segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Crítica: Joyland (2022)


O Paquistão ainda é um país extremamente conservador, principalmente quando se fala em direito das mulheres e na causa LGBT. Para se ter uma ideia, lá a homossexualidade ainda é ilegal e pode ser punível com prisão, em pleno 2023. E em relação às mulheres, os direitos são extremamente limitados pelo fundamentalismo religioso, como o direito de ir e vir, a decisão sobre o casamento, e até mesmo sobre a própria aparência. Dito isso, fica ainda mais surpreendente o fato de Joyland ter sido o escolhido para representar o país no Oscar de melhor filme internacional este ano, já que o filme critica justamente o preconceito de gênero e o machismo existente nesse sistema patriarcal. E vendo por este lado, apesar de não ter ficado entre os cinco finalistas do prêmio, ele já pode ser considerado um vencedor.


Com uma direção firme do estreante Saim Sadiq, a trama acompanha Haider (Ali Junejo), um homem que está desempregado e vive com a esposa Mumtaz (Rasti Farooq) na casa do pai. Ela trabalha como maquiadora e ama o que faz, e seu sucesso na carreira tem lhe permitido guardar dinheiro e sonhar com uma vida mais confortável. Porém, cansado de ser julgado por ser sustentado pela mulher, o que não é bem visto pela sociedade e muito menos pela própria família, Haider vai atrás de um emprego, e no desespero acaba aceitando uma proposta para trabalhar como dançarino em um teatro da cidade, que é conhecido pelas apresentações de danças eróticas.

No mesmo local, Biba (Alina Khan) sente na pele todo o preconceito do público e dos próprios donos do teatro por ser uma mulher trans. Eles a colocam em horários alternativos e muitas vezes forjam problemas técnicos para interromper seu show no meio. Além disso, o público em sua grande maioria deixa o teatro na hora em que ela aparece no palco. Na tentativa de fazer uma apresentação que prenda o público, ela chama vários dançarinos homens, e entre eles está Haider, que cai de paraquedas no grupo mesmo sem nunca ter dançado na vida. A partir de então, aos poucos, a relação de Haider e Biba vai se intensificando para além da relação profissional.

Apesar de pincelar algumas situações a respeito do preconceito contra pessoas transgênero, considero que a principal crítica do filme na verdade é contra o patriarcado que existe dentro das famílias muçulmanas. Isso fica bem nítido quando Haider consegue o emprego e a esposa automaticamente se vê obrigada a largar a carreira de maquiadora, que fazia tão bem para ela, porque agora precisam dela o tempo todo em casa para ajudar na criação das crianças da família. Crianças que, por sua vez, não são nem mesmo filhos dela, mas da cunhada. Sem ter poder nenhum de escolha, a ela só resta acatar a decisão, e aceitar largar o sonho para viver uma vida que não queria, em troca deste "bem estar familiar".


O ponto positivo do filme é a atuação visceral de Alina Khan como Biba, e o fato dos personagens serem muito humanos, já que praticamente todos eles tem atitudes bem questionáveis e controversas durante a exibição. Apesar de ser um filme que aborda temas pesados, ele também possui momentos cômicos, como a cena em que Haider dirige sua motocicleta pelas ruas da cidade com um cartaz gigantesco contendo a foto de Biba. Por fim, Joyland é um filme muito maduro que fala sobre relações, sobre pertencimento, mas principalmente sobre o sufocamento de se sentir anulado por costumes e tradições ultrapassadas. Não é à toa que o filme venceu o prêmio do júri em Cannes na mostra "Un Certain Regard", que premia diretores estreantes, pois é realmente impressionante o trabalho de Sadiq na condução.


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