Nélisse, que leva bem a personagem principal, com seus medos, suas angústias, e sua vontade de viver.



Outro ponto positivo é a trilha sonora, tanto que sua indicação o óscar vem justamente nessa categoria. A única coisa em que o filme peca é no ritmo, lento e sempre retilíneo. Talvez a estória seja realmente mais bonita contada dessa forma, mas faltou algo diferenciado, algo que desse um ânimo a mais em quem assistia durante as duas horas. No entanto, isso não estraga o resultado final visto na tela.

Por fim, fica claro que Percival fez um ótimo trabalho. Como adaptação, o efeito foi perfeito. Narrado pela morte, assim como no livro, A Menina que Roubava Livros é um filme bem bacana de assistir, e já entrou pro hall dos mais bacanas sobre o período.


domingo, 26 de janeiro de 2014

Recomendação de Filme #50

Réquiem Para um Sonho - Darren Aronofsky (2000)

Todo diretor possui pelo menos uma obra-prima, e na carreira de Darren Aronofsky não é difícil identificá-la. Apesar de ser mais reconhecido pelo recente Cisne Negro (que eu particularmente achei um porre), foi com Réquiem Para um Sonho (Requiem for a Dream), que o diretor entrou definitivamente na lista dos mais importantes da história de Hollywood, ganhando meu respeito e admiração.


A trama, dividida entre três estações do ano (verão, outono e inverno), começa mostrando Harry Goldfarb (Jared Leto), um viciado em heroína, que junto com seu amigo Tyrone (Marlon Wayons) está levando a televisão da sua mãe para revender em troca da droga. Fica bastante claro que não é a primeira vez, e que isso é recorrente. Sua mãe Sara Goldfarb (Ellen Burstyn), por sua vez, passa as noites vendo seu programa de auditório preferido na televisão, quase como um vício, e por isso mesmo acaba sempre indo atrás para recuperar o aparelho das mãos do traficante.

Após receber um convite por telefone para participar ao vivo do programa, Sara começa a tomar remédios para emagrecer, e assim, conseguir usar seu vestido vermelho que ela não usa há anos. Os remédios, porém, começam a causar alguns efeitos colaterais, principalmente quando ela passa a abusar da dose. Sara passa a delirar, a ter alucinações, e a perder peso descontroladamente, e a transformação da personagem ao longo do filme é algo que realmente impressiona.



Enquanto isso Harry, junto com a sua namorada Marion (Jennifer Connoly) e o seu amigo Tyrone, resolvem começar um novo projeto de venda de drogas, se envolvendo com o narcotráfico. O filme mostra bastante que por mais complicado que seja a vida, todos tem sonhos. O de Harry e Marion é conseguir uma grana para montar uma loja de roupas, enquanto o de Tyrone é escapar das ruas e deixar sua mãe orgulhosa. 

No entanto, eles acabam se metendo com gente da pesada, até Tyrone ir parar na cadeia. O dinheiro que eles conseguiram vai quase todo no pagamento da fiança, e desesperados por conta da abstinência, eles começam a fazer coisas absurdas. Marion, por exemplo, faz sexo com seu psiquiatra em troca de dinheiro.



O final é frenético, e extremamente angustiante. Sara fica tão insana, que tem que ser internada numa clínica, onde passa por duros tratamentos de choque. A cena é terrível, e qualquer ser-humano provido de sentimentos vai sentir um peso no peito. Harry, que por conta da droga vai tendo seu braço deteriorado, acaba tendo que amputá-lo no hospital. Tyrone é novamente preso, acusado de ser um viciado, e passa a ter de lidar sozinho contra a abstinência. Já Marion, se deteriora de vez em meio à orgias em troca de cocaína.

As atuações são impressionantes, principalmente a da atriz Elle Burstyn, que tem uma das melhores já vistas na história do cinema. Jared Leto e Jennifer Connoly também está impecáveis. O enredo arrebatador, com a crítica direta ao mundo dos psicofármacos, é realmente muito bem escrito e melhor ainda colocado em cena. É interessante ver a associação que Aronofsky faz entre as drogas ilegais e os remédios para emagrecimento, que são legais e receitados por médicos. Ambos são nocivos, e o segundo chega a ser até mais.



