sábado, 31 de dezembro de 2022

Os 20 Melhores Filmes Lançados no Brasil em 2022

Último dia de dezembro e chegou a hora de fazer a boa e velha listinha dos melhores filmes do ano. O ano de 2022 ficou marcado como um recomeço, após sofrermos dois anos com a Pandemia de Covid-19, e a consequência disto é que tivemos um número expressivo de bons lançamentos, tanto nos cinemas como nos serviços de streaming, que se popularizaram ainda mais durante este período. Lembrando que a lista compila apenas filmes oficialmente lançados no Brasil durante o ano. Sem mais delongas, vamos a ela:


20º  Apollo 10 e Meio, de Richard Linklater


Em Apollo 10 e Maio, Richard Linklater nos trás, através da animação, um pouco de suas memórias da infância em Houston, no final dos anos 1960, quando a corrida espacial entre Estados Unidos e União Soviética estava no auge. Acompanhamos Stan, um garoto de 10 anos que sonha ser astronauta após assistir vários filmes e séries sobre astronomia, e acaba sendo selecionado pela NASA para fazer parte de um projeto teste, antes deles enviarem o primeiro homem à lua. É, sobretudo, o retrato de uma geração que cresceu em uma época muito conturbada mas ao mesmo tempo repleta de mudanças que acabaram moldando a forma como enxergamos o mundo hoje. É um filme que respira nostalgia e encanta pela simplicidade.

19º A Felicidade das Pequenas Coisas, de Pawo Choyning Dorji


A trama gira em torno de Ugyen, um rapaz que mora com a avó na capital do Butão e trabalha como professor para o programa do governo conhecido como "Felicidade Interna Bruta". Um dia ele é transferido para trabalhar em um colégio na aldeia de Lunana, que fica em um lugar muito isolado nas montanhas do Himalaia. No local ele se depara com uma realidade bem diferente do que estava acostumado, se surpreendendo com o modo de vida extremamente simples da população e com a maneira como eles são felizes com tão pouco.

18º O Homem do Norte, de Robert Eggers



A trama conta a história da lenda viking Amleth, que posteriormente também serviu como inspiração para Shakespeare escrever seu clássico Hamlet. Ela inicia em 985 D.C. quando, ainda garoto, Amleth vê seu pai ser morto após uma traição orquestrada por seu tio Fjolnir. Após conseguir fugir do local, o menino promete que um dia irá voltar para se vingar. Os anos passam e Amleth acaba se disfarçando de escravo para ir ao encontro do algoz de sua família e cumprir aquilo que prometeu. A pesquisa histórica que o diretor fez sobre a maneira que os vikings viviam foi profunda, e isso reflete diretamente no enredo do filme. Desde os rituais místicos ao redor do fogo até mesmo a maneira que eles praticavam esportes, é tudo muito bem reconstituído. Vivemos um tempo carente de histórias épicas e históricas, e O Homem do Norte preencheu essa lacuna este ano com brilhantismo.

17º Um Herói, de Asghar Farhadi


Uma característica do cinema de Asghar Farhadi é pegar uma situação super simples do cotidiano e transformar em uma história cheia de desdobramentos e impasses morais. Isso acontece em Um Herói, que gira em torno de Rahim, um homem que está preso por conta de uma dívida que não conseguiu pagar e acaba de ganhar dois dias de saída temporária. Ele aproveita esse tempo para tentar convencer seu credor a retirar a queixa, prometendo pagar uma quantia no ato e completar o restante em breve. Quando uma bolsa com moedas de ouro chega às suas mãos, ele tem a chance de resolver boa parte do problema, mas opta por devolver as moedas para a mulher que supostamente a teria perdido. O ato vira notícia na mídia, e Rahim é tratado como um verdadeiro "herói", ganhando até mesmo entrevista na televisão. Porém, não demora para que boatos comecem a pôr em dúvida se Rahim teria agido mesmo de boa fé ou se tudo não passou de uma farsa para ele se sair como bom moço e conquistar sua liberdade. E essa ambiguidade sobre Rahim é o que abastece o espectador, em um roteiro que prende até o final.

16º Batman, de Matt Reeves


No Batman dirigido por Matt Reeves, quem assumiu a responsabilidade de interpretar o "homem morcego" foi Robert Pattinson, e ele foi muito bem. Diferente dos últimos filmes, onde a figura do Batman já fazia parte do cotidiano de Gotham City, aqui temos um Batman mais jovem, recém descobrindo o que de fato é "ser o Batman". Outra mudança de perspectiva diante das obras anteriores é o fato do filme de Reeves focar muito mais no lado investigativo do protagonista, que trabalha junto com o chefe da polícia para desvendar uma série de assassinatos que está amedrontando a cidade. Por ter essa atmosfera mais enigmática, o roteiro acaba tendo menos cenas de ação, o que achei bom, visto que quando elas aparecem são com propósito e muito bem encaixadas com o enredo.

