segunda-feira, 22 de julho de 2024

Crítica: A Filha do Palhaço (2022)


O Brasil é um país de dimensões continentais e de uma pluralidade cultural extraordinária, e o nosso cinema é riquíssimo justamente por nos ajudar a conhecer cada cantinho desta terra e de sua gente. Filmado em Fortaleza, Ceará, A Filha do Palhaço é um filme simples mas extremamente encantador, que dentre os vários temas que aborda, fala essencialmente sobre as consequências das nossas escolhas, sobre perdas, ausências e reencontros.

 

A trama acompanha Renato (Demick Lopes), um humorista que se transforma na personagem "Silvanelly", e faz shows noturnos contando piadas em bares e restaurantes da capital cearense. Certo dia, sua filha adolescente Joana (Lis Sutter), de 14 anos, aparece para passar uma semana com ele, algo que seria natural não fosse o fato deles não terem nenhuma conexão até então. Renato abandonou a mãe de Joana há mais de uma década para viver um amor com outro homem, e nunca foi um pai presente, bem pelo contrário. Agora, apesar do estranhamento inicial, eles tem a chance de se aproximar e criar uma relação minimamente afetiva, mesmo que o tempo tenha criado uma barreira imensa entre os dois. E aos poucos, pai e filha vão encontrando este afeto em pequenos gestos e palavras, redescobrindo o papel crucial que cada um pode ter na vida um do outro.

O roteiro de forma alguma acoberta a culpa de Renato por ter abandonado a família anos atrás, mas usa isso justamente para dissertar sobre como nossas decisões na vida afetam toda uma cadeia de acontecimentos que, na maioria das vezes, fogem do nosso controle. Porém, se o filme não redime o personagem, muito menos o torna o vilão da história, até porque a construção do personagem é bastante complexa, e nos faz enxergar nele uma pessoa de coração gigante. Todos nós somos feitos de acertos e de erros, e com Renato não seria diferente. E é isso que o transforma num personagem tão humano.


O filme tem uma brasilidade efervescente, tanto pela estética como pela trilha sonora, que dita boa parte dos momentos mais expressivos. Prova disso é a canção "Tô Fazendo Falta", da cantora Joanna, que aparece em uma das cenas mais bonitas que eu vi no cinema este ano, e se encaixa perfeitamente com o sentimento que o diretor quer transmitir ao espectador. Se em termos de roteiro o filme é simples e traz até mesmo algumas facilitações banais, na questão de envolvimento com o público ele não deixa nada a desejar, e é realmente fascinante acompanhar vagarosamente o processo de amadurecimento desta relação entre pai e filha. Por fim, ao mesmo em que A Filha do Palhaço é engraçado quando tem que ser, ele sabe ser dramático na medida certa, culminando em um dos melhores filmes nacionais que vi este ano.

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