Requiém Para um Sonho é um dos filmes mais angustiantes que já tive a oportunidade de assistir, e o jeito que o diretor conta a estória é certamente diferente de tudo que você já viu. É o tipo de obra que deixa uma marca no subconsciente do espectador, que jamais vai esquecer o que viu e ouviu.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

A vida e a obra de Martin Scorsese.


Para muitos críticos de cinema, Martin Scorsese é considerado o "melhor diretor americano vivo". E de fato, não é para menos. A cada novo filme lançado por ele, minha admiração só aumenta, e dentre os cineastas que surgiram na mesma geração (De Palma, Spielberg, Coppola, entre outros), ele é certamente o que mais me agrada.

Dono de uma carreira brilhante, ele possui vários dos seus filmes em posições de destaque na lista dos melhores de todos os tempos, feita pela "American Film Institute". Apesar desse feito, ele ficou marcado por ter sido, durante quase três décadas, completamente ignorado pelo Óscar, em mais uma das injustiças históricas da Academia. No entanto, a premiação sutilmente lhe pediu desculpas premiando-o por Os Infiltrados (The Departed), em 2007.


Martin Marcantonio Luciano Scorsese nasceu na cidade de Nova York, no dia 17 de novembro de 1942. Vindo de uma família de descendente italianos, cresceu nas ruas do modesto bairro Little Italy (Pequena Itália). Por conta de suas fortes crises de asma, Scorsese era impossibilitado de praticar esportes, e para passar o tempo, seu pai o levava seguidamente ao cinema. Pelos menos duas vezes por semana, alegou o diretor, que declarou também que foi nessa época que ele começou a desenhar suas primeiras histórias imaginárias.

Aos 14 anos, se dedicou ao sacerdócio, ingressando num seminário local. Sim, Scorsese queria ser padre! Porém, sua paixão pela sétima arte o impediu de seguir a carreira religiosa, impulsionando sua trajetória no mundo cinematográfico. Para nossa sorte, e principalmente para o bem do cinema.

Essa sua veia católica acabou influenciando boa parte dos seus primeiros curtas, ainda nos anos 50. Sua principal influência no entanto foi o neo-realismo italiano, de quem ele era fã, sobretudo de Fellini, De Sica e Rosselini. Outro cineasta que foi bastante importante para sua formação foi o brasileiro Gláuber Rocha, principal nome do Cinema Novo. Scorsese chegou inclusive a ajudar na recuperação de alguns filmes perdidos do diretor nessas últimas décadas.

Alguns anos depois, em 1963, matriculou-se na Universidade de Nova York para estudar cinema, onde rodou mais alguns curtas de pouca expressão. Dois anos depois, após se graduar no curso, passou a trabalhar no mesmo local como professor adjunto, onde deu aulas para alunos que viriam se tornam ilustres colegas, como Oliver Stone e Spike Lee.


Seu nome apareceu mundialmente pela primeira vez em 1967 com o curta The Big Shave, que fazia uma crítica à Guerra do Vietnã, e foi sensação no Festival de Cinema Experimental de Knokkele-Zoute, na Bélgica. Esforçado, Scorsese trabalhou nessa época como montador em Hollywood até conseguir dirigir seu primeiro longa, o drama autobiográfico Quem Bate à Minha Porta? (I Call First). Protagonizado por Zina Bethune e Harvey Keitel, o filme é ambientado na comunidade Ítalo-Americana, mostrando a violência que havia nas ruas daquele bairro na época.

Em 1972, a convite do famoso produtor Roger Corman, Scorsese dirigiu Sexy e Marginal (Boxcar Bertha), onde trabalhou com o casal David Carradine e Barbara Hershey. Nesse período, seu amigo pessoal Brian De Palma o apresentou a um jovem ator que estava em ascensão e que ainda era pouco conhecido no ramo: Robert De Niro. Não demorou para que Scorsese e De Niro virassem amigos íntimos, firmando uma das parcerias mais marcantes e rentáveis da história do cinema.


