domingo, 23 de outubro de 2022

Crítica: Argentina, 1985 (2022)

A última e mais violenta ditadura militar da Argentina durou sete anos, de 1976 a 1983, e assim como ocorreu no Brasil, também ficou marcada pelos inúmeros casos de desaparecimentos, perseguições, prisões arbitrárias, torturas, e demais crimes de lesa-humanidade, que deixaram marcas profundas que perduram até os dias de hoje.


Escolhido como representante do país no próximo Oscar de melhor filme estrangeiro, "Argentina, 1985" se passa dois anos após o fim do regime, e acompanha o julgamento que colocou os militares responsáveis pela brutal repressão na cadeira dos réus. O caso foi levado a júri pelo veterano promotor Julio Strassera (Ricardo Darín) e seu vice-promotor, Luis Moreno Ocampo (Peter Lanzani), que conseguiram em tempo recorde resgatar dezenas de milhares de provas cabais dos crimes cometidos pelos militares, além de reunir testemunhas e familiares das vítimas.

Na primeira metade do filme acompanhamos toda a preparação da promotoria, desde a escolha pelo nome de Strassera, até a montagem de sua equipe, constituída majoritariamente de jovens advogados e estudantes, e a busca deles pelas provas. Já na segunda metade, temos o julgamento em si, com os depoimentos terríveis das testemunhas, e as provas sendo mostradas perante o tribunal.


Gostei da maneira que o diretor utiliza o humor em algumas cenas, mesmo se tratando de um tema tão pesado e que remexe em feridas. Não é nada explícito, mas sutil, e ajuda a aliviar um pouco o clima, já que na parte do tribunal ele pesa de uma forma contundente. São depoimentos realmente dolorosos de testemunhas e vítimas, contando todos os horrores que eram cometidos durante suas prisões.

O personagem de Ricardo Darín (que por sinal dá mais um show de interpretação) não é implacavelmente idealista e tampouco tem "sede de vingança" pelos acontecimentos, e quer apenas fazer com que se cumpra a justiça e sejam punidos os responsáveis por crimes tão hediondos. Enquanto o processo se desenrola, a segurança de sua família é posta em risco, o que acaba criando também um clima de tensão. Mas ele não desiste e segue firme na missão.

O filme tem diálogos muito potentes, que de certa forma até remetem ao Brasil dos dias de hoje. Pessoas completamente "cegas", que mesmo depois de todas as provas e testemunhos, ainda acreditam que o regime militar não foi tão ruim como parece. Da mesma forma, vemos personagens que eram favoráveis ao regime finalmente abrindo os olhos e enxergando a verdade, como a mãe de Ocampos, que veio de uma família de militares e rezava na mesma igreja que o ditador Jorge Rafael Videla.



Por fim, a frase com que Strassera termina seu discurso antes da sentença final dos juízes, não poderia ser mais necessária: "Nunca Mais". Simples, direta e com um peso incomensurável, remete ao sentimento de qualquer sociedade que tenha passado por momentos de perda da liberdade e não quer que isso se repita jamais.


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