15º Moonage Daydream, de Brett Morgen

 

Com um visual que flerta com o psicodelismo, o diretor Brett Morgen faz um apanhado riquíssimo da vida pessoal e pública de David Bowie, fugindo completamente daquela estrutura linear que nos acostumamos a ver em documentários biográficos. Contando com muitas imagens inéditas de apresentações, entrevistas, bastidores e até mesmo da vida privada do artista, Morgen molda pouco a pouco a personalidade de Bowie e mostra o porquê de ele ter chegado onde chegou e conquistado tantos fãs. Temos falas realmente impressionantes do artista sobre a vida, sobre o amor e sobretudo a arte, e ao mesmo tempo em que é bastante sensível nestes momentos, o documentário também consegue ser muito pulsante com as imagens de Bowie tocando ao vivo, que são um verdadeiro deleite para quem é fã.


14º Avatar: O Caminho da Água, de James Cameron


Muito mais do que um filme, Avatar: O Caminho da Água é uma verdadeira experiência sensorial única e incomparável até então. Mais de uma década após o primeiro Avatar, que naquela época já havia sido revolucionário em termos de visual e uso do 3D, James Cameron nos leva de volta à Pandora, o planeta onde vivem os Na'vi, onde Jake Sully agora vive com Neytiri e seus quatro filhos. Tudo ia tranquilo até que os humanos decidem voltar ao planeta para explorar novamente suas riquezas naturais e se vingar do próprio Sully, por um acontecimento do primeiro filme. Correndo perigo, ele parte com sua família para uma outra parte do planeta, onde os seres vivem em conexão com a água e os ajudam a se esconder por um tempo. As cenas subaquáticas apresentam, de fato, as imagens mais bonitas que já vi no cinema, e não existe nada igual em termos de imersão.


13º Pearl, de Ti West

 

Vendo o potencial que a história de "X" tinha para ir além, o diretor Ti West logo anunciou as filmagens de um prequel, onde contaria a história por trás da vilã. Foi aí que nasceu a ideia de Pearl, que se passa no fatídico ano de 1918, marcado por dois acontecimentos: a pandemia da Gripe Espanhola e o final da Primeira Guerra. Neste cenário temos a jovem Pearl, que vive com seus pais em uma pequena fazenda desde que o marido foi lutar na guerra. Seus únicos momentos de distração ocorrem quando ela consegue fugir das garras da mãe e assistir filmes mudos no cinema da cidade, onde acaba criando uma paixão enorme pela dança. Com uma atuação impressionante de Mia Goth, o filme faz um retrato de como funciona a mente humana diante de grandes frustrações, e de como a distância do convívio social acaba afetando o psicológico.


12º O Céu de Alice, de Chloé Mazlo


Com uma estética bastante teatral, que me lembrou um pouco o estilo de Michel Gondry, O Céu de Alice marca a estreia primorosa de Chloé Mazlo na direção de um longa-metragem, e mostra principalmente como uma guerra afeta a vida de cidadãos comuns de uma maneira drástica e irreversível.  O roteiro acompanha Alice, uma jovem que deixa a casa dos pais na Suíça para ganhar a vida como babá em Beirute, capital do Líbano, nos anos 1950. Lá ela conhece o astrofísico Joseph, com quem se casa e tem uma filha chamada Mona. Os anos passam, e a vida da família vira do avesso com o começo de uma guerra civil no país, alimentada sobretudo por questões religiosas.


11º Flee - Nenhum Lugar Para Chamar de Lar, de Jonas Poher Rasmussen


Traumas do passado se tornam feridas que são carregadas por uma vida inteira, e muitas vezes é duro tocar e falar sobre elas. Flee conta a história de um refugiado afegão que precisou deixar o seu país junto com a família no final dos anos 1980 devido à invasão do Talibã. Amigo íntimo do diretor, Amin (nome fictício usado para preservar sua identidade verdadeira) resolveu contar tudo que aconteceu com ele desde sua infância, pela primeira vez, neste documentário íntimo e emocionante. O formato de animação possibilita que, além da entrevista de Amin, também seja feita uma reconstituição de todos os fatos narrados por ele, e o filme também traça um paralelo com os dias de hoje e o preocupante aumento de refugiados pelo mundo.