O primeiro filme da parceria foi o aclamado Caminhos Perigosos (Mean Streets), lançado em 1973, e novamente ambientado no bairro de imigrantes italianos. Antes dos dois voltarem a trabalhar juntos, Scorsese dirigiu o sensível Alice Não Mora Mais Aqui (Alice Doesn't Live Here Anymore), com a excelente Ellen Burstyn, que levou para casa o Óscar de melhor atriz daquele ano.

Em 1976, Scorsese deixou o público de boca aberta com Táxi Driver, um filme violento e visceral que mostrava uma Nova York bem diferente do glamour visto até então no cinema. Protagonizado por Robert De Niro e Jodie Foster, o longa pode ser considerado um marco na história do cinema americano, e é considerado até hoje um dos melhores filmes já feitos por lá. Cinco anos depois do seu lançamento, o filme ainda causava polêmica, depois que um jovem quase tirou a vida do presidente Reagan e justificou o ato com a obsessão que tinha pela história.



Depois de receber quatro indicações aos Óscar, Scorsese ficou encorajado de lançar mais um projeto arrojado, New York, New York, um tributo musical à sua cidade natal. No entanto, o filme foi um fracasso de bilheteria, levando o diretor a uma forte depressão. Ele se reergueu um ano depois, da melhor forma possível, com O Último Concerto de Rock (The Last Waltz). O longa documenta o último show dos "The Band" em 1978, e conta com a participação de Bob Dylan, Eric Clapton, Neil Young, entre outros artistas da cena.

Em 1980, com medo de ter que encerrar a carreira por conta da saúde precária, ele colocou todas as suas energias na produção de Touro Indomável (Raging Bull), e o resultado foi melhor do que o esperado. Tido como uma obra-prima, o filme estrelado novamente por Robert De Niro foi amplamente elogiado, e recebeu oito indicações ao Óscar, incluindo a de melhor filme, melhor ator, e pela primeira vez, de melhor diretor. Scorsese não ganhou, mas a indicação serviu para que seu nome entrasse de vez no hall dos melhores cineastas de todos os tempos.



Depois do sucesso de Touro Indomável, Scorsese filmou três filmes de menor expressão até a metade da década de 80, mas ainda assim muito bons. O primeiro foi O Rei da Comédia (The King of Comedy), que trazia Robert De Niro novamente como protagonista, no papel de um comediante que tinha o sonho de aparecer na televisão, e que para isso, seria capaz de qualquer coisa.

Logo após veio Depois de Horas (After Hours), uma comédia maluca sobre um homem que vive, em apenas uma noite, diversas situações fora do comum. O último foi A Cor do Dinheiro (The Color of Money), que dentre os três foi o que mais arrecadou bilheteria, principalmente por conta da participação dos astros Paul Newman e Tom Cruise.

Em 1988, Scorsese pôr em prática um projeto que há tempos sonhava realizar: A Última Tentação de Cristo (The Last Temptation of Christ), adaptação do livro homônimo escrito pelo grego Nikos Kazantzákis e lançado em 1951. Para filmar o longa, o diretor utilizou de um orçamento bastante baixo, principalmente por não levar fé que o filme lhe traria algum retorno comercial.



No entanto, o filme não apenas bateu recordes de bilheteria, como causou comoção nacional, gerando uma onda de protestos como nunca visto antes ao redor de um filme. A tentativa de mostrar Jesus Cristo como uma pessoa comum, que se casa com Maria Madalena e constitui uma família, levou os religiosos mais fanáticos a ameaçarem o diretor de morte. Porém, o apoio que ele recebeu, inclusive de importantes figuras políticas, impediu que sua carreira decaísse, e abriu espaço para ele lançar aquele que viria a ser o filme mais popular da sua carreira.

