quarta-feira, 19 de junho de 2013

De Humberto Mauro a Fernando Meirelles: Uma Breve História do Cinema Nacional.


Nesse dia 19 de junho é comemorado o Dia do Cinema Brasileiro. Isso se dá graças ao lançamento de Vista da Baía de Guanabara do Italiano Alfonso Segreto, no longínquo ano de 1898, considerado pelos historiadores como o primeiro filme gravado em solo nacional. Filmado em forma de documentário, o curta era centrado em cenas do cotidiano carioca, focando principalmente na vida noturna agitada da época e nos seus pontos turísticos.

Após o lançamento dos primeiros filmes ainda no final do século 19, o Brasil viveu um período de recesso por conta da escassez de energia elétrica, e somente após 1907 que a indústria cinematográfica retornou às atividades. Os Estranguladores (1908) de Antônio Leal, é considerado o primeiro filme de ficção do país, e baseava-se em uma história policial verídica (como grande parte dos filmes do período), tendo sido exibido mais de 800 vezes e arrecadado uma bilheteria recorde para a época.

Ainda em 1909 surgiram os primeiros filmes cantados, onde os atores ficavam atrás da tela do cinema dublando seus próprios personagens. Nesse período, o sucesso ficou por conta da filmagem de revistas musicais (Paz e Amor, 1910) e trechos de óperas (O Guarany, 1911). Hoje, porém, não existem sequer fragmentos dessas obras, perdidas no tempo.

O Italiano Alfonso Segreto junto de seus equipamentos de filmagem.
Em 1911 chegam ao Brasil alguns imigrantes Italianos, que tomam conta do mercado. O ator Vittorio Capelaro se une a Antônio Leal para juntos fazerem uma série de filmes baseados na literatura clássica nacional, como Inocência (1915) e O Guarani (1916). No Rio de Janeiro, Luiz de Barros também seguiria essa ideia e lançaria a adaptação de A Viuvinha (1915), Iracema (1918) e Ubirajara (1919).

Na década de 20, a produção que se limitava apenas a São Paulo e Rio de Janeiro, ganha novos lugares. Em Minas Gerais, o italiano Pedro Comello faz uma parceria com o mineiro Humberto Mauro e juntos produzem Os Três Irmãos (1925) e Na Primavera da Vida (1926). No Rio Grande do Sul, se destaca Amor que Redime (1928), um melodrama urbano de Eduardo Abelim e Eugênio Kerrigan. O estado já tinha ficado marcado em 1914 com O Crime do Banhado, do pelotense Francisco Santos, considerado o primeiro longa-metragem do cinema nacional.

Porém, o maior êxito de produções da época ficou por conta de Pernambuco, com Edson Chagas e Gentil Roiz. Retribuição (1925) e Jurando Vingar (1925) são aventuras com personagens que remetem aos caubóis americanos. Abordando temas mais regionais, surgem Aitaré da Praia (1925), o grande sucesso da dupla que chegou a ser exibido no Rio, e Filhos sem Mãe (1926). 

Os primeiros filmes falados

Carmen Miranda em Alô Alô Carnaval,
de 1936.
Na década de 30, surgiram os primeiros filmes falados no cinema mundial, e o Brasil aderiu logo à novidade. O primeiro longa sonoro brasileiro é a comédia Acabaram-se os Otários (1929), de Luiz de Barros. Na contramão da nova tecnologia, Mário Peixoto lança o grande sucesso da época, Limite (1930), filme mudo que até hoje é considerado um marco do cinema experimental.

A partir dessa década, surge a primeira companhia cinematográfica do país, a Cinédia, no Rio de Janeiro, e as produções passam a ser mais sofisticadas. Humberto Mauro, considerado o primeiro grande diretor do cinema nacional, lança sua obra-prima Ganga Bruta (1933) pela produtora, que ainda ficaria conhecida por lançar Carmem Miranda para o mundo com Alô Alô Brasil (1935) e Alô Alô Carnaval (1936).

O Período das Chancadas

A década de 40 é marcada pelo surgimento das Chanchadas no cinema nacional, que ficaram conhecidas por lançarem nomes como Grande Otelo e Oscarito. O primeiro grande sucesso do gênero ficou por conta de Moleque Tião (1943), comédia estrelada justamente pelo comediante Grande Otelo. Em seguida, passaram a ser lançadas comédias musicais de forte apelo popular, principalmente sobre o tema carnaval, como Carnaval no Fogo (1949).

Grande Otelo e Oscarito em cena. Dupla inesquecível do cinema nacional.