10º Aftersun, de Charlotte Wells



Baseado nas próprias memórias da diretora, Aftersun acompanha a viagem de férias de um pai com sua filha de 11 anos em um resort na Turquia. Com um desenvolvimento lento, pouco a pouco vamos sabendo mais a respeito da história de vida e da relação que os dois tem, e o que vemos no fundo é uma relação pai e filha muito emocionante, que poderia facilmente apelar para o melodrama mas foge completamente disso. Os diálogos são muito orgânicos, e as atuações fascinantes. É tudo tão real que parece até que estamos realmente acompanhando um documentário sobre a viagem de um pai com a sua filha, e isso se dá pela ótima química que existe entre os atores. Um filme sensorial, acima de tudo.


Aloners, de Hong Sung-eun

 

Aloners fala com muita sensibilidade da solidão no mundo moderno e das barreiras invisíveis que muitas vezes criamos ao redor de nós mesmos. O filme acompanha Yu Jina, que trabalha em uma central de atendimento de um cartão de crédito e conversa com centenas de pessoas todos os dias. Porém, fora do ambiente de trabalho ela é uma pessoa extremamente reservada, sem amigos, e que prefere almoçar sozinha no refeitório da empresa com seus fones de ouvido para não falar com ninguém. Quando o vizinho de Jina, um rapaz também solitário, acaba morrendo, ela passa a repensar sua vida, sobretudo quando ganha uma nova colega de trabalho que é extremamente falante e tenta a todo custo forçar uma amizade. O filme tem uma atmosfera fria, que ajuda a passar esta ideia de vazio que existe hoje nas relações interpessoais, onde sequer sabemos quem são as pessoas que nos rodeiam e um "bom dia" pelos corredores do condomínio ou do trabalho virou artigo de luxo.


8º Pinóquio, de Guillermo Del Toro


A versão de Pinóquio feita por Guillermo Del Toro talvez seja a melhor já feita no cinema para o personagem criado pelo italiano Carlo Collodi no século XIX, superando até mesmo o clássico da Disney de 1940. O roteiro acompanha Gepeto, um homem que perdeu seu filho único após ele ser atingido por uma bomba durante a guerra. Em luto, ele cria um boneco de madeira que logo ganha vida através de uma fada, e também um nome: Pinóquio. O principal diferencial para as demais versões, e também para a obra original, é que aqui a história se passa na Itália fascista de Mussolini, e isso acaba sendo muito bem contextualizado, tendo um papel importantíssimo no desenvolvimento da trama e na mensagem que Del Toro queria passar com ela. Destaque total para a parte visual e para o primor de detalhes no uso do stop-motion.


7º O Bom Patrão, de Fernando León de Aranoa


A trama acompanha Blanco, dono de uma empresa consolidada e bem sucedida que fabrica balanças de todos os tipos. Aliás, o equilíbrio e a precisão das balanças é algo que Blanco costuma levar metaforicamente para tudo na vida. Apaixonado pelo que faz, ele não deixa de lembrar a todo momento o quanto esses valores são importantes, e gosta de tratar os seus funcionários como membros da família, abraçando seus problemas particulares e tentando inclusive resolvê-los. Esse "ambiente familiar" é ameaçado quando um funcionário não aceita a sua demissão e monta um acampamento na frente do local, fazendo de tudo para tentar botar abaixo a reputação de "empresa comprometida com o ser humano" que Blanco tanto prioriza manter intacta. O sorridente empresário pode até ser um grande chefe, mas como todo bom patrão, na hora do aperto vai passar por cima de qualquer um para defender a saúde financeira da sua empresa, e é exatamente aí que começam as críticas do filme, todas feitas com muito sarcasmo e bom humor.


6º Bardo - Falsa Crônica de Algumas Verdades, de Alejandro G. Inárritu


Bardo: Falsa Crônica de Algumas Verdades é mais um filme de Inárritu que dividiu muito as opiniões. O roteiro acompanha o jornalista e documentarista mexicano Silverio Gama, que mora nos Estados Unidos há anos e volta ao México para receber um prêmio. Pode-se dizer que o filme é uma grande viagem onírica por dentro da cabeça do diretor, que usa o retorno de Silverio ao seu país natal para abordar temas como a futilidade da sociedade atual, os dilemas de quem vai viver em outro país, a chegada da idade que vai consequentemente nos afastando das pessoas que amamos, e até mesmo o passado sangrento da América Latina. Visualmente belo, o filme possui algumas das cenas mais bonitas e marcantes que vi nos últimos anos, e conta com uma atuação impressionante de Daniel Giménez Cacho.