Com Os Bons Companheiros (Goodfellas), Scorsese retornou à cidade de Nova York, além de retomar sua parceria com Robert De Niro. Considerado um dos melhores filmes sobre gângsters já feito para o cinema, o longa chega a dividir alguns fãs do gênero, que o comparam ao clássico de Coppola, O Poderoso Chefão. Com cenas memoráveis, Os Bons Companheiros aborda a vida de três poderosos mafiosos, desde sua ascendência ao crime até sua queda. Mais uma vez nomeado ao Óscar, o diretor voltou para casa de mãos vazias.



Seu próximo filme foi Cabo do Medo (Cape Fear), remake do filme Círculo do Medo, de 1963. Outra vez trabalhando com De Niro, o filme foi um sucesso de bilheteria, e concorreu a dois óscares. Em 1993, o diretor lançou o drama A Época da Inocência (The Age of Innocence), com Michelle Pfeiffer, Winona Ryder e Daniel Day-Lewis, que apesar do bom elenco e da boa estória, foi um fracasso de bilheteria.

Com Cassino (Casino), lançado em 1995, Scorsese voltou a falar novamente de máfia, mas dessa vez sobre os grupos que comandavam (e ainda comandam) os grandes cassinos de Las Vegas. O longa foi um sucesso, e ficou marcado principalmente por ser o último filme da sua parceria de anos com De Niro.



Finalizando a década de 90, ele lançou pequenos filmes como Kundun (sobre o exílio de Dalai Lama, que tornou Scorsese persona non grata na China), o documentário autobiográfico Minha Viagem à Itália, e o drama psicológico Vivendo no Limite, com Nicolas Cage.



ANOS 2000

A virada do século trouxe uma repaginada total na carreira do diretor. Gangues de Nova York (Gangs of New York), lançado em 2002, foi o filme mais arriscado e grandioso da sua carreira. Com uma produção detalhista, e um orçamento de mais de 100 milhões de dólares, foi até hoje o seu trabalho mais impressionante, recebendo 10 indicações ao Óscar (ainda que não tenha ganho em nenhuma, um absurdo).

Ele conseguiu, através de um ótimo trabalho em conjunto com a direção de arte, transcrever com perfeição a Nova York do século 19, e a guerra que havia entre as duas gangues que dominavam a cidade na época. Foi também seu primeiro filme com o ator Leonardo DiCaprio, que veio assumir o lugar de De Niro como "xodó" do diretor.



Sua segunda parceria com DiCaprio veio dois anos depois, no excelente O Aviador (The Aviator). O longa, que aborda a vida do excêntrico milionário Howard Hughes, foi até então o seu filme mais bem sucedido em premiações, levando para casa 5 Óscares (menos o de diretor, mais uma vez).

Exatos dois anos depois, DiCaprio seria protagonista de mais um filme seu: Os Infiltrados (The Departed). Considerado por muitos como o seu melhor trabalho desde Os Bons Companheiros (o que eu não concordo), foi com ele que Scorsese finalmente levantou o Óscar de melhor diretor, após anos de tentativas frustradas. O prêmio foi entregue pelas mãos dos amigos Francis Ford Coppola, George Lucas e Steven Spielberg, em um claro pedido de desculpas da Academia depois de tantos anos sendo deixado de lado.


Nesse período, ele deu uma pausa nos seus filmes para lançar três documentários musicais. No Direction Home, lançado em 2005, aborda a vida do músico Bod Dylan, e o impacto que ele teve na cultura americana nos anos 60. Outro que teve sua vida mostrada nas telas foi o beatle George Harrison, em George Harrison: Living in the Material World.The Rolling Stones: Shine a Light foi realizado com o intuito de mostrar duas gigantescas apresentações dos Rolling Stones em Nova York, de quem Scorsese é fã declarado.

Em 2010, ele voltou a trabalhar com DiCaprio em um dos seus melhores trabalhos da década, o drama psicológico Ilha do Medo (Shutter Island). Contando também com Mark Ruffaloe Ben Kingsley, o filme é bastante obscuro, sombrio, e traz uma estória repleta de reviravoltas.