Aos poucos, os diretores vão largando o tema carnavalesco e passam a focar nas comédias sobre o cotidiano da vida urbana, como Nem Sansão Nem Dalila (1954) e Matar ou Correr (1954), ambos de Carlos Manga.

Ainda no final da década de 40, influenciados pelo cinema americano, banqueiros e empresários se unem ao engenheiro Franco Zampari para criar a mega produtora Vera Cruz, nos moldes de Hollywood, com grandes estúdios e equipamentos de primeira. Em 5 anos são produzidos 18 filmes, desde os dramas Caiçara (1950) e Sinhá Moça (1953), até as comédias Tico-Tico no Fubá (1952) e É Proibido Beijar (1954). O grande sucesso da produtora ficou por conta de O Cangaceiro (1953), que fez nome fora do Brasil e lançou o ator Mazaropi para o mundo.

As chanchadas acabaram se esgotando no final da década de 50, quando o público pareceu ter enjoado da fórmula. Os atores do gênero acabaram indo trabalhar em programas de humor na recém surgida televisão.

Mazaropi, em O Cangaceiro (1953).

Precursores do Cinema Novo

Em meados da década de 50, começa a surgir uma nova estética nacional, com influência no neo-realismo italiano. Filmes como Agulha no Palheiro (1953), de Alex Viany, Rio 40 Graus (1955), de Nelson Pereira dos Santos e O Grande Momento (1958) de Roberto Santos, remetem justamente ao famoso movimento europeu.

Paralelamente, destacam-se o cinema de Anselmo Duarte, com seu O Pagador de Promessas (1962), premiado com a Palma de Ouro no Festival de Cannes, e Glauber Rocha, com Barravento (1961).

Cena de O Pagador de Promessas, premiado filme de Anselmo Duarte.

Cinema-Novo

"Uma câmera na mão e uma idéia na cabeça" era o grande lema dos cineastas desse período, que se propuseram a realizar filmes baratos repletos de preocupações sociais, muitos enraizadas na cultura brasileira da época. Três filmes podem ser considerados o pontapé inicial do movimento: Os Fuzis, de Ruy Guerra, Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos e Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha, ambos de 1963.

O movimento de destacou por mostrar um Brasil desconhecido, com seus diferentes conflitos políticos e sociais, à beira de uma ditadura (ainda que o povo não soubesse disso até então). Após o golpe militar de 1964, o foco dos filmes passa a ser a classe média urbana, com O Desafio (1965), de Paulo César Saraceni e A Grande Cidade (1966), de Cacá Diegues.

Cena de Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha.

Com Terra em Transe (1967) e O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro (1969), do cineasta Glauber Rocha, o cinema brasileiro tenta driblar a censura do regime militar por meio de filmes alegóricos. Se destacam ainda Macunaíma (1969), de Joaquim Pedro de Andrade, Brasil Ano 2000 (1968), de Walter Lima Jr., O Bravo Guerreiro (1969) de Gustavo Dahl, e Os Deuses e os Mortos (1970), de Ruy Guerra.

Revoltados com a situação política do país, e influenciados pelo cinema experimental de Ozualdo Carreiras e José Mujica Marins (Zé do Caixão), alguns diretores "corajosos" lançaram mais filmes radicais, na fase que ficou conhecida no país como Cinema Marginal. Foram obras pouco assistidas pelo público em geral, com exceção do clássico O Bandido da Luz Vermelha (1968), de Rogério Sganzerla e Matou a Família e Foi ao Cinema (1969), de Júlio Bressane.


Cena de O Bandido da Luz Vermelha, de Rogério Sganzerla.


Década de 70

Remanescentes do Cinema Novo ou cineastas estreantes, em busca de um estilo de maior comunicação popular, produziram obras significativas nessa que pode ser considerada a época da grande explosão do cinema nacional. É nesse período que são lançados filmes emblemáticos como Dona Flor e Seus Dois Maridos (1976), do diretor Bruno Barreto, que levou mais de 11 milhões de espectadores aos cinemas de todo país e é até hoje a maior bilheteria da história do nosso cinema.

Outros grandes sucessos do período foram Lúcio Flávio, Passageiro da Alegria (1977), de Hector Babenco, A Dama da Lotação (1978) de Neville d'Almeida, Toda Nudez Será Castigada (1973) de Arnaldo Jabor, além de Xica da Silva (1976) e Bye Bye Brasil (1979), ambos de Cacá Diegues.

