domingo, 7 de janeiro de 2024

Crítica: O Melhor Está por Vir (2023)


Com cinquenta anos de carreira completados em 2023, Nanni Moretti pode ser considerado facilmente um dos cineastas mais notáveis da história do cinema italiano, e eu sou um grande admirador do seu trabalho desde O Quarto do Filho (2001). Em O Melhor Está por Vir, Moretti mais uma vez abusa da ironia, e utiliza a metalinguagem de forma muito sagaz para criticar a forma de fazer e consumir cinema hoje em dia.


Na trama acompanhamos o diretor de cinema Giovanni, que assim como na maioria dos filmes de Moretti, é interpretado pelo próprio diretor. Giovanni está tentando rodar um filme que se passa na Itália dos anos 1950, e que acompanha um grupo militante do Partido Comunista Italiano. A presença de um circo vindo de Budapeste, e consequentemente da amizade feita pelos membros com o povo da vila, faz com que o grupo entre em conflito com a própria ideologia, ao comprar a luta do povo húngaro contra a invasão hostil do seu país executada pela União Soviética.

Ao longo de todo o filme, acompanhamos os bastidores desta gravação e dos obstáculos que atrapalham Giovanni nas filmagens das cenas, além dos obstáculos que ele mesmo cria por ser exigente demais e não aceitar mudar sua visão original do roteiro. Quem tem os maiores embates com ele sobre isso é sua própria mulher, Paola (Margheritta Buy), que trabalhou a vida inteira como produtora de seus filmes. O casamento também está em crise por uma série de fatores, é e outra coisa que Giovanni precisa lidar em meio ao caos. Moretti utiliza o artifício do "filme dentro do filme" para despejar em tela várias reflexões sobre o cinema, a política e o grande conflito que existe entre gerações, sobretudo quando ele auxilia um diretor em ascensão no seu longa de ação.


Talvez a grande cena do filme, e que concentra boa parte da crítica que Moretti tenta apresentar, seja a que Giovanni se encontra com executivos da Netflix, que querem comprar seu filme. No entanto, para ele ter a obra lançada nos 190 países em que a Netflix tem cobertura (os executivos frisam bem esse número expressivo), ele precisa abrir mão de uma série de liberdades artísticas, ficando a mercê deste novo jeito de fazer cinema, baseado em algoritmos. Obviamente ele não aceita as mudanças, e prefere continuar com um orçamento precário, mas com um filme verdadeiro e 100% seu. Com um final "Felliniano", Moretti brinca com as possibilidades do real e do abstrato no cinema, culminando em um belíssimo ensaio metafórico sobre a arte.

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