Seu nome voltou à mídia em 2011, após o lançamento de A Invenção de Hugo Cabret (Hugo). Diferente de tudo que o diretor tinha feito até então, ele declarou abertamente que adorou fazê-lo, mas que só começou o projeto porque seu filho pequeno pediu para que ele fizesse um filme que ele "pudesse assistir". Apesar do tom juvenil na hora de contar a estória, o filme é espetacular, e faz uma homenagem emocionante ao mestre francês George Meliès, um dos precursores do cinema.



Scorsese volta aos cinemas em 2013 com O Lobo de Wall Street (The Wolf of Wall Street), que aqui no Brasil tem estreia programada para janeiro de 2014. Pela quinta vez trabalhando com DiCaprio, o filme aborda a vida do corretor da bolsa de valores Jordan Belfort, que entrou em decadência nos anos 90 por conta do abuso de drogas e dos crimes de colarinho branco. 

Pensando no futuro, Scorsese já está em fase de produção de Silence, que deverá ser seu próximo filme, e será ambientado no Japão do século 16. Ainda há boatos de que o diretor pensa reunir novamente De Niro e Al Pacino em um filme de máfia, antes de se aposentar. Se isso realmente acontecer, servirá para finalizar com chave de ouro a carreira.

Por tudo isso, posso dizer que Scorsese faz parte do pequeno e seleto grupo de gênios do cinema. Não é preciso muito para concordar que ele é um mestre na arte de fazer filmes. Sua filmografia fala por si!

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Crítica: Clube de Compras Dallas (2014)


O diretor canadense Jean Marc-Valée ganhou meu respeito e minha admiração após ter lançado, em 2005, o maravilhoso C.R.A.Z.Y. -Loucos de Amor, sobre um rapaz homossexual que tinha que lidar com o preconceito de todos, principalmente da própria família. De lá para cá, ele lançou dois filmes de baixa divulgação (A Jovem Rainha Vitória e Café de Flore), mas agora em 2013 voltou com tudo, filmando o excelente Clube de Compras Dallas (Dallas Buyers Club), forte candidato ao Óscar de 2014.


A trama se passa nos anos 80, e é baseada na história real de Ron Woodroof (Matthew McConaughey), um homem que ganhava a vida comandando apostas num circuito de rodeios no Texas. Machista, extremamente preconceituoso (sobretudo contra homossexuais), e usuário incontrolável de drogas e álcool, Woodroof é um personagem repugnante, com pensamentos retrógrados, que desperta nosso desprezo logo de cara.

Enquanto ele arrecada dinheiro numa roda de apostas, ele lê o jornal e faz uma brincadeira com a situação do ator Rock Hudson, que está internado num hospital com AIDS. Para ele, todas as pessoas que adquirem a doença são gays, e ele acredita inclusive que pode ser um castigo para a maneira de vida que eles levam. O diretor não se exime de mostrar o quanto era comum e aceitável esse tipo de pensamento nessa época, onde ninguém conhecia direito a doença e saía falando o que bem entendia.


Após tossir sangue, sentir tonturas e desmaiar do nada, Woodroof é levado ao hospital onde o Dr. Sevard (Denis O'Hare) lhe dá o diagnóstico: ele está com o vírus HIV. Enfurecido, ele sai do hospital xingando o médico e sua assistente, afinal, como ousam dar a entender que ele teve alguma relação homossexual? Sim, é somente isso que passa pela sua cabeça.

Após uns dias, Woodproof finalmente deixa a ignorância de lado e vai pesquisar melhor sobre a doença na biblioteca da cidade. É quando ele descobre que a AIDS pode ser transmitida por sexo com mulheres também, ou até mesmo através de drogas injetáveis. É quando ele lembra que há poucos dias transou com uma mulher sem proteção alguma, e que ela tinha diversas picadas pelo braço. Ele então entra em desespero.


Através da pesquisa, ele também fica sabendo que um grande laboratório americano está fazendo testes com uma nova droga, a AZT. Ele decide voltar ao hospital e pedir para a Dra. Eve Saks (Jennifer Garner) que ela o use como cobaia nos testes. Ela, porém, não tem o que fazer, já que a decisão não é sua. A partir de então, começamos a mergulhar junto com o personagem no mundo sujo das indústrias farmacêuticas.