Mauro Mendonça, Sônia Braga e José Wilker em Dona Flor e Seus Dois Maridos.
Os anos 70 ainda se destacam pelo surgimento da "Pornochanchada". Diretores de talento que despontavam na época souberam aliar bem aquilo que dava bilheteria na época, os filmes eróticos, com as antigas chanchadas, produzindo filmes de alto teor sensual em pleno período conturbado da ditadura. Os filmes da pornochanchada não eram mais do que filmes feitos para agradar a massa, influenciados pelas comédias italianas, e obtiveram grande sucesso de público.

A jovem guarda, principal movimento musical da época, também marcou presença nesse período. Seu representante maior, o cantor Roberto Carlos, participou de filmes de sucesso como Roberto Carlos a 300 km/h (1971) e Roberto Carlos e o Diamante Cor-de-rosa (1970).

                                                         Década de 80

A abertura política na década de 80 possibilitou a inserção de temas antes proibidos nos filmes nacionais, como os vistos em Eles Não Usam Black-Tie, de Leon Hirszman e Pra Frente Brasil! de Roberto Farias, que foi o primeiro a discutir a questão da tortuta. Surgem no período novos bons diretores, como Lael Rodrigues (Bete Balanço), André Klotzel (Marvada Carne),Susana Amaral (A Hora da Estrela), Sérgio Bianchi (Mato Eles?) e Sérgio Toledo (Vera).

Cena do emblemático Eles Não Usam Black-Tie.
Graças à "Lei do Curta", todo filme estrangeiro em exibição no Brasil teria que ter um curta brasileiro antes do seu início, o que aumentou a produção desse tipo de filme no país, trazendo para o Brasil inúmeros prêmios na categoria.

Ainda na década de 80, outro destaque ficou por conta dos documentários de longa-metragem, como Jango, de Silvio Tendler e Cabra Marcado Para Morrer, de Eduardo Coutinho. Ainda não podemos esquecer que foi a década do sucesso dos Trapalhões, que fizeram (juntando todos os filmes) a maior bilheteria do cinema brasileiro.


                                                              Anos 90

Com a ascenção de Fernando Collor à presidência do Brasil, e o confisco das reservas financeiras particulares do país, inúmeras produtoras e órgãos de incentivo ao cinema foram extintas. O único filme relativamente conhecido da época foi A Grande Arte, do diretor Walter Salles, que foi falado em inglês e não atingiu nem 1% do público total.

Marieta Severo no cartaz
de Carlota Joaquina.
A partir de 1993, já no governo de Itamar Franco, há um novo incentivo à Indústria CInematográfica do país, que resulta em uma retomada nas produções. Aos poucos, o cinema nacional vai voltando ao ritmo dos anos 80, e reconquistando seu espaço no cenário internacional. O filme que inicia esse novo período é Carlota Joaquina, Rainha do Brazil (1995), da diretora Carla Camurati. O Quatrilho, filmado no Rio Grande do Sul, chegou a ser candidato ao Oscar de melhor filme estrangeiro, mas fez pouquíssimo sucesso nos cinemas daqui. 

Em 1997, a distribuição dos filmes nacionais ainda era precária, com poucas salas disponíveis ao redor do Brasil. Por conta disso, as Organizações Globo decidiu criar sua própria produtora de filmes, a Globo Filmes, criando uma espécie de monopólio no circuito nacional, que de certa forma, serviu para alavancar o cinema de forma nunca antes vista na nossa história.

O grande exemplo disso é o filme Central do Brasil (1998), dirigido pelo cineasta Walter Salles, que chegou a concorrer em 2 categorias no Oscar Americano, melhor filme estrangeiro e melhor atriz para Fernanda Montenegro.

Cena de Central do Brasil, grande sucesso de Walter Salles.
Depois disso, outros grandes sucessos vieram lotar cada vez mais os cinemas daqui. O Auto da Compadecida (2000) de Guel Arraes, Cidade de Deus (2002) do promissor Fernando Meirelles, Carandiru (2003) de Hector Babenco, Olga (2004) de Jayme Monjardim, O Ano em que meus pais sairam de férias (2006) de Cao Hambuerger, Se eu Fosse Você (2006) de Daniel Filho, Tropa de Elite (2007) de José Padilha, entre outros, vieram para mostrar que a nova cara do cinema nacional estava de vez formada.

Para nosso orgulho, a tendência é que daqui para frente as obras filmadas no país continuem cada vez trazendo mais qualidade para as telas. Finalmente parece que o cinema feito por aqui voltou a ter motivos para comemorar a data.


Cena de Tropa de Elite, último grande sucesso do cinema nacional.

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