5º Great Freedom, de Sebastian Meise


Great Freedom conta a história de Hans Hoffman, um homem que ao longo de três décadas foi preso três vezes por praticar atos sexuais com outros homens, um "crime" que fazia parte do código penal alemão até 1994. Entre idas e vindas no tempo, o diretor Sebastian Meise costura histórias vividas por Hans na prisão durante os três períodos, sobretudo a sua relação com Viktor, um homem heterossexual que está preso acusado de assassinato. Com uma direção extremamente competente, Meise consegue passar toda a angústia de alguém que está impedido de ter a sua liberdade, em todos os sentidos possíveis.


4º Elvis, de Baz Luhrmann

 

Em Elvis, Baz Luhrmann nos apresenta a trajetória e o legado de Elvis Presley, mesclando a história do astro com um retrato da sociedade norte-americana dos anos 1950, 1960 e 1970. Para contar a história do artista desde a sua infância em Memphis até sua morte em 1977, o diretor utilizou outro personagem como fio condutor: o coronel Tom Parker, que trabalhava em um circo e descobriu Elvis quando ele ainda era apenas um jovem promissor. Visto por muitos como vilão e talvez até causador da morte do cantor, Parker narra a sua versão da história, direto do seu leito de morte, cabendo ao espectador julgar suas atitudes como certas ou erradas. A montagem do filme é muito dinâmica, contendo inclusive inserções animadas, e tudo transcorre com muita agilidade, o que não deixa o filme perder o ritmo em nenhum momento apesar da sua extensa duração. Importante destacar o trabalho brilhante do ator Austin Butler, que praticamente incorpora Elvis em cena.


3º A Pior Pessoa do Mundo, de Joachim Trier


Abordando as imperfeições e as fragilidades que todos nós temos, o filme de Joachim Trier se divide em 12 capítulos, mais um prólogo e um epílogo, para contar alguns anos da vida de Julie, que está naquela fase de transição (aproximadamente 30 anos) onde o tempo parece estar se esgotando para decidir os caminhos a trilhar. Depois de fazer cursos como medicina e fotografia, mas não encontrar de fato o seu lugar neles, Julie ganha a vida trabalhando numa livraria, enquanto escreve artigos para um site e vive com um homem 10 anos mais velho. Relacionamento, carreira, tudo parece estar indo de mal a pior na vida da personagem, que vive um grande conflito interno e se sente culpada por não estar no mesmo ritmo que os demais ao redor. A Pior Pessoa do Mundo acaba sendo um filme sobre decisões, sobre relações humanas, mas principalmente sobre como a vida é maleável e pode mudar em um piscar de olhos.


2º Argentina, 1985, de Santiago Mitre

 

O filme se passa dois anos após o fim da última e mais violenta ditadura da Argentina, e acompanha o julgamento que colocou os militares responsáveis pela brutal repressão na cadeira dos réus. O caso foi levado a júri pelo veterano promotor Julio Strassera e seu vice-promotor, Luis Moreno Ocampo, que com a ajuda de vários jovens estudantes, conseguiram em tempo recorde resgatar dezenas de milhares de provas dos crimes cometidos durante o regime, além de reunir testemunhas e familiares das vítimas. O filme tem diálogos muito potentes, e a frase "Nunca Mais!" com que Strassera termina seu discurso, e que virou um lema contra a repressão, remete ao sentimento de qualquer sociedade que tenha passado por momentos de perda da liberdade e não quer que isso se repita jamais. Uma grandiosa atuação, mais uma vez, de Ricardo Darín.


1º Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, de Daniel Kwan e Daniel Scheinert

 

Existem filmes que vão muito além da simples relação filme/espectador, e se tornam verdadeiras experiências para a vida toda. É o caso de Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, que me deixou completamente sem reação após o seu fim, e que é para mim o grande filme de 2022. O roteiro acompanha Evelyn, dona de uma lavanderia que comanda os negócios com pulso firme junto do marido Waymond. Certo dia, Evelyn descobre uma ruptura interdimensional que a possibilita viajar entre milhares de universos paralelos, e em uma velocidade frenética logo ficamos conhecendo várias outras versões dela, que foram sendo moldadas nos outros universos de acordo com suas próprias escolhas neste atual. Sim, o multiverso acaba sendo o ponto principal do enredo, e é sublime a maneira como os diretores conseguem unir essa característica da ficção científica com um enredo ao mesmo tempo humano e emocional. O filme tem várias passagens reflexivas, que no meio de tanta loucura e insanidade, nos fazem pensar, dentre outras coisas, no sentido da vida, nas relações familiares e nos nossos próprios atos e suas consequências. Como o próprio nome diz, tudo neste filme realmente acontece ao mesmo tempo e em todo lugar, e é uma viagem fascinante.

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