Deve ser realmente desesperador saber que existe no mercado um novo remédio que pode lhe fazer melhorar, mas que você não está nem no grupo de testes. Com um "jeitinho", ele consegue a droga de forma clandestina, através de um enfermeiro do local. No entanto quando o estoque chega ao fim, ele acaba sendo novamente internado, ainda pior do que na primeira vez.


No hospital, ele conhece Rayon (Jared Leto), um travesti que está internado na cama ao lado, pelo mesmo motivo. De início, Woodroof repugna o colega de quarto pela sua opção sexual, mas aos poucos, ele também vai sofrendo preconceito por parte das pessoas que antes o viam como amigo, que acham que ele adquiriu a doença tendo relações com outro homem. Por conta disso, ele acaba percebendo que Rayon é tão vítima de tudo quanto ele, e que pensar dessa forma é pura ignorância.

Após ir ao México, onde é tratado pelo Dr. Vass (Griffin Dunne), ele volta para os Estados Unidos com uma nova visão sobre tudo, e com uma ideia para fazer dinheiro: importar ilegalmente a droga para o país, e vender para as pessoas com a doença. Porém, não é mais o AZT, e sim, um coquetel criado pelo doutor, que parece mais eficaz do que a droga legal testada pelos laboratórios.


Novamente entra em questão a sujeira da indústria de remédios, e isso é talvez o ponto forte do enredo. Afinal, tratamentos para doenças mais graves parecem ser exclusivos para quem tem dinheiro, e se você não tem como pagar, que morra silenciosamente. Indo contra esse pensamento mesquinho, Woodroof cria o Clube de Compras Dallas, onde passa a cobrar apenas uma mensalidade em troca dos remédios ilimitados, criando uma clientela fiel e esperançosa a respeito dos avanços na enfermidade. Porém, é óbvio que isso iria causar atritos com a FPA (instituto responsável por aprovar todo medicamento e alimento vendido nos Estados Unidos), que viraria numa verdadeira caça de gato e rato.

A humanização do personagem é realmente impressionante. Ele não muda seu estilo de vida, e alguns dos seus pensamentos, mas a convivência com pessoas de todos os tipos, principalmente homossexuais, acaba fazendo com que ele perceba algo que todos deveriam saber: que não importa a cor de pele, a classe social ou a opção sexual, no final somos todos iguais. Ele acaba virando uma espécie de herói, ainda que muitos não aceitem essa alcunha num homem com um estilo de vida como o seu. Porém, muitos doentes tiveram um tempo a mais de vida graças à sua atitude, mostrando que não é necessário ser um "santo" para fazer algo bom pelas pessoas.


O roteiro é certamente um dos mais bem escritos dos últimos anos. Mais do que a redenção do personagem ou sua luta contra os gigantes dos remédios, um dos pontos mais interessantes e positivos é que ele mostra como nenhum outro o surgimento da doença em meio ao público, e o quanto ela era mal interpretada. A fotografia, a ambientação e o figurino da época, e a trilha sonora são realmente de tirar o chapéu. Mas com certeza, o melhor do filme está mesmo nas atuações.

Primeiramente, McConaughey está impecável no papel de Woodroof, nessa que pode ser a sua melhor atuação da carreira. O ator, que perdeu 21 quilos para viver o personagem, dá simplesmente um show, convencendo do início ao fim. No entanto, devo dizer que o que mais me impressionou foi mesmo a participação de Jared Leto. Há poucos dias, fiz um post por aqui com as transformações do ator ao longo da carreira, e aqui ele simplesmente se superou. Leto está irreconhecível, e como McConaughey, também perdeu dezenas de quilos para viver o travesti Rayon. Não é à toa que os dois são favoritos para fazer uma dobradinha no Óscar, como melhor ator e melhor ator coadjuvante.


