sexta-feira, 31 de maio de 2024

Crítica: Pink Moon (2024)


Como lidar com a morte eminente de um parente próximo? Pior ainda, como lidar com esta morte quando ela é simplesmente uma escolha da própria pessoa. É o que vemos no roteiro de Pink Moon, da holandesa Floor van der Meulen (de The Last Male of Earth), uma comédia dramática que toca em assuntos delicados e muito emocionais como a eutanásia, a falta de vontade de continuar vivendo à medida em que envelhecemos, e o amor entre pai e filhos.


Iris (Julia Akkermans) e seu irmão mais velho Ian (Eelco Smits) fazem uma visita rotineira ao pai, Jan (Johan Leysen) para um jantar. A ocasião é escolhida pelo pai para lhes contar uma decisão tomada em sua vida: ele não quer mais viver. Através de poucas palavras, mas de maneira incisiva, ele deixa claro que em dois meses ele não estará mais entre eles, e que inclusive já tem em mãos a substância que fará isso acontecer. O choque dos filhos, assim como a raiva e a negação, são imediatos, mas logo dá lugar a uma espécie de aceitação, já que é perceptível que a decisão do pai é irrevogável.

Carregando um pingo de esperança de reverter a situação, Iris decide largar tudo para passar os dois meses na companhia do pai, inclusive levando-o para uma viagem. Neste tempo que passam juntos, pai e filha se conectam como nunca, mas apesar disso, Iris entende que não há muito mais o que possa fazer além de aceitar o desejo do pai, ainda que lhe doa muito, e apenas apreciar os últimos momentos que eles ainda tem juntos.

Para alguns pode ser difícil entender os motivos que levam alguém a desistir da vida, até porque eles podem ser inúmeros. No caso de Jan faz sentido que seu personagem tenha esta vontade, pois além de sentir falta da esposa falecida há alguns anos, todos os seus dias são sempre iguais e sem graça, e os poucos momentos bons já não compensam mais. A questão moral nunca é levantada pela direção, o que achei um acerto, e cabe ao espectador julgar conforme sua própria perspectiva.


O ponto negativo da trama é a construção dos personagens secundários, como o irmão de Iris ou até mesmo a irmã do pai, que aparece na fatídica cena inicial do jantar mas não tem importância alguma na história depois disso. Em contrapartida, a atuação de Julia Akkermans é, para mim, o grande destaque da trama, carregando muito bem o sentimento da personagem nos seus olhares a nas suas expressões. Com um final arrebatador, que por sinal é filmado em plano sequência, Pink Moon é um filme simples mas que toca profundamente àqueles que o assistem, unindo muito bem o teor dramático que o tema exige com momentos sutis de humor.


sábado, 25 de maio de 2024

Crítica: The Peasants (2024)


Dos mesmos criadores de Loving Vincent, Dorota Kobiela e Hugh Welchman, The Peasants (Chlopi) é mais uma belíssima experiência cinematográfica do casal de cineastas, que assim como no trabalho anterior, também é regado de imagens feitas à mão com tinta a óleo. O filme se baseia no famoso livro da literatura polonesa de mesmo nome escrito por Wladyslaw Reymont, que foi lançado no início do século passado em três atos distintos, e conta uma história dolorida e intensa que se passa em uma remota vila de camponeses polonesa.


O filme é dividido em quatro capítulos, que por sua vez correspondem às estações do ano, e se passa em uma zona rural da Polônia entre os anos 1904 e 1909. Na região vive Jagna, uma jovem muito atraente de uma família humilde, que justamente por sua beleza e carisma acaba cativando todos os homens do vilarejo e criando um sentimento de repulsa e inveja nas demais mulheres do local.

Certo dia, Maciej, o senhor mais rico da localidade, e que ficou viúvo há poucos meses, pede para a mãe de Jagna a mão da garota em casamento, o que imediatamente é aceito em troca de um bom acordo referente a terras produtivas que ele possui. Nesse meio tempo, Jagna já havia construído um relacionamento escondido com o próprio filho de Maciej, Antek, que, enraivecido pela ação do pai, decide deixar de vez a fazenda da família. Este é só o início de uma série de situações que entrelaçam a vida dos moradores desta pacata região, e que culmina em um final drástico envolvendo não apenas este "triângulo amoroso" criado, mas revelando também toda a hipocrisia e o preconceito enraizado na cultura local da época.


Apesar de ser um filme triste, é ao mesmo tempo um filme muito vívido, graças às músicas alegres e principalmente à sua fotografia belíssima. Segundo afirmação dos próprios envolvidos, o projeto levou anos para ser finalizado, já que a intenção era justamente usar imagens feitas à mão, em um processo manual digno de elogios. O resultado final é encantador.

sexta-feira, 17 de maio de 2024

Crítica: Rivais (2024)


Antes de mais nada, devo começar dizendo que Luca Guadagnino é um diretor cujo o trabalho, confesso, nunca me agradou, tanto com o aclamado Me Chame Pelo Seu Nome como nos execráveis Um Mergulho no Passado e Até os Ossos. mas apesar do seu estilo me incomodar, sempre fico curioso toda vez que ele lança algo novo, chega a ser quase inexplicável. E para minha surpresa, admito que gostei muito mais do que eu esperava de Rivais (Challenger), seu novo filme que está em cartaz nos cinemas, e que já pode ser considerado um dos filmes mais legais e provocadores do ano.


O filme começa mostrando Art Donaldson (Mike Faist), um tenista famoso no circuito mundial, mas que vive um momento de baixa em sua carreira. Para tentar fazer com que ele volte aos holofotes, sua esposa e treinadora (Zendaya) o inscreve em um "challenger", para que ele possa acumular pontos o ranking da ATP e voltar a jogar em um Grand Slam. Lá, eles reencontram Patrick Zweig (Josh O'Connor), um outro tenista que acabou não alcançado o mesmo sucesso de Art, mas que tem um passado muito interessante com o casal.


Ainda jovens, Art e Patrick eram grandes amigos, que sonhavam um dia poderem alcançar o sucesso no tênis, até que Tashi, uma tenista fenomenal e em momento de grande ascensão, cruza o caminho deles de maneira arrasadora. A trama é dividida em diferentes linhas temporais, e é através de inúmeros flashbacks que ficamos sabendo mais detalhes desta relação que surge entre os três protagonistas, que vai ganhando contornos cada vez mais inesperados com o passar do tempo. O que poderia tornar o filme repetitivo e chato, acaba sendo um artifício bem utilizado, justamente pela gama de oportunidades que o filme apresenta. Apesar de ser um filme que literalmente transcorre durante uma partida de tênis, é fácil perceber que neste caso o esporte em si nunca se torna o verdadeiro foco do filme, sendo usado como mecanismo para desenvolver este triângulo amoroso.


O filme tem excelentes atuações, mas devo destacar Zendaya, uma atriz que eu particularmente tenho muitas ressalvas, mas que aqui finalmente mostra uma versatilidade elogiável. Sua personagem é o ponto central na narrativa, e além de ser o objeto de desejo dos dois amigos, acaba manipulando todas as situações para que a disputa entre eles esteja sempre em evidência. Mike Faits e Josh O'Connor também cumprem bem seu papel, em ambas as épocas que o filme se passa. O único ponto negativo acaba sendo a trilha sonora, onde o Guadagnino optou por usar uma música "techno" onipresente, frenética e muitas vezes incomodativa, principalmente quando sobrepõe diálogos. Por fim, Rivais é um filme vibrante e efervescente em todos os sentidos, e uma das maiores surpresas do ano para mim.