quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Crítica: Fechar os Olhos (2023)


A relação poderosa e inexplicável que temos com a imagem e o cinema, e o quanto nossas memórias são remexidas e trazidas à tona através da junção destes elementos. Em suma, isto é o que move Fechar os Olhos (Cerrar los Ojos), filme que marca grandiosamente o retorno do cineasta Víctor Erice a um filme de ficção depois de mais de 30 anos.


O filme acompanha o romancista e diretor de cinema Miguel Garay (Manolo Solo), que nos anos 1990 teve que interromper as gravações de seu novo filme, "La Mirada del Adiós", após o ator principal (e também seu amigo pessoal), Julio Arenas (Jose Coronado), desaparecer misteriosamente. Aliás, o longa inicia justamente com uma tomada inteira deste filme fictício, o que falsamente nos dá a impressão de estarmos assistindo-o no começo. A história deste "filme dentro do filme" contava a história de um homem riquíssimo, que pagava outro para procurar uma filha sua desaparecida na China.

Doze anos depois dos acontecimentos que impediram que o filme chegasse ao fim, Miguel é chamado para participar de um programa de televisão denominado "Casos Não Resolvidos", que visa justamente trazer à tona o mistério sobre Julio Arenas. Apesar dos indícios terem apontado suicídio na época, nunca houve uma conclusão definitiva do que aconteceu com o ator, já que seu corpo jamais foi encontrado. A repercussão acaba trazendo novos indícios, que Miguel imediatamente passa a investigar. O roteiro é muito habilidoso em suas idas e vindas, criando um ótimo clima de suspense, e trazendo também elementos de humor e drama que se convergem perfeitamente.


Confesso que dadas as devidas diferenças, o filme de alguma forma me lembrou Cinema Paradiso, de Giuseppe Tornatore, que eu considero o meu filme favorito da vida. Ele tem esse argumento de reavivar a memória e estimular lembranças através do cinema, e isso é algo que se repete por toda a duração do longa. Há também boas reflexões entre Miguel e seu antigo editor, Max (Mario Pardo), sobre algumas diferenças marcantes do cinema feito antigamente para o que é feito agora, de uma maneira nostálgica e até mesmo saudosista.

Na parte técnica, é preciso destacar o ótimo trabalho de fotografia e a encantadora trilha sonora. As atuações também são muito sóbrias, e não posso deixar de citar a presença da magnífica atriz espanhola Ana Torrent, na pele da irmã de Julio Arenas, que aparece por poucos minutos mas tem uma presença muito marcante. Porém, o filme é de Manolo Solo, em mais uma grande atuação do ator andaluz. Por fim, Fechar os Olhos é um filme que evidencia o quanto o cinema vai muito além da arte, e que é justamente esta relação que temos com ele que faz ele resistir ao tempo e a todas as mudanças que o transformaram nesses mais de 128 anos.

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