Por fim, Clube de Compras Dallas é realmente primoroso, tanto que virou meu favorito para receber a estatueta em Los Angeles. A ótima direção, o ótimo elenco e o ótimo roteiro são elementos que, juntos, fazem dele um dos melhores filmes de 2013. É um filme sobre uma enfermidade, mas completamente diferente do que visto até então, até porque vai muito além disso. Não há milagres, não há otimismo. Apenas a história de vida de pessoas que, além de ter de lutar diariamente contra uma doença terminal, ainda tem que sofrer com o preconceito e a ignorância dos outros.


sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Crítica: Ela (2014)


Escolhido por alguns críticos americanos como o melhor filme de 2013, Ela (Her) traz uma curiosa história de amor entre um homem e um... sistema operacional. Calma, calma, eu sei que isso soa estranho, mas ao longo da crítica vocês irão entender melhor do que eu estou falando.


Na trama, Theodore Twombley (Joaquin Phoenix) é um rapaz melancólico, que trabalha escrevendo cartas bastante pessoais e poéticas para outras pessoas enviarem em nome delas. Antissocial e recluso, todo dia ele faz apenas o trajeto de casa para o trabalho, e sua única diversão é jogar o videogame ultra moderno que ele tem na sala de casa.

Aliás, basta olhar para o tal videogame, de alta dimensão, para percebemos que estamos num mundo futurista, mas um futuro não muito distante assim, se analisarmos o que nossa tecnologia de hoje já é capaz de fazer. Além do videogame, Theodore usa diariamente um sistema em seu smartphone que faz tudo que ele quer, usando apenas com comandos de voz. Notícias ou e-mails, tudo é lido em seu ouvido por uma voz.


Certo dia, uma gigante das comunicações cria um sistema operacional chamado de OS1, que possui inteligência artificial suficiente para se comunicar com os seres-humanos de forma interativa. Logo, Theodore compra o programa, e sua primeira escolha é que a voz de seu sistema seja feminina. É então que surge Samantha (Scarlett Johansson), cuja voz passa a acompanhá-lo aonde ele vai.

Com ela, ele desabafa e conversa sobre tudo que se possa imaginar. Fala bastante sobre sua vida passada, onde era feliz com sua ex-mulher, e o quanto o tempo foi corrosivo para a relação. O diretor Spike Jonze (de Quero Ser John Malkovith) utiliza também alguns flashbacks desse momentos em que ele viveu com Katherine, para salientar a nostalgia que o personagem se vê afundado. No entanto, é perceptível o fato dele parecer bem mais alegre com a vida depois dessa nova mudança.


Aos poucos, a inteligência artificial de Samantha vai aumentando, e ele consequentemente vai se apaixonando por ela. Principalmente por ela ser a única "pessoa" que lhe ouve, e que lhe faz rir. É interessante esse paralelo que Jonze faz com o que acontece hoje em dia. Basta paramos em um lugar público hoje, para vermos milhões de pessoas conectadas aos seus próprios "OS1". Pessoas que saem de casa e não desgrudam os olhos do seu smartphone nem para ir ao banheiro ou atravessar a rua.

Outra coisa interessante é o fato de Theodore escrever as tais cartas. Ele põe emoção no que escreve, e com ajuda do computador, imita perfeitamente a caligrafia do verdadeiro remetente. Uma crítica ácida de Jonze a respeito do uso cada vez menos constante da escrita, querendo dar a entender que no futuro, ninguém mais saberá escrever bem, e precisará da ajuda de outros para tanto.


Dá para se dizer que é um filme de um homem só. Apesar de outros personagens também aparecerem, ainda que esporadicamente, Theodore é a cara do filme. Joaquin Phoenix se saí muito bem no papel desse homem misterioso, cujo único desejo era ter alguém para dividir a cama, e a vida.

Com ares de filme independente, Ela é um misto de drama, comédia e ficção científica, em um filme cheio de diálogos reflexivos. Achei curiosíssima a escolha dos figurinos, e impecável todo o seu visual. No entanto, apesar de todas essas qualidades, achei o filme um pouco arrastado demais, o que pra mim, comprometeu um pouco o resultado final.